por Aristides Oliveira
Foto: Academia Piauiense de Letras
Escrever sobre a produção intelectual da professora Teresinha Queiroz é um exercício desafiador, levando em consideração sua presença ativa no debate historiográfico piauiense em várias frentes de trabalho e atuação contínua na academia. Quero compartilhar com vocês algumas leituras que fiz de suas pesquisas para expor parcela deste campo de conhecimento que a professora desenvolveu ao longo de décadas de pesquisa. Não quero, nem me atrevo a escrever sobre a obra da Teresinha na sua “totalidade”, pois seu universo temático é vasto e diverso, por isso adianto que esse texto visa traçar um perfil, consciente de que algumas lacunas ainda devem ser preenchidas.
Nascida em Esperantina, graduou-se em História (1974-1977) e Economia (1976-1983) na Universidade Federal do Piauí e em seguida entrou para o mestrado em História do Brasil na Universidade Federal do Paraná (1978-1984) e doutorado pela Universidade de São Paulo. Atualmente ocupa a 23ª cadeira da Academia Piauiense de Letras, fruto do reconhecimento da sua extensa produção acadêmica sobre a história do Piauí, bem como seu trabalho no corpo editorial das revistas Humanas Res e Contraponto.
A partir do levantamento sobre suas pesquisas visualizei um painel com ênfase nos estudos voltados para a compreensão da vida cultural e política vivenciada no Piauí na transição do século XIX para o XX, via análise de fontes literárias e jornalísticas que possibilitam a investigação sobre os modos de fazer e pensar dos intelectuais atuantes naquela época, articulada na relação entre História e Literatura, conforme veremos a seguir.
Para citar algumas publicações em livro organizadas por ela, em parceria com outros(as) pesquisadores(as), temos “Páginas impressas: história, imprensa e política no Brasil”[1], “Tempo & memória: interfaces entre os campos da comunicação e da história”[2], “Da Serra da Ibiapaba ao Campus da Ininga: 373 anos de Pedagogia no Piauí”[3], “História de Teresina[4]”, entre outros…
No âmbito da escrita de artigos e capítulos de livro nesses últimos anos, Teresinha explora universos que percorrem momentos históricos desde a vivência de escritoras num país em que os homens impunham suas regras[5], a experiência educacional feminina no Brasil do século XIX[6] e a luta das mulheres para garantir seus direitos fundamentais[7], bem como estudos sobre a República[8], literatura[9], teatro[10], história da educação[11] e da cidade[12], bem como a análise da produção acadêmica e literária piauiense do período citado[13].
Além desses trabalhos, Teresinha dedicou-se aos estudos que compreendem as fases mais produtivas na elaboração de narrativas sobre o Piauí e o processo de Independência[14], atravessando os anos 1950/1970 até as décadas de 1980/2000:
As três primeiras décadas do século XX correspondem ao período em que, talvez, mais se tenha pensado de maneira sistemática acerca da história do Piauí. Em que pese o domínio ainda da compreensão tradicional da história, essa escritura já se alargava para o que hoje é visto como dimensão cultural. Em paralelo àquela história tradicional, considerada, às vezes, de forma muito ligeira, de positivista, verifica-se também a presença de objetos da história cultural. […] Como pesquisadora, tenho trabalhado de forma sistemática com esse período e seus autores, recuperando, particularmente, as obras de Clodoaldo Freitas, de Higino Cunha, de Lucídio Freitas e de Alcides Freitas, os dois últimos, jovens poetas[15].
No período entre 1950-1970, temos a presença do Centro de Estudos Piauienses (CEP), fundado em 1951, o Movimento de Renovação Cultural e a presença de Odilon Nunes nas pesquisas sobre História do Piauí. Uma obra citada pela pesquisadora como fundamental para conhecer o contexto de produção historiográfica do período é “Economia Piauiense”, organizada e dirigida por R. N. Monteiro de Santana[16].
Em “Cadernos Históricos”, “Teresina: subsídios para a História do Piauí” e “Obra completa de Monsenhor Chaves”, podemos compreender a importância de Monsenhor Chaves na prospecção de dados que revelam uma história do Piauí resultante da “exploração intensiva das fontes documentais e sinaliza para o grande esforço desenvolvido na segunda metade do século XX”[17].
Observando os aspectos que marcam o diferencial nas pesquisas do historiador, ela nos revela que sua narrativa “deu uma virada no modo de praticar o ofício, a partir da década de 1950”[18] e este se coloca como um pensador que não escreve em nome das instituições ou de interesses oficiais, mas por uma “história do povo,[19] […] alargando esse registro para a inclusão das classes subalternas[20] […] ao antecipar um tipo de historiografia voltado para a questão do social, da pobreza, da opressão”[21].
Na década de 1980, a publicação de “Piauí: evolução, realidade, desenvolvimento”, organizada pela Fundação CEPRO marcou aquela geração por se tratar do melhor estudo trabalhado em “sala de aula para a compreensão do processo histórico piauiense, em sua dimensão econômico-social”[22].
Nesse período, vários docentes estavam imersos nos cursos de pós-graduação e com seu retorno dos mestrados e especializações, abriram-se novas possibilidades de debates no campo da historiografia. Novos temas, propostas e inquietações começam a ganhar fôlego, devido o contato com novos paradigmas da história, como os Annales, o marxismo e a divulgação dos trabalhos produzidos na pós-graduação através da difusão dos livros publicados, aumentado o leque de opções de leitura.
[…] é nos anos 1980 que suas ações se tornam mais significativas, especialmente em virtude da criação do Núcleo de História Oral, com intensa atividade não só na produção de documentos, mas igualmente no treinamento e no incentivo à pesquisa. Professores do Departamento de Geografia e História da UFPI, hoje, foram, na condição de estudantes ou já licenciados, estagiários naquele Núcleo, havendo uma troca intelectual intensa entre as duas instituições. […] A década de 90 inaugurou uma diversificação muito grande na produção de livros e artigos[…], [que] além de significativa, extrapolou os muros da Universidade Federal e começou a acontecer nas revistas culturais mais importantes de Teresina[23]. [Seus impactos editoriais podem ser sentidos nas produções que percorrem os anos 2000 até os dias de hoje].
Deslocando-se dos estudos historiográficos piauienses e alargando sua reflexão para os modos de construção da narrativa contemporânea sobre o Brasil, ela percebe que a entrada dos anos 80 é marcada por um novo olhar sobre o passado, no qual a historiografia elaborou uma perspectiva “culturalista por excelência”[24].
O que era objeto de estudo da História até então estava concentrado nos poderes institucionais, invisibilizando as trajetórias dos sujeitos, encarados como “vivências sem história, significando uma ausência de sentido, no limite compreendidas como insólitas ou mesmo residuais[25]”.
Com a mudança de paradigma, outras vozes são trazidas a luz para articular o passado e seus efeitos no tempo presente, exigindo “um novo olhar e […] explicações ainda não canonizadas”[26], tornando a prática do historiador(a) um:
[…] desafio aos modelos e fórmulas consolidadas de viver a história, é a insubordinação às soluções singulares e já reconhecidas, é a busca de novas experiências […]. E ainda, o modo como esta vida, experimentada como novidade, desafia a cultura escrita, suscita, no labor literário, o estranhamento dos textos, obriga à reflexão continuada[27].
Teresinha se envolveu em projetos vinculados na História e Economia, através do “Projeto Levantamento de Fontes para a História da Agricultura no Norte e Nordeste” (1977-1978) e o “Projeto Delimitação e Regionalização do Brasil Semi-Árido” (1983-1985). Articulando as leituras vivenciadas na experiência que obteve nas graduações e direcionando suas lentes para uma abordagem econômica do Estado, defendeu em abril de 1984 a dissertação “A importância da borracha da maniçoba na economia do Piauí: 1900-1920”.
Sua jornada na obtenção de fontes para formular sua pesquisa foi longa, percorrendo bibliotecas pelo Brasil em busca de arquivos que auxiliassem na produção da narrativa que se propôs realizar.
Desse modo, Teresinha transitou em vários centros de pesquisa/catalogação de arquivos sediadas em São Luís, Teresina, Fortaleza, Salvador, Rio de Janeiro, Brasília e Curitiba, locais que disponibilizaram material de trabalho para que sua dissertação ganhasse forma, principalmente na Biblioteca Nacional (RJ), Biblioteca do Setor de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Ceará, Biblioteca Nacional de Agricultura (Brasília) e no Arquivo Público do Piauí, que, para ela, “os resultados mais encorajadores derivaram”[28] dessas instituições.
No universo das bibliografias e fontes selecionadas, ela destaca a importância de R. N. Monteiro de Santana, citando “Evolução histórica da economia piauiense”. Escrito nos anos 60, Teresinha o define como “o primeiro esforço de síntese” sobre os estudos em torno da economia no Piauí:
Um dos pontos fortes é a proposta de periodização baseada na evolução econômica. Em vista do seu caráter de síntese, não há aprofundamento de nenhum tema ou período em particular. Todavia, dele constam as primeiras referências históricas e o reconhecimento da importância da maniçoba no contexto da economia piauiense[29].
Juntamente com a obra supracitada, soma-se em grau de importância para a compreensão da história econômica do Piauí o trabalho realizado de forma coletiva e interdisciplinar da Fundação CEPRO, “Piauí: evolução, realidade e desenvolvimento” (1979), que traz uma análise da maniçoba “como parte integrante do setor extrativo vegetal”, tornando-se um recurso natural de alto valor para a economia piauiense “em toda a primeira metade do século XX”[30].
Demarcando o recorte temporal de 1900-1920, seu interesse deu-se no estudo de como o setor da borracha possibilitou a produção de renda/receita para o Piauí, bem como se constituiu a mobilização da sociedade para garantir que esse recurso se transformasse em elemento produtivo na região:
A economia da borracha de maniçoba no Piauí, inserida num quadro extrativo-exportador, teve suas tendências de produção e exportação determinadas pelo preço internacional do produto, ou, em outros termos, pela demanda externa. A alta dos preços verificada na conjuntura igualmente determinou a exploração racional do produto – via plantio – efetivada em diversos municípios do Estado. Surgindo como resposta a conjuntura favorável de preços internacionais, sucumbiu com a concorrência asiática e a queda acentuada dos preços, a partir de 1911.
Atividade eminentemente incorporadora de mão de obra, as evidências eram no sentido de que havia igualmente atraído a população de outros estados nordestinos, particularmente de Pernambuco, do Ceará e da Bahia. À medida que fixou contingentes no campo, contribuiu para a diminuição da drenagem de braços para a Amazônia.
A conjuntura favorável da economia do Piauí nos primeiros anos do século XX, teria sido determinada pela borracha de maniçoba que, a despeito de não ter provocado alterações fundamentais no sistema de propriedade da terra ou nas relações de trabalho, teria contribuído para a efetiva autonomia do Estado na fase de consolidação do sistema republicano[31].
Houve uma certa dificuldade na consulta das fontes hemerográficas sobre o tema, por não serem encontradas elementos históricos mais amplos que ajudem na pesquisa de formas “mais completas”. Boa parte das publicações que Teresinha consultou no Piauí “eram muitas vezes pequenas e esparsas”[32], fazendo das demais fontes encontradas em outros estados elementos-chave no esclarecimento de dados que não estavam nítidos nos documentos relacionados à maniçoba no Estado.
Assim, tudo que foi encontrado e atribuído a informações genéricas ou específicas, tratando do objeto em questão, “complementaram, reafirmaram, ou até contribuíram para que fossem mudadas certas posições iniciais sobre o tema em particular e sobre a própria história regional”[33].
Entre as fontes que deram fôlego ao desenvolvimento metodológico da dissertação, podemos destacar mensagens governamentais, relatórios elaborados pela Secretaria de Estado da Fazenda, tornando-se suporte para analisar a situação econômica do Piauí e as estratégias que o governo articulava no processo de exportação da borracha, a fim de inserir o setor no circuito financeiro naquela época, “procurando-se identificar a situação econômica […] do Estado, além do teor do discurso oficial, numa década que foi considerada como de transição político-ideológica[34]”.
Também foram consultadas publicações locais como almanaques, catálogos, focando na análise de jornais encontrados no período recuado em 1897, fonte de informações úteis sobre a conjuntura nos mais variados níveis para alcançar uma maior compreensão da temática.
Cada vez que a pesquisa ia aprofundando as particularidades que envolvem o objeto, foram encontradas referências que ajudaram a identificar a configuração do circuito de produção (comercialização), deslocamento, preços resultantes do transporte/embarque, a absorção da maniçoba no mercado consumidor, impostos, até “a diária dos operários por estabelecimentos”, bem como “o número de árvores nativas e cultivadas por estabelecimentos e o capital empregado”, mesmo que a documentação não informasse dados mais amplos sobre os maniçobais no Piauí, era possível traçar um perfil econômico[35].
A partir daí outros trabalhos foram desenvolvidos no aprofundamento da história econômica, resultando na publicação de livros a saber: “Economia piauiense: da pecuária ao extrativismo” (1993), “Família e Economia: um estudo dos inventários e testamentos paulistas dos meados do século XVII” (2008) e “Evolução Histórica da Economia Piauiense e outros estudos[36]” (2008). Além das obras consideradas basilares sobre a economia piauiense, ela atuou em bancas de graduação e pós-graduação, avaliando as pesquisas na área[37].
Sua trajetória na Universidade Federal do Piauí – seja no papel de estudante ou pesquisadora – é marcada por uma trilha que foi se conquistando diversos espaços ocupados já no início dos anos 80, quando ela iniciou sua carreira profissional ministrando aulas no Departamento de História e Geografia e no Departamento de Ciências Econômicas. Na entrada dos anos 90, Teresinha lecionou no curso de Mestrado em Educação, no Centro de Ciências da Educação:
Dessa forma, minha experiência docente abre-se para vários cursos, em virtude do espetro da minha formação. Fui professora de diversas disciplinas, principalmente na área de teoria e metodologia da história, historiografia, história econômica, história do Brasil e história do Piauí[38].
Nos congressos e eventos acadêmicos em geral, Teresinha compartilha resultados de pesquisas resultantes dos desdobramentos do eixo histórico-econômico, onde podemos citar alguns exemplos: “Inovações tecnológicas na exploração das maniçobas no Nordeste”, apresentado na II Reunião da Sociedade Brasileira de Pesquisa Histórica, em São Paulo (1983), “A economia piauiense de 1850 a 1950” (1993), “R. N. Monteiro de Santana e a historiografia econômica do Piauí”, publicado no Congresso Internacional de Cultura e Patrimônio Cultural, em Teresina (2008) e “O quadro da economia piauiense no século XX” (2019).
Numa entrevista concedida ao professor Francisco de Assis de Sousa Nascimento no início dos anos 2000, Teresinha conta que, logo após concluir suas pesquisas na área econômica no mestrado, ela começa a ter contato com outras tendências historiográficas que foram responsáveis por uma mudança de olhar no seu campo de atuação.
Isso foi possível porque o fazer historiográfico entre as décadas de 80 e início de 90 no Brasil ainda estava vinculada aos estudos políticos e econômicos marxistas, resultante do continuísmo temático explorado nos anos 60/70. Devido ao processo de busca por novas abordagens teórico-metodológicas para ampliar as possibilidades de escrita da História, “novas formas de pensar a sociedade […], sobretudo as formas, agora aceitas de pensar a cultura”[39] se legitimavam no ambiente acadêmico e ela estava atenta aos movimentos nos bastidores da universidade:
Ou seja, na historiografia brasileira, […] começam a circular algumas obras fundantes para os modelos historiográficos que se estabelecem na década de 1990 e após, e que acenavam, para quem estava saindo para os doutorados, como modos novos de pensar o campo historiográfico. Dessa forma, quando iniciei o doutorado, em 1987, já o fiz voltando-me para a discussão na área da cultura, que até então era considerada secundária e, até certo ponto, não politizada. Havia, nesse período, um preconceito muito grande com relação à discussão da cultura e os temas mais valorizados eram realmente os da história política. Voltei-me para esse novo interesse justamente porque me via, naquele momento, numa condição de esgotamento da discussão de natureza econômica […] considerava que minhas possibilidades de crescimento profissional, pelo menos naquele instante, esgotavam-se naquele campo[40].
Teresinha redirecionou seu olhar para um conjunto de fontes que se acumulavam no Arquivo Público do Piauí. Inicialmente, o interesse era marcado por curiosidade em conhecer – nas brechas que as aulas na UFPI lhe proporcionavam visitar o Arquivo – um acervo que contava com cerca de 1500 livros sobre temas ligados a história do estado produzidos no final do século XIX e início do século XX. “Não tinha ideia de que aquela atividade seria um embrião” que a motivaria a “continuar pesquisando coisas novas que se colocavam para a história naquele momento”[41].
Após conquistar uma bolsa em 1986 para iniciar o doutorado na França, sob orientação de Frédéric Mauro, seus planos eram estudar no ano seguinte a história da pré-industrialização no Nordeste, mas não foi possível prosseguir com os planos, já que a liberação dos recursos para pesquisar fora do Brasil não foram contemplados, numa fase de cortes orçamentários na educação no governo Sarney.
No intervalo em que aguardava respostas sobre ir ou não para a França, a professora Maria Beatriz Nizza da Silva a convidou para fazer doutorado em São Paulo. No final de 1986, aceita o convite para continuar seus estudos na Universidade de São Paulo, sob a condição da orientadora de que sua pesquisa fosse realizada “no âmbito da cultura”, explorando uma temática no campo da “cultura brasileira nos séculos XIX e XX”[42].
Suas idas e vindas ao Arquivo Público foram fundamentais na elaboração do projeto, fruto das novas inquietações em torno da relação história e literatura que surgiram daqueles documentos pouco estudados naquele período: “esse conjunto de circunstâncias levou-me a romper de uma maneira quase que radical com o tipo de problematização que eu colocava à história do Piauí”[43].
A experiência acadêmica em São Paulo trouxe um leque de oportunidades para Teresinha renovar as ferramentas de trabalho na elaboração de narrativas na ótica da História Cultural. Além dos seminários interdisciplinares que participou, a influência dos professores Renato Janine Ribeiro, Michael Lowy nas disciplinas que ministraram sobre história e literatura geraram condições para quebrar as barreiras no modus operandi de escrever sobre o passado.
Sobre a diferença nas trajetórias de pós-graduação no Paraná e São Paulo, ela afirma que, em relação às disciplinas que estudou na Universidade de São Paulo:
(…) voltavam-se basicamente para os focos literários, traziam para a discussão questões, que, na época, eram ainda novas, vinculadas à possibilidade de se pensar a história não como um dado, como um real que só se expressa a partir daquilo que é materializado, mas como um real que se expressa também por aquilo que é virtual. Então, tive a oportunidade de trabalhar com autores e referências que ampliavam extraordinariamente o campo da história não só do ponto de vista temático, como do ponto de vista da relação com dimensões da história vivida que, até aquele momento, não eram vistas necessariamente como pertencentes ao campo historiográfico – a literatura, a religião, a natureza e outras.
Essa passagem por São Paulo me permitiu ter acesso a referências teóricas que não estavam dadas pela experiência como estudante no Paraná. Fiz mestrado em Curitiba, mas, naquela época, final da década de 1970 e começo da década de 1980, o Departamento de História era praticamente uma filial da Escola dos Annales. Minha orientadora, Cecília Maria Westphalen, fora aluna de Fernand Braudel, líder daquela Escola e, de alguma maneira, nós, os alunos, tínhamos as vistas voltadas para Paris. Líamos sobretudo os franceses e tínhamos acesso, inclusive, a muitos professores europeus que eram convidados a fazer conferências e a ministrar cursos. Em São Paulo, o espectro que se abriu para mim foi muito mais ampliado. […] Eles tinham um leque […] de metodologias e de teorias e lidavam com um conjunto de autores muito mais diversificado que o dos professores do Paraná, cuja experiência, à época, é possível definir como uma experiência sobretudo francesa[44].
Assim, a literatura tornou-se o objeto central nas pesquisas de doutorado e um dos principais campos de estudo explorado ao longo da sua carreira. Antes de conhecermos as escolhas e caminhos definidos por Teresinha a partir dessa virada temática, precisamos destacar como ela aborda a importância da ficção como instrumento na compreensão do passado.
Na palestra “História e Literatura” – proferida em 1996 na Academia Piauiense de Letras[45] – ela faz uma análise sobre as possíveis articulações teórico-metodológicas entre as duas áreas do conhecimento. Para os graduandos que estão iniciando suas leituras em torno do assunto, ler esse trabalho é praticamente uma obrigação na Universidade Federal do Piauí. Difícil algum discente não ter dedicado seu tempo neste texto. Eu li várias vezes e é um guia importante para articular minhas leituras na área.
Agregar estudos de obras literárias no meio historiográfico foi resultante da renovação pela qual a pesquisa foi atravessada a partir experiências geradas no universo da Escola dos Annales, absorvendo para si “os possíveis até mesmo irrealizáveis” dos acontecimentos, construindo “um repertório de possibilidades dadas pela história”[46] além do concreto, mas também do virtual e da sua riqueza na produção de narrativas. Ela buscou “realçar algumas dimensões que restavam invisíveis nas concepções de história que dominavam até pelo menos aos meados do século XX”[47].
Utilizar a literatura como fonte histórica a auxiliou a compreender um conjunto de abordagens que vão além da “vida e obra” contida numa obra literária, elementos que se fechavam nos biografismos e contextualizações simplistas. Para ela, foi possível extrair uma série de elementos para alargar a investigação sobre o passado, principalmente “no que concerne à vida cotidiana, às dimensões da subjetividade, às relações mais próximas entre a vida social no seu sentido mais amplo e a vida literária”[48].
Nesse sentido, a história se apropria da literatura para captar a riqueza do campo ficcional, sem tomar os elementos estéticos ou sua especificidade interna como ponto de partida, mas seu universo criativo enquanto possibilidade de estudo sobre as alternativas de elaboração narrativa daquele período abordado. Ou seja, “virtualidades que não necessariamente se desenvolveram ao longo de processo real ou foram vencedoras dentro das tessituras explicativas enunciadas pelos historiadores”[49], sem esquecer do rigor documental na análise do recorte temporal em estudo.
É necessário destacar o papel do literato, que escreveu e deu vida aos personagens que habitam o cenário ficcional em estudo, priorizando uma abordagem que aponte como seu percurso e individualidade cruzou com o tecido social que compõe o texto, mas para isso, precisamos estar atentos: as obras de arte são dotadas de “sentido principalmente a partir da situação social do produtor”.
Trabalhar a relação História e Literatura é ter a clareza de que “a história ou o contexto é maior que o produto-objeto, maior que o produto-sujeito e que esse social modela tanto o produtor quanto o produtor”.[50]
Ao ler um romance, podemos compreender a forma como o escritor(a) elaborou seu pensamento sobre o mundo que o cercava, registrando possíveis vivências coletivas ou individuais da sociedade, independente das suas pretensões documentais ou ficcionais. Mergulhar na ficção utilizando a lente histórica é um meio de entender que o meio social é um componente que forma e informa a linguagem literária, define o escritor(a) e gera o produto final, o livro: “a literatura informa a história, mas essa história produz uma certa literatura, e essa relação é necessariamente incontornável”[51].
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A partir de 1988 – quando retorna de São Paulo – Teresinha dedicou seus anos de pesquisa no Arquivo Público do Piauí para escrever a tese. Para otimizar o tempo na investigação das fontes hemerográficas na escrita de “Os Literatos e a República: Clodoaldo Freitas, Higino Cunha e as tiranias do tempo”, ela formou uma equipe para auxiliar na prospecção dos dados, construindo os caminhos que fortaleceram sua identidade temática e os elementos que comporiam a problematização exploradas no estudo. O modelo que a inspirou nesse desafio foi a obra “Literatura como missão”, de Nicolau Sevcenko.
[…] ou seja, discutiria o papel do literato na conjuntura social e política brasileira no final do século XIX e começo do século XX. Em princípio, imaginava que encontraria no Piauí uma situação similar àquela do Rio de Janeiro, que é justamente a configuração da derrota do literato no campo social e político carioca daquele período. Mas trata-se de uma derrota que é parcial […]. Eu imaginava, de início, que no Piauí iria encontrar uma situação semelhante. Parti, assim, dos pressupostos dele, mas teria que montar todo o conjunto documental que possibilitasse a análise, tentando fazer a corroboração daquela ideia. Ao tentar fazer isso, deparei-me com o caos. Nós não tínhamos […] um acervo organizado, e nem tínhamos, na UFPI, a socialização de um conhecimento acerca dos literatos aos quais dei relevo na tese e com a publicação do livro […]. Tive que fazer um levantamento completo, e complexo também, de autores, livros e publicações do período. Como as publicações na forma de livro foram muito restritas no final do século XIX e início do século XX, o espaço mais significativo para a divulgação desses literatos foram os jornais […]. Esse trabalho, com o tempo, foi tornando-se seletivo na direção das obras de Clodoaldo Freitas e Higino Cunha[52].
Nos dois anos seguintes ao processo de catalogação das fontes, Teresinha escolheu os escritores citados porque suas publicações iluminavam uma série de debates históricos, políticos e literários que a interessavam, principalmente pelo fato de que eles tiveram formação intelectual vinculada ao curso de Direito em Recife, “fazendo com que eu me ancorasse num ponto de partida, a formação superior tal qual ela era dada na Faculdade de Direito em Pernambuco”[53].
Após mapear e transcrever 805 textos de Clodoaldo Freitas, 222 textos de Higino Cunha[54], sem falar nos 5000 mil documentos (fontes manuscritas, documentação oficial impressa, jornais, revistas, almanaques, livros, folhetos, transcrição de conferências, artigos) com temas variados sobre a época, seja na esfera política, social, religiosa e econômica nos estados do Teresina, São Luís, Rio de Janeiro, Recife e Belém, ela escreve uma tese marcada por uma riqueza documental sem precedentes na historiografia da cultura piauiense.
“Os Literatos e a República”[55] investiga a atuação dos escritores no âmbito social e político no Piauí na transição do século XIX para o século XX, levando em consideração que a análise e divulgação desta produção literária não foi tema de pesquisa na historiografia até aquele momento.
Nos milhares de jornais descobertos, Teresinha constatou que algumas obras contidas na documentação não foram publicadas para além daquele suporte. Infelizmente, parte do material se perdeu ao longo do tempo.
Nesse sentido, a tese analisa a participação dos escritores no meio político/jurídico, partindo das escolas de Direito e sua relação com a cena literária em questão, apontando suas ramificações na experiência com o meio social, cultural, na imprensa, na política, nas engrenagens burocráticas da administração do estado, nas polêmicas anticlericais em tempos de “secularização da sociedade ocidental”[56] e suas vivências urbanas em Teresina e estados que estes personagens percorreram na Primeira República[57].
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Compreendendo as condições e particularidades sociais do Piauí, a pesquisa é movida por inquietações que levaram a investigar como se deram a aplicação dos aprendizados adquiridos na academia e de que forma os literatos exerciam suas leituras no cotidiano, descobrindo que lugar eles ocupavam e como a sociedade recepcionava seus pensamentos: “que expectativas se criavam em torno da sua ação? Como eles se autodefiniam? Qual a consciência que tinham da sua atuação na sociedade?”[58]
Do ponto de vista do enquadramento social, tanto a literatura brasileira, como a piauiense, de 1880 a 1920, marcam-se por características gerais que podem ser resumidas no conceito de literatura como missão. É possível falar de uma literatura combatente, de escritores cuja dimensão da sociedade é marcada e moldada pelo desejo de atuação e mudança. Modificam-se os interesses, abolição, república, moralização dos costumes políticos, educação, civilidade, modernização, progressos materiais diversos – mas a ordem é interferir, é criar mecanismos de acesso ao poder e à direção das consciências sociais. A redenção das massas da condição de miséria social e intelectual em que viviam colocava-se aos literatos, nesse momento, como projeto unificador[59].
Teresina passou por muitas transformações estruturais[60], demográficas e produtivas, afetando a dinâmica nas relações humanas, resultante da integração urbana com as novas formas de sociabilidade e experiências com suportes de difusão cultural até então vistas com estranhamento, euforia e tensão pelo desconhecido.
O século XIX vai fechando seu ciclo e Teresina ainda se assemelha a uma cidade do interior, “quase um arraial” interagindo com os bichos, muita poeira e casebres feitos de palha. A ideia de progresso circula como um desejo no imaginário na população. As elites se deslumbravam com salões de festas típicas das capitais, água encanada, aulas de piano e luz elétrica. Os “milagres” trazidos pela modernização foram chegando lentamente em Teresina.
Esse contexto foi captado pelos literatos e jornalistas, que registravam na imprensa os impactos das mudanças sentidas na cidade que se modernizava. Após nos mostrar o cenário urbano e as condições em que os literatos viveram será possível entender como eles se moviam por estes espaços e os enfrentamentos travados por parcela dos intelectuais, habitantes de uma Teresina vista como “uma cidade esquisita, com um núcleo civilizado e uma enorme circunferência de quase barbárie”[61] que se esforçava para atingir o “progresso”[62].
Por trás das expectativas dos cronistas em projetar nas suas narrativas o sonho da cidade imersa na experiência da modernização, Teresinha aponta uma situação desconfortável, que ardia nos olhos da elite: a convivência com a pobreza. “Esse mundo tão visível e tão incômodo (…) é mais subterrâneo nas fontes do que nos valemos para este estudo”[63].
Mesmo com a tentativa de alguns jornalistas em “querer destruir e negar” esta realidade, “para dar espaço ao da abastança e civilidade”[64], era impossível se desviar das ruas lotadas de pedintes em busca de uma xícara de farinha ou qualquer trocado. Este problema socioeconômico se agravou por causa da crise econômica resultante do fracasso nas exportações da maniçoba a partir de 1913:
[…] Teresina já era uma cidade de pobres, atraindo outros iguais, com seus sonhos de redenção. Crescendo a partir das fímbrias, em contornos circulares ao casario de telha, acinzentando de palha os caminhos do norte, do leste e do sul. Em sua infância, Teresina já convive com a mendicância de velhos abandonados, com crianças desvalidas e famintas, com mulheres desgraçadas pela fome e pela miséria[65].
Mergulhada em contradições sociais e econômicas, os problemas revelados nos jornais não impediam de a população buscar formas para se divertir e fortalecer seus laços de sociabilidade na capital. São nesses lugares de encontros, confraternizações, deslumbramento e polêmicas que a tese percorrerá, situando-os como ponto de virada nos modos de prática e experiência urbana.
A população abre-se para o novo, levando em consideração que até aquele momento, Teresina era uma cidade dominada pelo tédio e sem assunto para os jornais, com exceção “para a matracagem da vida alheia”, como disse Jônatas Batista[66]. Antes, uma “cidade sem diversões”, o público despertou para uma pluralidade de reações à vida moderna que se apresentava no âmbito da cultura, “cada novidade trazia em si um susto, um movimento de admiração e também um frêmito de medo”[67].
Contrapondo-se às festas populares (prendas, bailes, festividades religiosas), Teresina abriu um leque de opções para o público se divertir em setores do entretenimento – na sua maioria já conhecidas na cidade – como o teatro, cinematógrafo, carnaval, espetáculos circenses e passeios pelas praças.
Sua pesquisa irá analisar a interação do público com as linguagens artísticas que movimentavam o circuito cultural, para compreender o consumo da arte, bem como toda a performance que a envolve (vestuário, corte de cabelo, preferências estéticas, educação, etc), enquanto elemento que instaura no indivíduo uma posição que exige deste uma nova postura diante da civilidade e da modernização dos costumes.
Ou seja, Teresinha estuda as relações sociais e a recepção dos teresinenses em torno das expressões artísticas a ela ofertadas, não a arte ou análise estética em si:
Em Teresina, novas forma de civilidade a muito custo vinham sendo introduzidas. Crianças e adultos estavam sempre, pelo menos na avaliação dos redatores dos jornais, precisando de corretivos e ajustes de maneiras. Precisavam aprender a manter as distâncias sociais, a frequentar os eventos públicos e privados, a bater palmas – aplaudir é também um saber, uma arte – a receber, a se comportar na mesa, a não avançar nos banquetes, a não roubar objetos pessoais nas toaletes alheias e vários outros hábitos da boa convivência social. A interferência sobre os costumes estava expressa na fala dos redatores, que apontavam para as novas formas de civilidade e esse aprendizado se realizava, em boa medida, por meio do lazer. […] Nossa proposta é de subverter a leitura da fonte – para o espetáculo, movimenta-se a plateia, vem para a cena o público, que é nosso objeto de conhecimento[68].
O recorte temporal estabelecido no estudo sobre as relações de sociabilidade nos espaços de lazer em Teresina inicia em 1880, quando os documentos apontam que nesse período, a população exigia a criação de um teatro para fazer parte do cardápio de diversões na capital, já que as artes cênicas era uma das manifestações artísticas preferidas do público.
Para ela, e os momentos iniciais na inserção do consumo das artes no estado deveu-se:
Da crescente demanda por lazer e por lazer que contemplasse a família burguesa, da incipiente classe média urbana, permite o esforço ora mais, ora menos bem-sucedido, de produzir e recepcionar grupos e associações diferentes ligados à música, ao teatro, ao cinema e às diferentes formas de passeios distintos[69].
Dessa forma, sua análise articula-se com a relação entre a recepção do público e as peças exibidas nos teatros e filmes – como o Concórdia e Theatro 4 de Setembro – através do papel da imprensa, espaço decisivo que atuava como mediadora “entre o público e o espetáculo”, exercendo uma influência direta no “intuito civilizador” das práticas culturais dos espectadores teresinenses, que ia do curioso “canalha”, da “plateia incorrigível e impossível mesmo de ser suportada”[70] à elite que frequentava o teatro com suas melhores roupas.
Apesar dos preços pouco acessíveis e uma série de regras de etiquetas e vestuário impostas para causar “boa impressão” – a fim de demarcar uma rachadura social entre pobres e ricos – nem sempre se levava esses aspectos a sério, pois o que se via era exatamente o contrário. A população geralmente borrava essas fronteiras e ultrapassavam as hierarquias.
Cronistas registram a presença de frequentadores que entravam sem pagar ingresso, gritavam, soltavam vaias estridentes no meio do espetáculo, sem falar nos aplausos fora do tempo, e o que dizer das brigas e quebradeiras durante uma apresentação? Os relatos de garotos que invadiam as peças ou ensaios para atirar pedras contra os artistas causavam pânico nos redatores. Essas pessoas que “fugiam” do processo civilizador era motivo de muitas pautas nos jornais.
Ocupando o Teatro Concórdia, Theatro 4 de Setembro, Clube dos Diários, Teatro 24 de Janeiro, dentre outros espaços, o público se divertia com os dramas, comédias, mágicas, espetáculos com temática religiosa, números de prestidigitação, tietavam o elenco e acompanhavam a repercussão das peças nos jornais.
Considerada uma prática cultural popular em Teresina, o teatro deparou-se com uma novidade que gerou reboliço entre os apaixonados pelo lugar: o cinema.
Nos primeiros anos dessa invenção, ela é uma entre outras. Sua sedução deriva do encontro da ciência e da tecnologia com o encantamento pelo novo e de um surpreender pela ilimitabilidade humana na criação de artefatos os mais diversos e complicados. Aparece em vários países e regiões, com diferenças pouco consideráveis no seu mecanismo e com nomes os mais distintos. O final do século XIX diverte-se, em todo o mundo, com […] dezenas de aparelhos com funções similares[71].
Entre 1901/1902, as projeções cinematográficas em Teresina começam a conquistar o interesse do público de todas as classes[72]. Não se tem ideia em torno de quem foi o primeiro exibidor na cidade, mas os estudiosos – Joel Oliveira e Higino Cunha – afirmam que o cinema chegou em Teresina pelas lentes de Frederico Nauman e Bernhard Blum, que exibiram (respectivamente) “O enterro do Rei Humberto” e “Paixão de Cristo”, no Theatro 4 de Setembro.
A novidade causou medo e encantamento, reformulando o comportamento dos frequentadores nas salas de projeção, seja na busca pela postura correta de sentar, na etiqueta em se concentrar no filme sem atrapalhar quem está ao lado (porque era comum assistir um filme e ser interrompido pelos assobios e gritos dos mais eufóricos), e na paquera que excitava os casais na escuridão do cinema… Nasce o cinéfilo. O cinema agitou Teresina como local que retira os jovens das tediosas programações previsíveis.
Enquanto Higino Cunha acreditava que o cinema era a diversão do futuro, a reação do núcleo mais conservador da sociedade em Teresina pode ser refletida nas palavras de Elias Martins, que irá utilizar os jornais como instrumento para debater a influência negativa que os filmes causaram no público, com uma linha de pensamento alinhado ao catolicismo da época, sustentando a ideia de que o audiovisual tem influência “diabólica”, desviando o espectador da sua moral e bons costumes.
Ver um filme representava um perigo aos “desavisados”, já que “o cinema teria causado fissuras até no território da crença religiosa, penetrando no recinto do culto”. Os fiéis passaram a se ocupar em falar dos filmes em vez de prestarem atenção a missa, as mulheres estariam alienadas no mundo fantasia, deixando seus maridos e namorados em segundo plano, vítimas da “sedução e de encantos imaginários, povoados de príncipes encantados, de heróis sedutores”, um risco que poderia levar até a traição, pois “o notável sedutor estaria desencaminhando (…) as mulheres dos seus papéis tradicionais na família”[73].
Entre vários aspectos nocivos que o cinema trouxe para intoxicar a paz familiar cristã, podemos destacar também que esse mal provocou a desestruturação nas relações familiares, “propiciando aprendizado em relação a truques para extorquir pais e patrões na retirada de pequenas quantias para atender o novo vício”[74].
Clodoaldo Freitas não ficou atrás, ao revelar um posicionamento que vai ao encontro de Elias Martins: “o cinema além de perverter os costumes, perverte o bom gosto”[75]. Enquanto o conservadorismo imprimia suas opiniões nos jornais atacando os filmes em cartaz, o cinema se consolidou no gosto popular, acompanhada do interesse pela música.
Esta tornou-se uma prática muito próxima as elites locais. Aprender a tocar um instrumento caro (geralmente de sopro) era atribuída a um certo tipo de erudição, “relacionada com a educação da mulher, (…) vista como elemento civilizador e de atuação decisiva sobre os homens – maridos e filhos”[76].
Fazer parte dos circuitos culturais, seja na poesia, cinema, teatro ou música era demarcar um lugar de diferença, pois o acesso as artes traziam o emblema do refinamento, apartando os refinados dos incultos. Para isso, era primordial frequentar com assiduidade os eventos e fortalecer os laços de sociabilidade nos sarais, clubes musicais e salões, música, destacando-se no centro da vida cultural.
Higino Cunha comentou que o salão é importante para estimular o contato entre as famílias, para envolve-los com hábitos e práticas de refinamento social, aproximando os jovens que desejam se conhecer, desde que respeitem as normas impostas sobre a civilidade. O salão era local indicado para as mulheres que desejassem cultivar o bom gosto para estimulá-las a desenvolver “seus dotes interessantes para os homens”[77].
Em relação aos bailes de batizados, aniversários, casamentos e festividades em geral, Higino Cunha acreditava que, sem eles, o contato entre homens e mulheres perdiam força, pois os casais que flertavam ficavam distantes, devido a timidez. Isso se justificava porque havia uma vigilância constante dos pais sobre os relacionamentos que poderiam se desenrolar, com o olhar mais atento às moças envolvidas nos encontros para evitar que a interação seja mais “picante” ou “pouco lícitas”[78].
Diversão para poucos, os bailes e salões eram invadidos pelos curiosos ou “serenos”, que poderiam ser até inconvenientes, mas o fato é que ter um evento cercado de pessoas não-convidadas significava que a festa estava badalada, um sucesso, o “assunto” na manhã seguinte.
Os que faziam parte do sereno não tinham condições de frequentar eventos promovidos pela elite cultural, reafirmando a desigualdade de acesso a determinados bens culturais ou espaços de lazer, mas esses grupos que circundavam as festas chiques se encontravam no carnaval, a diversão mais popular da cidade.
Os desfiles dos mascarados, as festas elegantes regadas a confete, lança-perfume, o entrudo, a cultura carnavalesca foi ganhando forma, principalmente a partir da fundação do Clube dos Diários (1922), sede dos bailes frequentados por um público pagante (sócios) e convidados.
No meio da rua, a diversão ficava por conta das famílias que se encontravam para curtir a farra no Passeio Público da Praça Rio Branco, iluminada com energia elétrica e recheada de opções para uma boa conversa nos cafés Avenida e Suiço, ou para assistir um filme no Pálace Cinema, inaugurados entre 1912 a 1917.
A inauguração da praça, Clube dos Diários e dos outros centros de lazer são frutos da demanda social à procura de diversão na cidade, estreitando os afetos e encontros dos corpos que, mesmo sob vigilância, arriscam dar alguns beijos e abraços, quando os olhos que julgam se distraem.
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Após analisar os aspectos sociais que informam as práticas e consumo dos teresinenses no âmbito cultural, a tese avalia a situação educacional do Piauí, expondo como os bacharéis e literatos atuavam numa cidade soterrada pelo analfabetismo. Não apenas as experiências de sociabilidade no âmbito do lazer cavaram abismos de exclusão, mas a educação[79] tornou-se um elemento definidor que distanciava a elite dos demais habitantes da capital.
Tal afastamento entre a população e os intelectuais pode ser vista quando ela afirma que o estado possuía uma quantidade de analfabetos em proporção acima da população total. No livro “A Educação no Piauí (1880-1930)”, Teresinha aprofunda como o sistema educacional foi implantado no estado.
Esta pesquisa debruçou-se nas fontes oficiais, ou seja, um conjunto de relatórios dos diretores de Instrução Pública e discursos realizados pelos presidentes de Província e os governadores que atuaram neste recorte temporal. O livro é uma referência na complementação de leitura da tese, pois a “coletânea de trechos da documentação oficial relativa à segunda metade do século XIX”[80] é rica em informações sobre a chegada do ensino público no estado, desde a instrução primária à escola de aprendizes artífices, da fundação das escolas particulares e da participação feminina na educação.
Mesmo com índices de analfabetismo tão alarmantes, houve algum interesse do estado em instalar escolas na capital e interior, mas a realidade apresentava dificuldades, tornando o projeto de escolarização malsucedido pelos órgãos municipais/estaduais, com instituições de ensino fechando por carência de alunos, mesmo com a obrigatoriedade de a criança frequentar o espaço escolar, sob a pena de prisão ou multa[81].
As fontes apontam para uma série de problemas, se levarmos em consideração que a crise na educação pública é sentida desde os tempos imperiais e poucas mudanças foram sentidas no decorrer da República. Entre os variados pontos críticos elencados, podemos destacar o caso de professores que eram semi-analfabetos, bem com os concursos:
(…) fraudulentos; ordenados miseráveis e frequentemente atrasados; inexistência de prédios escolares e de verba suficiente para aluguel de salas de aula; perseguições políticas exercidas pelos inspetores literários; inexistência de material didático, como cadeiras, quadros de giz e livros – sendo a prática usual a dos alunos se alfabetizarem utilizando jornais velhos que alcançavam o interior; exonerações e substituições devidas unicamente a critérios da política partidária. Não é possível deixar de referir-se à incipiente urbanização, às distâncias a percorrer pelos alunos até alcançar a aula primária e à própria condição das crianças, “doentias, maltrapilhas, descalças e sem livros”, segundo uma das descrições do período. As condições materiais da Província/Estado mudavam de forma muito lenta, porém eram sucessivas e frequentes as alterações na legislação escolar[82].
Os literatos vinculados ao magistério tinham como alternativa dar aulas particulares em casa para ganhar um “extra”. Higino Cunha foi um desses professores, ao somar a renda ensinando Português e Filosofia na década de 1880. No começo do século XX até 1925, trabalhou no Liceu atuando em várias disciplinas, principalmente Francês e Inglês. Na Escola Normal, além do Francês, dedicou-se a lecionar Literatura Brasileira e Portuguesa. Chegou até ministrar aulas de Matemática.
O ensino público era um ambiente marcado pela insegurança, já que muitos profissionais eram submissos às pressões que iam das indicações de nomes à perseguição, que exonerava os profissionais de acordo com a variação da temperatura política do momento.
Oriundo de família de baixa renda, ele aprendeu suas primeiras lições com seus irmãos em casa. Aos 12 anos, saiu de São José das Cajazeiras (atual Timon-MA) para Teresina e trabalhou como caixeiro. Aprendeu português, gramática, aritmética e escrituração mercantil, o que o levou e ter interesse pelo comércio, mas terminou morando em São Luís aos 20 anos para estudar no preparatório para o curso de Direito[83], tendo em vista o reconhecimento dos parentes de sua vontade em dedicar-se ao mundo das letras e leis.
Clodoaldo Freitas, ao contrário, nasceu de família tradicional oeirense com prestígio social e atuação no campo político, ocupando espaços “na magistratura, na burocracia urbana, nas Assembleias Provincial e Geral, na Presidência da Província, na vida eclesiástica e na carreira militar”[84].
Em Oeiras aprendeu latim e francês para aperfeiçoar sua fluência nas línguas[85]. Inicialmente, ele se interessou nos estudos eclesiásticos, mas declinou da ideia e mergulhou de vez no campo do Direito, migrando do Seminário das Mercês[86] para o Liceu do Maranhão. Assim como Higino Cunha, atuou na educação básica, mas sua experiência docente não foi realizada de “modo permanente e regular”[87].
Sua trajetória como professor foi marcada por muitas dificuldades, desde a demissão do Liceu Piauiense, quando assumia o cargo de professor de História em 1885 – após a derrocada do Partido Liberal – até sua tentativa de ocupar a função de Inspetor Escolar no longínquo município de Lábrea (AM), já que no Piauí estava sem oportunidades de trabalho resultante dos conflitos políticos com Coroliano de Carvalho Silva. Mal conseguiu assumir o posto, foi obrigado a voltar “atacado de febres, entre a vida e a morte”[88].
Em 1903, Clodoaldo conseguiu uma vaga na Faculdade de Direito do Pará, oferecendo o serviço de lente. O emprego só foi possível com a ajuda do seu amigo Heitor Castelo Branco, pois Clodoaldo não conseguiu reconhecer seu diploma como Deputado Federal no Piauí. Cinco anos depois, deslocou-se para São Luís para lecionar aulas particulares no Instituto Almir Nina[89].
No Piauí, a situação envolvendo a falta de acesso à educação era alarmante. Tomando o ano de 1867 – década em que Clodoaldo e Higino deram início aos estudos – a população da província era composta por cerca de 171.970 habitantes. Os números apontam para os “indicativos quanto ao pouco atendimento da população escolarizável. Em 1866, a instrução pública primária atendia apenas 0,55% da população, ou seja, para cada 180 pessoas uma estava na escola”[90]. Com o advento da República, esses dados praticamente não sofreram mudanças nas décadas que passaram.
Com poucas expectativas de que o ensino público teria melhoras, a alternativa encontrada foi investir na educação particular, para suprir a demanda dos interessados em estudar e não viam na escola pública um local adequado para aprofundar seus aprendizados.
O final do século XIX foi marcado pela oferta desse serviço, a partir da criação de escolas focadas na instrução primária e secundária, também conhecidos como preparatórios. No Piauí, algumas escolas particulares tornaram-se internatos, para acolher estudantes do interior[91].
Com uma bagagem intelectual marcada pelas experiências no campo da política e do Direito, História e jornalismo (d’A Imprensa, A Democracia, Gazeta do Comércio, A Federação, O Estado do Amazonas…) Higino Cunha contribuiu com o debate educacional no Estado[92], abordando um conjunto de temáticas que visaram explicar as contradições que levam nosso atraso educacional:
O folheto O ensino normal no Piauí, de 1923 […] pertence a essa fase de renovação do interesse pela educação no Piauí […]. Entre os temas abordados no folheto estão o feminismo e o ensino feminino, o ensino normal, a educação popular, o analfabetismo no Brasil e especialmente no Piauí. Nesse trabalho, Higino Cunha [afirma que]: “Uma das causas do nosso atraso em todos os domínios da atividade humana está na preocupação sovina e mesquinha de reduzir ao mínimo as despesas com o ensino popular. Os professores continuam a ser muito mal remunerados, não havendo compensação monetária aos sacrifícios que fazem nos estudos profissionais e no exercício penoso do magistério”[93].
Na entrada do século XX, a capital expandiu suas atividades no setor educacional, seja na esfera leiga ou religiosa. Alguns proprietários de escolas particulares optaram por seguir a primeira vertente, devido a influência da maçonaria na sua formação, acreditando na perspectiva de que poderiam “atenuar os efeitos da educação ministrada pela Igreja ou de caráter religioso”[94].
Em contraposição, às escolas religiosas ganharam força em Teresina por defender o princípio educacional como instrumento de “orientação das consciências” através de “seu programa educativo, fundando os colégios do Sagrado Coração de Jesus, sob responsabilidade das Irmãs Catarinas de Sena e o Colégio Diocesano São Francisco de Sales, dos Jesuítas, ambos em 1906”. Nas fontes, Teresinha afirma que há indicações que as duas escolas citadas se tornaram “preferências dos pais de alunos de Teresina”[95].
As instituições de ensino religioso tiveram maior prestígio social em Teresina, visto que, por exemplo, o Liceu Piauiense (ensino secundário público) vivenciou uma série de dificuldades estruturais, bem como na composição do corpo de professores até cerca de 1916, levando os pais a matricularem seus filhos nas escolas particulares ou religiosas, reflexo de que as escolas públicas “nunca deram conta das exigências e necessidades educacionais”[96].
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Os literatos e intelectuais que surgiram numa conjuntura na qual maioria da população manteve pouco contato com o mundo das letras reforçou a ideia de que este grupo privilegiado deve ser entendido como a elite pensante, por possuírem uma base cultural afinada com seu tempo, impondo à sociedade seu lugar de reconhecimento e valorização social.
Um aspecto de distinção pode ser visto no trânsito que parcela desses estudantes fizeram aos cursos superiores[97] ofertados fora do Piauí, principalmente na Faculdade de Direito de Recife, entre 1880-1890.
Nessa fase, Clodoaldo[98] e Higino adentraram num universo que abriu os horizontes para a “difusão de ideias novas, [proporcionado uma maior] participação social e política dos estudantes […]. Aos interesses literários acrescentavam-se a intensa participação política e as discussões anticlericais”[99].
No Piauí, a fraca presença da igreja institucional e os intercâmbios culturais com os centros educativos regionais trouxeram para a ordem do dia as reações anticlericais, de que são produto as colaborações na imprensa de Clodoaldo Freitas, Higino Cunha, Francisco Alves do Nascimento Filho, Leônidas e Sá e as posturas dos pensadores-livres mais discretos, como Demóstenes Avelino, ainda na década de 1880. […] Em Teresina, cabe a Maçonaria lugar de destaque nas aguerridas lutas políticas do começo do século XX. As disputas de poder entre as diferentes frações das classes dominantes incluem igualmente seu esforço político. Fazia parte do ideário maçônico a crença de que o clero deveria ocupar lugar secundário na política, bem como a convicção de que a construção do projeto social moderno deveria passar longe da influência da Igreja. Os políticos, sobretudo os mais jovens, igualmente concebiam a sociedade de forma bastante distanciada da reflexão católica[100]. […] Não resta dúvida, entretanto, quanto ao interesse da maçonaria forte atuação ao lado da ciência, com o sentido de contraposição às diferentes formas de tirania da Igreja e do Estado. […] a maçonaria enfrenta lutas que poderiam ser chamadas de lutas específicas, mas que têm o sentido de abrir espaço para o moderno, para a construção de um mundo não alicerçado nos cânones medievais repropostos pela Igreja, alvo preferencial da crítica feita pela maçonaria, dentro do espírito liberal. Uma dessas lutas específicas é contra a educação religiosa e tem claramente o sentido de divulgar e valorizar uma educação laica, mais volta para a absorção dos valores modernos[101].
Somadas a essas circunstâncias locais, Teresinha constatou que nos momentos iniciais do século XX, a produção literária piauiense foi marcada pelas gerações anticlericais materialista-cientificistas[102] oriundas da Escola de Recife (conduzidos pelas lentes civilizatórias/modernizadoras europeias[103]).
Inspirados pela filosofia iluminista, o naturalismo e pela mistura “de posições tiradas do Materialismo, do Positivismo, do Evolucionismo”[104] uma parte dos pensadores questionaram o papel da Igreja Católica[105] na sociedade, adotando uma perspectiva de que a razão, ecumenismo e a cientifização do mundo ocupam deveriam provocar “recuos na religião”[106].
Nas obras analisadas, a tese identificou vários eixos temáticos com viés anticlerical. Nas revistas[107], haviam textos focados nos debates que polarizam a ciência X religião ou estudos antropológicos, escritos por Clodoaldo Freitas e estudos cruzando ciência e religião, de Higino Cunha.
Houveram escritos voltados para o público amplo, com tom jocoso, geralmente com autoria assinada por pseudônimo, além das polêmicas nos jornais maçônicos[108] e os periódicos (A Imprensa, Revista Mensal, O Reator, etc), como “a crítica de Clodoaldo Freitas ao livro Visões de Hoje, de Martins Júnior” (1881) e as frequentes participações de Higino nos embates na imprensa entre 1904 a 1912[109].
A empolgação de Clodoaldo sobre esta fase de descobertas em Recife pode ser lida nas suas memórias, escritas em 1916:
No Recife, em centro mais vasto, dedicando-me a estudos mais sérios e profundos, atirei-me na filosofia, à literatura, à história e à crítica religiosa, lendo, sem método, mas lendo muito, todos os livros que encontrava, tomando conhecimento com os grandes pensadores e poetas de todos os tempos. Pouco me ficava dessa leitura desordenada[110].
Estudar em Recife arejava o pensamento, oportunizando Higino e Clodoaldo a participarem dos debates que ecoavam no circuito letrado da época. Temas como abolição, republicanismo, ciência, anticlericalismo, literatura envolviam por completo o interesse deles para ir a fundo no desdobramento dessas questões.
Quando Higino iniciou seu curso em 1881[111], tornou-se “testemunha de uma fase de ventos renovadores do período”, mas “nem por isso deixa de viver a rica vida extra-academia”[112]. Autodeclarava-se livre dos credos religiosos e influenciado por Tobias Barreto[113], foi um frequentador disciplinado das aulas, discursos em sua casa, a fim de manter proximidade com outros admiradores.
Enquanto Higino possuía um “gosto mais acentuado pelos estudos jurídicos”, Clodoaldo[114] “confessa que o direito, como era ensinado então, o enjoava por sua esterilidade e secura”, dando preferência pela literatura e filosofia. “Contudo, o moço acadêmico nunca fez má figura nas aulas e nos exames[115].
Ao longo da década de 1870-1880, eles seguem vinculados ao movimento do Recife, enviando um conjunto de colaborações para a Folha do Norte, A Província e o Arquivo Brasileiro. O desejo de manter uma prática de escrita em conexão com os pernambucanos deveu-se ao fato de continuar colaborando com os debates que eles viveram durante o curso de Direito, na definição de pautas voltadas para as:
(…) explicações científicas do mundo, lutas visando à democratização do país, explicações naturais acerca do homem e da sociedade, participação em polêmicas anticlericais, bandeiras do abolicionismo e do republicanismo (…). Em outras palavras, todo o objetivo de sua ação estaria orientado, na vida dos dois, no sentido de libertar a mentalidade nacional do obscurantismo e das crendices tradicionais[116].
Todo o entusiasmo com a Escola de Recife desde chegada de Clodoaldo até a saída de Higino, foi fundamental na expansão de pensamentos combativos e polêmicos, alcançando estudantes sintonizados na mesma linha crítico reflexiva em vários cantos do Brasil[117] (muitos piauienses deslocaram-se para Recife entre 1907-1911). Porém, trinta anos depois, toda a agitação intelectual ao redor da faculdade foi perdendo seu brilho original.
O avanço da febre amarela e varíola infestaram a capital pernambucana, freando o fluxo de novos estudantes para estudar Direito na sonhada faculdade, resultante da decadência que não se resume apenas a questão sanitária, mas por questões de ordem econômica.
O Norte do país tornou-se um lugar atrativo para os estudantes que se deslocavam até Belém, por causa do boom provocado pelo ciclo da borracha. Fortaleza e Rio de Janeiro também entraram no radar dos intelectuais, sendo este um local chamativo por estar no epicentro da política brasileira. “O que determinava a ida dos estudantes para esta ou aquela escola eram, em primeiro lugar, as conveniências pessoais e familiares e não a tradição acadêmica”[118].
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Percorrendo as bibliotecas de Teresina (Cromwell de Carvalho, Abdias Neves e Centro Social Cristo Rei) e o Arquivo Público do Piauí, Teresinha Queiroz faz um levantamento de parcela[119] das produções bibliográficas do Estado situadas no recorte temporal entre 1880-1930, realizadas por autores piauienses, seja com histórico de atuação local ou radicados fora do Piauí.
Ela encontrou vários obstáculos para dar início a esta fase da pesquisa, ao descobrir que as bibliotecas do Piauí possuem poucos exemplares de obras que orbitam seu recorte temático no acervo: “mesmo as obras dos autores considerados importantes no período, como Higino Cunha, Abdias Neves e Clodoaldo Freitas, são de difícil localização”[120], mesmo assim, foi possível localizar 433 livros e folhetos.
Apesar do número expressivo de fontes, não se pode afirmar que “esses resultados são definitivos, nem trabalhamos todo esse universo”[121], a pesquisa concentrou seus esforços em filtrar o acervo no estudo e catalogação de uma média de 150 obras que serviram de fonte para análise e interpretação do contexto de “Os Literatos e a República”, dando maior ênfase às fontes periódicas, ricas em conteúdo literário:
As informações das fontes bibliográficas foram confrontadas com as que representam o testemunho direto da época. Se nem toda literatura arrolada foi lida e explorada, de forma sistemática, esse acervo foi consultado na medida das necessidades impostas pelos diversos momentos da pesquisa. O cotejo entre os livros existentes nas bibliotecas do Estado, os que são apenas referência, mas com indicadores concretos de sua existência, e os livros dados nas biografias como publicados ou como inéditos, tem o sentido de mostrar, de forma tão clara quanto possível, todo o universo resgatável do mundo dos livros em questão. Com esse procedimento, é possível esclarecer muitos dos mecanismos de funcionamento da vida cultural e literária do período, evidenciando não só as dificuldades específicas da atividade editorial, como também os procedimentos de publicidade quanto a autores e obras[122].
A partir dos critérios elencados acima, pode-se concluir que em 1880, as publicações levantadas tinham como eixos temáticos principais a filosofia e literatura, poesias e breves estudos no campo político, destacando a atuação dos bacharéis que estudaram na Escola do Recife nesses escritos.
Dez anos mais tarde, os textos concentram-se em abordar reflexões no âmbito jurídico e político. Na entrada do século XX, os livros de poesia ganham visibilidade e mantém certa periodicidade nas décadas que se seguem vinculados a “outros gêneros [que] se fazem presentes, como a história, a crônica, a crítica religiosa e o libelo político. A partir do final da Primeira Guerra Mundial, emergem temas de interesse comercial, portuário, econômico, tributário”[123].
Além da investigação voltada para análise dos acervos nas bibliotecas, foi necessário compreender o contexto em que o Piauí se encontrava em relação ao circuito de produção gráfica, devido a “proliferação de poetas, cronistas, oradores, conferencistas” que faziam parte da composição do cenário letrado piauiense.
1880 sinalizava que o Piauí possuía um circuito de informações culturais em atividade, tomando como base os 54 jornais levantados pela pesquisadora. Apesar desses periódicos serem de pequeno porte e curta duração é possível afirmar que, “enquanto os estudantes fermentavam ideias e projetos em Recife”, jovens do ensino secundário registraram os eventos e experiências artísticas da capital.
Isso pode ser entendido como “parcialmente tributária do retorno de bacharéis de várias formações à cidade, com ideias modernizadoras”[124], bem como a vontade de fomentar novos debates sobre a prática cultural no Estado.
Antes, os materiais impressos eram realizados diretamente nos jornais ou nas gráficas fora do Estado (São Luís, Recife ou Rio de Janeiro), mas em 1906, Teresina passou a concentrar a produção de livros e jornais[125], abrindo espaço para os escritores locais lançarem seus trabalhos, bem como publicar livros técnicos e periódicos na cidade[126], apesar de todas as dificuldades financeiras e editoriais para realizar o sonho de ter suas obras materializadas, devido às:
[…] precariedades do meio no sentido de possibilitar a edição de um número maior de obras. […] No Piauí é grande o número de obras destruídas, de livros que não foram concluídos, de projetos de editoração malogrados face às dificuldades materiais de seus autores, enfim, há toda uma história da literatura virtual que, por uma série de razões, não chegou a se consubstanciar como produto acabado.[127]
A partir das fontes disponíveis para a análise, Teresinha observou que 1912 pode ser considerado um momento relevante na participação de vários literatos na produção cultural, abrangendo as gerações mapeadas entre 1850 a 1890, de Clodoaldo Freitas à Edison Cunha, com textos dedicados a explorar desde temáticas panteístas ao materialismo científico positivista.
Ela percebeu que a produção literária desse período:
[…] sugere novo corte que corresponde aos literatos nascidos neste século e que, em 1912, compõe o universo dos liceístas e secundaristas que atuam em torno dos literatos de maior expressão, e vão projetar-se sobretudo na década de 20 e nas seguintes[128].
O acervo levantado irá identificar uma geração marcada pelo interesse na problemática envolvendo leituras que investigavam a “origem e finalidade do mundo”, ao mesmo tempo em que se vivenciava um ambiente carregado de posturas céticas e pessimistas, resultante da “compreensão da improficuidade da ação individual como propulsora das grandes mudanças”, com destaque para a situação política do país.
Havia, da parte dos literatos, interesse pelo debate da conjuntura republicana, mas esse tema “convivia com o entendimento de que a política era o espaço do político e ser político então não era uma condição muito respeitável […] como o domínio dos baixos interesses, do servilismo, da chaleirice e do popular puxa-saquismo”[129], nos levando a compreender que estes:
[…] poetas se sentiam como filhos bastardos e despossuídos, [deslocados socialmente de um tempo rachado entre os valores antigos e contemporâneos] renegados não só em relação à política, como igualmente privados do prestígio social que lhes deveria ser atribuído. Essa geração está em geral ausente da política e contra ela, embora, com o tempo, alguns deles tenham sido absorvidos, embora de forma parcial, pela política partidária[130].
É o que podemos confirmar, com a participação de Higino e Clodoaldo no Partido Liberal[131], apesar deles não terem se desvinculado do partido monárquico, o que tornou essa ambiguidade um elemento que contribuiu “para o fato de não terem lutado de forma mais direta pela República, embora sejam unânimes em afirmar o credo republicano”[132]:
Do ponto de vista apenas das fontes piauienses e da ligação de Clodoaldo Freitas com os grupos estaduais do poder, desde a República até sua morte em 1924, é possível afirmar que ele e Higino Cunha estão sempre em arenas distintas, ou seja, Higino inscreve-se, grosso modo, no bloco situacionista, enquanto Clodoaldo acopla-se às dissidências oligárquicas, quase sempre fazendo oposição aos governos estaduais[133].
É nesse lugar que a atuação política de Clodoaldo se apresentou numa perspectiva de desencanto com o sistema republicano e o desejo da republicanização – chamada por ele de “tirania turca” – e sua principal crítica voltava-se para a “negação da cidadania, que o autor considerava como sendo a própria negação da República […], enfim, da ausência do povo no processo decisório nacional”[134].
Ele denunciava a falta de interesse das oligarquias regidas pelo coronelismo em colocar em prática os princípios da igualdade, liberdade e manter a República um lugar de analfabetos, reféns das fraudes eleitorais.
Clodoaldo acreditava na ideia de que um país que respira o verdadeiro espírito republicano deveria investir no povo como amante das instituições “sob os princípios republicanos e verdadeiramente democráticos”[135], fortalecidos no uso dos seus direitos e atentos a responsabilidades dos deveres.
Apenas com a “participação popular através do voto livre”[136] seria viável conduzir uma ação política justa à sociedade:
[…] restavam ao povo duas opções: submeter-se ou revoltar-se[137]. E, evidentemente, o seu projeto de republicanização e os seus ensinamentos não apontava nunca no sentido da submissão; muitas vezes eram registros de decepções ou de esperanças e quase sempre eram lições de revolta[138].
Em relação ao consumo da literatura pelos intelectuais em questão, a pesquisa identificou que as leituras realizadas na época pelas gerações materialista-cientificista/panteísta concentravam-se no Romantismo – na apreciação de temas envolvendo o “lirismo sentimental, amoroso, platônico e também sensual”[139].
As obras lidas trafegavam entre autores que iam de Victor Hugo à Álvares de Azevedo. O Simbolismo foi influência presente na poesia piauiense, via Cruz e Sousa até Olavo Bilac e Alberto de Oliveira, bem como o interesse pela literatura europeia, conforme Teresinha observou ao estudar os acervos encontrados:
Da mesma maneira que é observável, nas gerações materialistas-cientificistas, o encontro de duas tendências aparentemente excludentes, o Romantismo nos seus diferentes traços estéticos e vivenciais e o Realismo que se transmuta nas grandes linhas do materialismo e do cientificismo, nas gerações panteístas convivem a tendência radical-pessimista-cética com a euforia da grandeza nacional e o ilusionismo progressista verde-amarelo[140].
Teresinha segue identificando na documentação uma série ampla de referências fundamentais na formação intelectual dos literatos em estudo. Na sondagem de outros nomes que serviram de campo de diálogo para os escritores piauienses, ela descobre que os literatos tinham interesse pelos estudos greco-romanos, renascentistas, iluministas, bem como juristas, prosadores políticos brasileiros.
A pesquisa vai além, destacando que:
A […] leitura de autores brasileiros pelos literatos piauienses apontam para a repetição dos mesmos autores e para a limitação de seu número, e ainda para a característica de terem sido lidos os autores que viraram clássicos da literatura brasileira em suas respectivas escolas. Aliás, esse é um traço de permanência na história literária local, pois os estudos e os interesses ainda se concentram no Romantismo-Naturalismo-Simbolismo. O universo literário modernista está em boa parte circunscrito aos cursos de Letras. É provável que essa situação reflita a mudança de eixo (do norte para o sul) das influências literárias, sendo o Modernismo sobretudo um movimento paulista, e o Romantismo, o Naturalismo, em grande expansão, movimentos ligados às letras do norte-nordeste[141].
Mesmo assim, a ponte que estabelecia o contato dos leitores com esse conjunto de produções literárias nacionais era o Rio de Janeiro, “locus da construção e da difusão da tão almejada fama nacional, […] do reconhecimento literário”[142]. O estado era um o polo cultural brasileiro que irradiava as novidades que circulavam no mercado editorial, possibilitando o acesso às leituras de autores com “publicidade reforçada pelo fato de muitos escritores serem cronistas na imprensa carioca”.
O Piauí mergulhava nas profundezas do analfabetismo, corroendo 95% da população[143] distante dos livros e do acesso ao conhecimento básico, mobilizando parte dos intelectuais a debater sobre o avanço da alfabetização[144] no estado, sem repercussão efetiva e gerando um obstáculo para o sucesso de um cenário cultural no âmbito das letras.
O que importava para os moradores de Teresina era a busca pela própria sobrevivência e nas polêmicas políticas que surgiam no “boca a boca”. Então, a tese aponta para o distanciamento entre as obras literárias, seus escritores e o público, resultante:
[…] da falência da República enquanto sistema propiciador da condição mínima de cidadania. […] Por fim, o descontentamento dos literatos em geral era agravado pelas próprias características da sociedade republicana, no que se refere ao universo das letras: livros sem leitores, escritores sem público, conferencistas sem ouvintes, oradores sem aplausos, penas imponentes, é esse universo dos intelectuais em relação a si próprios[145].
Organizados para compartilhar seus trabalhos artísticos entre si, os eventos focados na divulgação das publicações, conferências ou de qualquer vínculo com a produção cultural da cidade era o ponto de encontro que envolviam os intelectuais piauienses, como forma de ampliar os espaços de sociabilidade, bem como destacar o prestígio social desses grupos com o restante da população.
Mesmo com toda pompa que essas “festividades letradas” pudessem aparentar, os intelectuais eram conscientes de que “o sucesso, a fama, os mecanismos de projeção pessoal, são vistos como fora da alçada”[146], a não ser que houvesse alguma chance de visibilidade no Rio de Janeiro a partir da circulação da obras nas mãos dos críticos que estivessem “na moda”[147] para fazer uma propaganda positiva do material produzido.
No Piauí, fazer sucesso no universo literário era inviável e essa constatação provocou mal-estar entre os escritores, por saberem que seu esforço era não era percebido pelos poucos leitores existentes, levando Higino Cunha a “queixar-se do indiferentismo total da sociedade em relação aos assuntos de Arte”[148]. Será que Olavo Bilac realmente jogou no mar[149] o livro Sangue, de Da Costa e Silva? A crise de reconhecimento vivenciada pelos literatos há tantos anos atrás não estaria reverberando na situação artística piauiense nos nossos dias que seguem?
Fiz este percurso panorâmico das leituras realizadas pela professora – dos estudos econômicos aos “Literatos e a República” com a finalidade de apresentar aspectos fundamentais do seu universo documental e erudito para quem tiver interesse em conhecer seu trabalho em profundidade. Acredito que este texto ajuda a traçar um caminho para que seja possível desbravar sua obra historiográfica.
[1] QUEIROZ, Teresinha.; BRANCO, Pedro Vilarinho Castelo (Org.). Páginas impressas: história, imprensa e política no Brasil. 1. ed. São Paulo: Mentes Abertas, 2020. v. 1. 519p.
[2] RÊGO, Ana Regina (Org.); QUEIROZ, Teresinha. (Org.); HOHLFELDT, Antônio. (Org.). Tempo & memória: interfaces entre os campos da comunicação e da história. 1. ed. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2020. v. 1. 517p.
[3] BELLO, Luis (Org.); QUEIROZ, Teresinha. (Org.); SOARES, Denise Raquel Barbosa (Org.). Da Serra da Ibiapaba ao Campus da Ininga: 373 anos de Pedagogia no Piauí. 1. ed. Teresina: EDUFPI, 2021. v. 1. 452p.
[4] FREITAS, Clodoaldo (Org.); QUEIROZ, Teresinha. (Org.); FERREIRA, Ronyere (Org.). História de Teresina. 2. ed. São Paulo: Mentes Abertas, 2020. v. 1. 480p.
[5]PINHEIRO, Luma Dias; Queiroz, Teresinha de Jesus Mesquita. Nísia Floresta e a escrita feminina no século XIX. In: Patricia Vasconcelos Almeida; Mauriceia Silva de Paula Vieira. (Org.). Por Palavras e Gestos: a Arte da Linguagem Vol. IV. 1ed.Curitiba: Editora Artemis, 2021, p. 253-263. | SILVA, Ronyere Ferreira da; QUEIROZ, Teresinha. Um literato feminista: Jonatas Batista e as ampliações das responsabilidades femininas em Teresina (1906-1927). HISTÓRIA, HISTÓRIAS, v. 3, p. 99-115, 2015.
[6] QUEIROZ, Teresinha; DIAS, Luma Pinheiro. Caridosa, altruísta, obediente e modesta: as instruções de Nísia Floresta para a educação das meninas no Brasil oitocentista. Humana Res, v. 5, p. 157-171, 2023.
[7] DIAS, Luma Pinheiro; Queiroz, Teresinha de Jesus Mesquita. Mary Wollstonecraft, Nísia Floresta, Sophia e a escrita em defesa dos direitos das mulheres. CONTRAPONTO, v. 11, p. 44-63, 2022.
[8] ARAÚJO, Thaíse de Sousa; QUEIROZ, Teresinha. As manifestações dos piauienses à Proclamação da República no Brasil (1889-1890). Ponta de Lança (UFS), v. 14, p. 74-92, 2020. | PIMENTEL, Franciadna Eufrazina; QUEIROZ, Teresinha de Jesus Mesquita. Teresina, uma capital republicana: as mudanças ocorridas na capital do Piauí com a chegada do século XX. Revista Humana Res, v. 1, p. 254-263, 2019. | QUEIROZ, Teresinha de Jesus Mesquita. A construção de uma (im)possível República: entre o nascer, o sobreviver e o (des)agradar. In: Andreia Rodrigues de Andrade; Fabiano Eloy Atílio Batista; João Antônio de Sousa Lira; Caroline Rodrigues de Freitas Fernandes. (Org.). História, Cultura e Sociedade Brasileira: diálogos interdisciplinares. 1ed. Natal (RN): Amplamente Cursos e Formação Continuada, 2021, p. 33-48, entre outros.
[9] SOUSA, Natália Ferreira de; QUEIROZ, Teresinha de Jesus Mesquita. Polêmicas na cidade das letras: O. G. Rego de Carvalho e as disputas literárias em Teresina. In: Andreia Rodrigues de Andrade; Fabiano Eloy Atílio Batista; João Antônio de Sousa Lira; Caroline Rodrigues de Freitas Fernandes. (Org.). História, Cultura e Sociedade Brasileira: diálogos interdisciplinares. 1ed. Natal (RN): Amplamente Cursos e Formação Continuada, 2021, p. 341-357 | QUEIROZ, Teresinha; FERREIRA, Ronyere. Literatos, política e atuação profissional em Teresina no início do século XX. Intellèctus (UERJ. Online), v. 16, p. 190-207, 2017. | QUEIROZ, Teresinha. Formação do sistema literário piauiense. Revista Desenredos, v. IX, p. 47-54, 2017. | FERREIRA, Ronyere; QUEIROZ, Teresinha. Literatura e ressentimentos: os homens de letras e suas escritas. In: Márcio Douglas de Carvalho e Silva; Ronyere Ferreira; Fransuel Lima de Barros. (Org.). História, Literatura e Imprensa: meios e modos de pensar o passado. 1ed. Teresina: Cancioneiro, 2020, v. 1, p. 139-158, entre outros.
[10]FERREIRA, Ronyere; QUEIROZ, Teresinha. Na intenção manifesta de desrespeito à polícia e à sociedade?: teatro e censura nas primeiras décadas do século XX. In: Kátia Rodrigues Paranhos; Ronyere Ferreira da Silva; Francisco de Assis de Sousa Nascimento. (Org.). Teatro & censura: intersecções entre arte e política no Ocidente. 1ed.Teresina: Cancioneiro, 2022, p. 45-76.
[11] QUEIROZ, Teresinha. Estado, sociedade, políticas públicas e sistema escolar no município de Teresina. In: FONTINELES, Claudia Cristina da Silva; FERREIRA, Ronyere; NEPOMUCENO, Talyta Marjorie Lira Sousa. (Org.). História, cultura e poder. 1ed.Teresina: Cancioneiro, 2021, p. 273-288.
[12] SOUSA, Natália Ferreira de; QUEIROZ, Teresinha. De Oeiras a Teresina: as cidades de O. G. Rêgo de Carvalho. In: Carlos Alberto de Melo Silva Mota; Fábio Leonardo Castelo Branco Brito. (Org.). Retalhos históricos: espaços, corpos e culturas. 1ed.Teresina: Cancioneiro, 2021, p. 191-208. | QUEIROZ, Teresinha. Entre encantos e desafios: pensar a cidade, viver nas cidades. In: FONTINELES, Cláudia Cristina da Silva; SOUSA NETO, Marcelo de; FONTINELES FILHO, Pedro Pio. (Org.). Maneiras de ver a cidade de Teresina. 1ed.Teresina: EdUESPI, 2021, p. 17-27.
[13] CARVALHO, Flávio Fernandes; QUEIROZ, Teresinha. As várias memórias de Lívio Lopes Castelo Branco: política e ressentimentos inscritos na imprensa oitocentista. Revista Eletrônica Humana Res, v. 1, p. 52-72, 2021. | QUEIROZ, Teresinha. Discurso de recepção ao acadêmico Felipe Mendes de Oliveira como segundo ocupante da cadeira n. 32 da Academia Piauiense de Letras. Revista das Academia Piauiense de Letras, v. 1, p. 19-30, 2020. | QUEIROZ, Teresinha de Jesus Mesquita. Ressentimentos políticos e lutas de memória em A Balaiada, de Clodoaldo Freitas. In: Elizabeth Sousa Abrantes; Josenildo de Jesus Pereira; Yuri Givago Alhadef Sampaio Mateus. (Org.). Histórias e memórias da Balaiada. 1ed.São Luís: Editora UEMA, 2022, v. 1, p. 217-248. | FREITAS, Clodoaldo; QUEIROZ, Teresinha.; FERREIRA, Ronyere. Clodoaldo Freitas, senhor da palavra. In: Clodoaldo Freitas, Teresinha Queiroz, Ronyere Ferreira. (Org.). História de Teresina. 2ed. São Paulo: Mentes Abertas, 2020, p. 421-479, entre outros.
[14] Textos sugeridos para aprofundar a leitura: “Historiografia da Independência no Piauí”, publicado no Informe Econômico, em novembro de 2010 e “A história da independência no Piauí: das escritas instituintes aos revisionismos, das versões modernas às celebrações”, publicada na Humana Res, v. 1, nº 5, 2022. | QUEIROZ, Teresinha. A Historiografia da Independência no Piauí. REVISTA PRESENÇA, v. 1, p. 15-18, 2013.
[15] QUEIROZ, Teresinha. Historiografia Piauiense. In: Do Singular ao Plural. Recife: Edições Bagaço, 2006, p. 142-144.
[16] Para saber mais sobre a importância da sua contribuição intelectual, sugerimos a leitura: QUEIROZ, Teresinha. As escritas de R. N. Monteiro de Santana. In: Informe Econômico. Ano 10 – Nº 20, Julho/Agosto de 2009.
[17] QUEIROZ, Teresinha. Cadernos Históricos. In: Do Singular ao Plural. Recife: Edições Bagaço, 2006, p. 18.
[18] Historiografia Piauiense. In: QUEIROZ, 2006, p. 150.
[19] QUEIROZ, Teresinha. Teresina: subsídios para a História do Piauí. In: Do Singular ao Plural. Recife: Edições Bagaço, 2006, p. 26.
[20] QUEIROZ, Teresinha. Obra completa de Monsenhor Chaves. In: Do Singular ao Plural. Recife: Edições Bagaço, 2006, p. 111.
[21] Idem, p. 113.
[22] Historiografia Piauiense. In: QUEIROZ, 2006, p. 157.
[23] Historiografia Piauiense. In: QUEIROZ, 2006, p. 158-159.
[24] QUEIROZ, Teresinha. A Cultura Brasileira no limiar do século XXI. In: Do Singular ao Plural. Recife: Edições Bagaço, 2006, p. 127.
[25] Idem, p. 127.
[26] Idem, p. 127.
[27] Idem, p 136.
[28] QUEIROZ, Teresinha. A importância da borracha da maniçoba na economia do Piauí: 1900-1920. 3 ed. Teresina: EDUFPI, 1984/2015, p. 07.
[29] QUEIROZ, 1984/2015, p. 19, 20.
[30] QUEIROZ, 1984/2015, p. 20.
[31] QUEIROZ, 1984/2015, pp. 14-15.
[32] QUEIROZ, 1984/2015, p. 21.
[33] QUEIROZ, 1984/2015, p. 21
[34] QUEIROZ, 1984/2015, p. 28
[35] QUEIROZ, 1984/2015, p. 28.
[36] Organização em parceria com R. N. Monteiro de Santana e Francisco de Assis Veloso Filho.
[37] Alguns trabalhos: Monografia: “A Cidade Verde no milagre econômico: transformações no espaço sócio-urbano de Teresina (1971-1979)”, de Diego Silva Lima (2013). Bancas e qualificações de Mestrado: “Catingueiros da borracha: vida de maniçobeiro no Sudeste do Piauí (1900-1960)”, de Ana Stela Negreiros de Oliveira (2001), “A Construção da Usina de Boa Esperança: Impactos da Modernização do Capitalismo Nacional”, de Marconis Fernandes Lima (2006), “Políticas econômicas e incentivos locacionais para a indústria no Estado do Piauí: uma abordagem geográfica”, de Diana dos Reis Pereira Carvalho (2013), “Degredados da seca: políticas intervencionistas em Teresina (1877-1879)”, de Kércia Andressa Vitoriano Gonçalves (2021), “Investimentos em infraestrutura econômica e impactos sobre a economia piauiense”, de Fábio Alves Camelo (2013) Doutorado: “Comerciários e bancários: experiências coletivas no novo sindicalismo”, de Maria do Rosário de Fátima e Silva (2000), “Dos sertões aos mares: História do comércio e dos comerciantes de Parnaíba (1700-1950)”, de Junia Motta Antonaccio Napoleão do Rego (2010).
[38] QUEIROZ, Teresinha. Experiência de pesquisa: entrevista. Do singular ao Plural. Recife: Edições Bagaço, 2006, p. 215.
[39] QUEIROZ, 2006, p. 216.
[40] QUEIROZ, 2006, pp. 216-217.
[41] QUEIROZ, 2006, p. 217.
[42] QUEIROZ, 2006, p. 218.
[43] QUEIROZ, 2006, p. 218.
[44] QUEIROZ, 2006, p. 219.
[45] QUEIROZ, Teresinha de Jesus Mesquita. História e Literatura. In: Do singular ao Plural. Recife: Edições Bagaço, 2006.
[46] QUEIROZ, 2006, p. 81.
[47] QUEIROZ, 2006, p. 81.
[48] QUEIROZ, 2006, p. 82.
[49] QUEIROZ, 2006, p. 82.
[50] QUEIROZ, 2006, p. 82.
[51] QUEIROZ, 2006, p. 85.
[52] QUEIROZ, 2006, p. 220.
[53] QUEIROZ, 2006, p. 221.
[54] Alguns livros organizados pela pesquisadora sobre Clodoaldo Freitas e Higino Cunha: 1. QUEIROZ, Teresinha de Jesus Mesquita. Notáveis e obscuros: Higino Cunha e sua obra. Teresina: APeCH/UFPI, 1995. | 2. QUEIROZ, Teresinha; FERREIRA, Ronyere (Orgs.). História de Teresina, FREITAS, Clodoaldo. 2ª ed. São Paulo: Mentes Abertas, v.1, 2020. | 3. FREITAS, Clodoaldo (Org.). Os fatores do Coelhado: escorço de História. 2. ed. Teresina: Academia Piauiense de Letras, v.1, 2019. | 4. FREITAS, Clodoaldo (Org.). A Balaiada. 1ª. ed. Teresina: Academia Piauiense de Letras, 2019. | 5. FREITAS, Clodoaldo (Org.). Vultos Piauienses: apontamentos biográficos. 4ª. ed. Teresina; São Paulo: EDUFPI; Lawbook, 2014. | 6. FREITAS, Clodoaldo (Org.). Em roda dos fatos. FREITAS, 1ª. ed. Teresina: Senado Federal; Academia Piauiense de Letras, v.1, 2012. | 7. CUNHA, Higino (Org.). Memórias: traços autobiográficos. 2ª. ed. Brasília; Teresina: Senado Federal; Academia Piauiense de Letras, 2011. | 8. FREITAS, Clodoaldo (Org.). Biografia e crítica. 1ª. ed. Imperatriz: Ética, v.1 2010. | 9. FREITAS, Clodoaldo (Org.). Os Burgos e outros contos. 1ª. ed. Imperatriz: Ética, v.1, 2010. | 10. FREITAS, Clodoaldo (Org.). O Palácio das Lágrimas. 2ª. ed. Imperatriz: Ética, v.1, 2010. | 11. FREITAS, Clodoaldo (Org.). Por um sorriso. 1ª. ed. Imperatriz, MA: Ética, 2009. | 12. FREITAS, Clodoaldo (Org.). Coisas da vida. 1ª. ed. Imperatriz, MA: Ética, 2009. | 13. FREITAS, Clodoaldo (Org.) Os Bandoleiros. 1ª. ed. Imperatriz, MA: Ética, 2009. | 14. FREITAS, Clodoaldo (Org.). O Bequimão. 2ª. ed. Imperatriz, MA: Ética, 2009. | 15. FREITAS, Clodoaldo (Org.). Um segredo de família e outros contos. 1ª. ed. Imperatriz: Ética, V.1 2009. | 16. FREITAS, Clodoaldo (Org.). O Palácio das Lágrimas. 1. ed. MA: AML/Editora da Universidade Estadual do Maranhão, 2008.
[55] Ao longo do capítulo, utilizamos artigos que a professora trabalhou dentro do mesmo recorte temporal para reforçar a leitura sobre o tema.
[56] QUEIROZ, Teresinha. Literatos e República: Clodoaldo Freitas, Higino Cunha e as tiranias do tempo. 3 ed. Teresina: EDUFPI, 2011, p. 218.
[57] Na República, a representação política engloba elenco maior de segmentos sociais – anteriormente sem grande visibilidade em parte por conta do monopólio dos letrados – e a cara do Brasil se expõe com mais nitidez. O jogo político torna-se cada vez mais complexo. A política atrai novos componentes que se originam do meio urbano como do rural, órbitas cujas tensões se acentuam marcadamente e que representam segmentação social cada vez mais diferenciada em seus interesses e em suas pretensões. QUEIROZ, Teresinha. Direito e Identidades. In: História, Literatura e Sociabilidades. EDUFPI; Academia Piauiense de Letras, 2015, p. 205. Sugerimos como leitura complementar: ARAÚJO, Thaise de Sousa; QUEIROZ, Teresinha. As manifestações dos piauienses à proclamação da República no Brasil (1889-1890). In: Ponta de Lança: Revista Eletrônica de História, Memória e Cultura. São Cristóvão. V.14, nº 17, jul-dez. 2020.
[58] QUEIROZ, 2011, p. 13.
[59] QUEIROZ, Teresinha. Literatura e Sociedade. In: História, Literatura e Sociabilidades. EDUFPI; Academia Piauiense de Letras, 2015, p. 114.
[60] Até o final do século XIX, a base da economia piauiense era a pecuária […]. As décadas a partir de 1880 são significativas para o processo de mudança no Piauí, no sentido de sua integração regional e é quando aparecem os primeiros elementos de modernização – representados pela navegação a vapor e o telégrafo. A mudança da capital de Oeiras para Teresina e o incremento da navegação a vapor eram condições tidas como fundamentais pelos homens públicos para o desenvolvimento da Província e para a independência do seu comércio em relação ao Maranhão. Essas medidas deveriam ser complementadas com a abertura de estradas de rodagem ligando as regiões produtoras aos portos fluviais. Esse projeto, lentamente elaborado ao longo de várias décadas, só veio a afirmar-se no início do século XX, com as alterações conjunturais advindas do extrativismo […]. A navegação fluvial, cujo desenvolvimento viera do século anterior, fora impulsionada pelas necessidades do comércio de exportação […]. Realiza-se não só a venda direta da borracha e outros produtos, mas igualmente a recepção, sem intermediários, de artigos europeus para o consumo da população do Estado […]. Em que pese o aspecto acanhado e o crescimento não intempestivo, buscavam-se aprofundar as ligações com o universo regional como forma de superar as limitações do meio. As inúmeras tentativas de construção de estradas de ferro no Estado fazem parte desse elenco de medidas, em geral malogradas […]. A euforia econômica que se traduziu em tantos projetos fundamenta-se na inserção, mesmo que precária, do Estado às linhas do comércio internacional, via maniçoba e outros produtos. A pressão do comércio exportador criou novas necessidades de infraestrutura, inclusive para a gestão financeira dos negócios […]. (…) igualmente se tentavam criar condições que favorecessem a modernização da cidade, o disciplinamento do seu espaço e, por extensão, o controle sobre seus cidadãos. QUEIROZ, 2011, pp. 19, 20, 21, 23, 26, 27. Sugestão de leitura complementar: QUEIROZ, Teresinha. Teresina: história e imaginário. In: Do Singular ao Plural. Recife: Edições Bagaço, 2006.
[61] QUEIROZ, 2011, p. 32.
[62] Na primeira década do século XX, Teresina não dispunha de qualquer equipamento urbano que a definisse como uma cidade moderna. Ausência total e absoluta de calçamento, água tratada e canalizada, transporte público, luz elétrica, esgoto, telefone, etc. […] o crescimento da cidade era lento. Em 1913, Iglésias estimava a existência de 500 casas de alvenaria em Teresina e cerca de mil de pau a pique ou palha. […] centenas de animais carregados de ancoretas, abastecendo as casas, em suas idas e vindas. Calculava-se, por baixo, segundo o redator, a existência de 100 animais de carga circulando pela cidade e realizando, em média, 10 a 15 viagens por dia. […] o serviço de iluminação sempre for precário. […] Além dos serviços de água, da iluminação elétrica e dos telefones, outros melhoramentos requeria a cidade no seu projeto modernizador. Algumas dessas solicitações estavam ligadas as condições de higiene e salubridade, portanto à vida diária – como o serviço de rampas e taludes do rio Parnaíba, que preveniriam as enchentes anuais; a coleta de lixo urbano; a proibição de circulação de animais no centro da cidade, como porcos, cachorros, galináceos e vacas; as demandas por calçamento de ruas, etc. QUEIROZ, 2011, pp. 29-30-31
[63] QUEIROZ, 2011, p. 33.
[64] QUEIROZ, 2011, p. 33.
[65] QUEIROZ, Teresinha. Teresina, História e Imaginário. In: Do Singular ao Plural. Edições Bagaço, 2006, p. 174.
[66] QUEIROZ, 2011, p. 37.
[67] QUEIROZ, Teresinha. Notas sobre a modernização de Teresina. In: História, Literatura e Sociabilidades. EDUFPI; Academia Piauiense de Letras, 2015, p. 19.
[68] QUEIROZ, 2011, pp. 35-36
[69] QUEIROZ, Teresinha. Jônatas Batista e a Paixão pelo Teatro. In: Do Singular ao Plural. Recife: Edições Bagaço, 2006, p. 95.
[70] Idem, p. 74.
[71] QUEIROZ, Teresinha. Retrato do cinema quando jovem. In: História, Literatura e Sociabilidades. Teresina: EDUFPI – Academia Piauiense de Letras, 2015, p. 208.
[72] O público cinematográfico compõe-se de maneira indistinta, de crianças, adultos, jovens, empregadas domésticas, caixeiros-viajantes, comerciários, profissionais liberais, meninos de recado, amas de leite, enfim, todas as categorias sociais frequentam as exibições cinematográficas. E boa medida, isso se devia ao fato de o cinema ser uma diversão com poucas exigências quanto ao vestuário e também à existência de entradas com preços diferenciados, de acordo com o lugar ocupado no teatro. A referência ao teatro é necessária porque nesse momento o cinema ainda não tinha local próprio de exibição; até 1919, todos os cinemas que se estabeleceram em Teresina funcionaram no Theatro 4 de Setembro, única casa de espetáculos da cidade. QUEIROZ, Teresinha de Jesus Mesquita. Cinema, invenção do diabo? História, Literatura e Sociabilidades. Teresina: EDUFPI – Academia Piauiense de Letras, 2015, p. 47.
[73] QUEIROZ, 2015, p. 58.
[74] QUEIROZ, 2015, p. 55.
[75] QUEIROZ, 2015, p. 57.
[76] QUEIROZ, 2011, p. 55.
[77] QUEIROZ, 2011, p. 58.
[78] QUEIROZ, 2011, p. 63.
[79] Do ponto de vista da educação, a República só acentuou tendências vindas da segunda metade do século XIX, particularmente das décadas de 1870 e 1880. A velha ideia de que do ensino popular viria a salvação do país, perspectiva muito cara aos reformadores do final do Império, assumirá forma mais complexa no período e vai orientar, por várias décadas, tanto a instalação de escolas noturnas para adultos pobres, como a legislação sobre a obrigatoriedade do ensino. QUEIROZ, 2011, p. 63.
[80] QUEIROZ, Teresinha. Educação no Piauí: 1880-1930. 2ª ed. Teresina: Academia Piauiense de Letras, 2017, p. 08.
[81] QUEIROZ, 2017, p. 11.
[82] QUEIROZ, 2011, p. 74.
[83] QUEIROZ, 2011, p. 79.
[84] QUEIROZ, 2011, p. 77.
[85] Algumas indicações levam a crer que, ao contrário de Higino Cunha, Clodoaldo Freitas não se distinguia pelo brilho como aluno, sendo muito mais um estudante do tipo indisciplinado e rebelde. Ele próprio, em passagem autobiográfica, diz que seu professor de Inglês no Liceu do Maranhão o tratava por doutor por puro escárnio, face às suas dificuldades com o idioma e o tinha na conta de burríssimo. É possível que Clodoaldo, cujos interesses estavam ligados a conteúdos extra-curriculares, achasse maçante o ensino do seu tempo. QUEIROZ, 2011, pp. 84-85.
[86] (…) teceu críticas muito contundentes ao ensino no Seminário das Mercês, onde fazia parte de um grupo de rebeldes protestantes e não parece ter tido muito entusiasmo pelo curso de Direito, que frequentou com aproveitamento, mas quase totalmente voltado para estudo da Poesia, da Filosofia, da Literatura e da História, bem ao gosto dos republicanos do Recife. QUEIROZ, 2011, p. 85.
[87] QUEIROZ, 2011, p. 125.
[88] QUEIROZ, 2011, p. 126.
[89] QUEIROZ, 2011, p. 126.
[90] QUEIROZ, 2011, p. 80.
[91] A ineficiência da educação pública, observada quanto ao ensino primário, caracterizava também o ensino secundário, e em Teresina, o número de matrículas era mais expressivo nas escolas particulares que no Liceu. Essas observações reforçam a proposição de Odilon Nunes de que no Piauí o ensino particular teria sido mais eficaz que o ensino público ao longo do século XIX. QUEIROZ, 2011, pp. 82-83.
[92] Para saber sobre a importância da escrita de Higino Cunha na construção do conhecimento histórico, leia os artigos “Notas sobre a obra de Higino Cunha” na coletânea “História, Literatura e Sociabilidades”. EDUFPI; Academia Piauiense de Letras, 2015, p. 63 | Sobre Política, Ciência e Arte: Higino Cunha e as controvérsias de seu tempo. Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH • São Paulo, julho 2011.
[93] QUEIROZ, 2011, p. 77.
[94] QUEIROZ, 2011, p. 91.
[95] QUEIROZ, 2011, p. 91.
[96] QUEIROZ, 2011, p. 92.
[97] A procura mais acentuada por cursos superiores no final do Império não se limitava à área jurídica. Formavam-se também contingentes de farmacêuticos, médicos, engenheiros-militares. QUEIROZ, 2011, p. 105.
[98] Para aprofundar a leitura sobre o pensamento e obra de Clodoaldo Freitas, sugerimos a leitura de “Clodoaldo Freitas e o imaginário político do século XIX” na coletânea “História, Literatura e Sociabilidades”. EDUFPI; Academia Piauiense de Letras, 2015, p. 153.
[99] QUEIROZ, 2011, p. 95.
[100] QUEIROZ, Teresinha. Polêmicas Anticlericais. In: História, Literatura e Sociabilidades. EDUFPI; Academia Piauiense de Letras, 2015, p. 76.
[101] QUEIROZ, Teresinha. Maçonaria e Sociedade. In: História, Literatura e Sociabilidades. EDUFPI; Academia Piauiense de Letras, 2015, p. 135. Sugestão de leitura complementar: O Ideário maçônico e as utopias da modernidade. In: Informe Econômico. Ano 13, nº 27, abril de 2012.
[102] A geração de Higino Cunha e Clodoaldo Freitas […] pretendeu que estivessem mortos ou, no mínimo agonizantes, a metafísica, o idealismo, a poesia subjetiva e a religião, cuja história seria um cemitério de deuses. A maior parte de seus textos de temática religiosa o são, em primeiro lugar, textos combatentes e intervenientes. QUEIROZ, 2011, p. 219.
[103] DINIZ, Eduardo Albuquerque Rodrigues; QUEIROZ, Teresinha. A atuação dos egressos da Escola do Recife no Piauí no final do século XIX e início do século XX. In: ANPUH Brasil. 31º Simpósio Nacional de História. Rio de Janeiro, 2021.
[104] QUEIROZ, 2011, p. 221.
[105] […] a atuação do bispado se estendeu também ao apostolado, à fundação de um jornal católico – O Apóstolo que, dentro dos objetivos da Igreja, deveria dar combate à imprensa ímpia – e ao incentivo aos cultos do Sagrado Coração de Jesus e de Maria. A luta contra à maçonaria (1902-1914) significou o máximo de esforço do catolicismo ultramontano no sentido de liquidar seus opositores – representados principalmente por políticos e literatos, maçons e anticlericais dos mais diferenciados matizes: ateus, agnósticos, panteístas, livres-pensadores, etc. QUEIROZ, 2011, p. 259.
[106] QUEIROZ, 2011, p. 219.
[107] Textos da revista Litericultura, cujo ponto em comum com os textos dos demais autores piauienses é o fato de fundamentarem-se na exegese da bíblia. Nesse período, a crítica ao nível institucional alia-se a abordagem científica a abordagem científica dos episódios bíblicos, cuja interpretação constituía dogma e verdade propagados pelo catolicismo. QUEIROZ, 2011, p. 230.
[108] Os textos maçônicos estão basicamente na imprensa maçônica, conferências publicadas sob forma de folhetos ou nos periódicos, e nos boletins avulsos explicando as situações ou combatendo pessoas em particular. QUEIROZ, 2011, p. 228.
[109] QUEIROZ, 2011, p. 227.
[110] QUEIROZ, 2011, p. 96.
[111] Ao voltar de Recife, no final de 1885, pretendeu ocupar o lugar do Promotor Público de Mirador (Maranhão), sem êxito, pelo fato de pertencer a família de vinculação liberal. A convite de João da Cruz e Santos, futuro Barão de Uruçuí, entrou em dezembro de 1885 para a redação d’A Imprensa, substituindo Clodoaldo Freitas, que se retirava para Amarante, como advogado do Partido Liberal. Ocupa a redação do jornal liberal até junho de 1887, quando, casado, vai assumir o lugar de Juiz Municipal da Comarca de Picos (hoje Colinas), no Maranhão, posição que ocupou até a proclamação da República. De volta ao Piauí. Foi nomeado Juiz Municipal de Amarante […] em março de 1890. Voltou […] a Teresina, para assumir o exercício do cargo de Procurador Seccional da República […]. Foi nomeado Juiz de Direito da Comarca de União […]. Em julho de 1895, vamos encontra-lo sendo chefe de polícia de Coroliano de Carvalho e Silva. […] segue para Manaus […] e vai fazer parte da redação do jornal situacionista A Federação, mas logo passa para a oposição e ingressa como redator no Jornal Estado do Amazonas. Em 1896 já está de volta a Teresina. A partir de 1900, […] foi nomeado […] Procurador dos Feitos da Fazenda Estadual e professor do Liceu Piauiense, atividades em que se ocupará até sua aposentaria em 1925. QUEIROZ, 2011, p. 127-128.
[112] QUEIROZ, 2011, p. 97.
[113] Sugestão de leitura: Polêmicas ideológicas entre Tobias Barreto e os padres do Maranhão em 1883 nos jornais Diário de Pernambuco e Civilização. In: QUEIROZ, Teresinha; VILARINHO, Pedro. Páginas Impressas: história, imprensa e política no Brasil. São Paulo, Mentes Abertas, 2020.
[114] A vida profissional de Clodoaldo Freitas está marcada pela instabilidade insegurança. Além disso, ela só se torna compreensível à luz de sua acidentada participação política desde o Império. Ao voltar formado de Recife, os liberais no poder, já estava nomeado Promotor Público da Comarca de Teresina. No ano seguinte foi nomeado Juiz Municipal e de Órfãos do Termo de Valença […]. Em 1885, toma a frente da redação d’A Imprensa […]. Findo o seu quadriênio como Juiz Municipal, Clodoaldo deixa a redação do jornal liberal e vai para Amarante, como advogado do Partido […]. Em 1887, volta para Teresina, vai redigir o jornal A Reforma, […] do qual se afasta […] para ser outra vez redator chefe d’A Imprensa, substituindo Higino Cunha. De 1886 a 1888, […] estabelece banca de advogado, atendendo a chamados para o interior da Província e para o Maranhão. Em 1888 é nomeado Juiz Municipal do Termo de Santa Filomena […]. Com a proclamação da República, vem para Teresina. […] Apresentado por Clóvis Bevilacqua a Taumaturgo de Azevedo, logo passa a fazer parte de sua equipe de governo, na condição de Procurador Fiscal do Tesouro do Estado […]. Durante a década de 1890, […] foi duas vezes Procurador Geral do Estado do Piauí. QUEIROZ, 2011, p. 129-130.
[115] QUEIROZ, 2011, pp. 96-97.
[116] QUEIROZ, 2011, p. 100.
[117] Espalhados por todo o Brasil, mas especialmente da Bahia ao Amazonas, os egressos integraram-se ao movimento cultural dessa extensa região, que é tributário em boa medida da ebulição em torno da Faculdade de Direito do Recife. QUEIROZ, 2011, p. 101.
[118] QUEIROZ, 2011, p. 103.
[119] Desse acervo já delimitado, excluímos diversos autores, com número significativo de obras – casos de Félix Pacheco. Taumaturgo de Azevedo, Amélia de Freitas Bevilacqua, Armando Burlamaqui, Oscar Clark e Otávio Freitas. Os autores, apesar de piauienses, radicaram-se permanentemente fora do Estado, não participando de forma direta do movimento literário local. QUEIROZ, 2011, p. 143.
[120] QUEIROZ, 2011, p. 144.
[121] QUEIROZ, 2011, p. 144.
[122] QUEIROZ, 2011, p. 144-145.
[123] QUEIROZ, 2011, p. 145.
[124] QUEIROZ, 2011, p. 150.
[125] Teresina teve a sua primeira tipografia em 1906 – Libro Papelaria Veras. QUEIROZ, 2011, p. 150.
[126] QUEIROZ, 2011, p. 146.
[127] QUEIROZ, 2011, p. 151.
[128] QUEIROZ, 2011, p. 148.
[129] QUEIROZ, 2011, p. 149.
[130] QUEIROZ, 2011, p. 166. Teresinha Queiroz e Ronyere Ferreira publicaram o artigo “Literatos, política e atuação profissional em Teresina no início do século XX” aprofundando o debate: “embora se declarando avessos às práticas e partidos políticos que regiam as esferas de poder, elaboravam pensamentos complexos, com críticas, propostas e projetos ao regime republicano, assim como flertavam constantemente com os detentores de poder, com o fito de desfrutarem as suas benesses e garantirem posições na burocracia estadual”. In: Intellèctus. Ano XVI, n. 2, 2017.
[131] A filiação de Clodoaldo Freitas foi em 1881 e Higino Cunha em 1885. QUEIROZ, 2011, p. 307-308.
[132] Numa abordagem geral sobre suas trajetórias no cenário político, Higino Cunha teve mais proximidade com o poder, mesmo que numa posição de intelectual orgânico, “no centro das lutas políticas, sofrendo muitos ataques e até demissões de seus empregos públicos”, motivado pela perseguição que este exercia como jornalista político, entre 1914-1916. Clodoaldo Freitas – sua família já tinha um histórico de atuação política – assumiu o cargo de deputado estadual no Pará e no Maranhão trabalhou como procurador geral do estado e diretor da imprensa oficial. QUEIROZ, 2011, p. 306, 307, 308.
[133] QUEIROZ, 2011, p. 341.
[134] QUEIROZ, 2011, p. 318.
[135] Teresinha aprofunda os estudos sobre a compreensão de Clodoaldo Freitas em torno do contexto republicano em que viveu. Para saber mais, leia: QUEIROZ, Teresinha. Ressentimentos políticos e lutas de memória em A Balaiada. In: Tempo e Memória: interfaces entre os campos da comunicação e da história. QUEIROZ, Teresinha; REGO, Ana Maria (Orgs.). Porto Alegre: EDIPUCRS, 2020, p. 244 | QUEIROZ, Teresinha . A Balaiada, de Clodoaldo Freitas: considerações em torno de um manuscrito oitocentista. In: A História sob múltiplos ângulos: trajetórias de pesquisa e escrita – Volume 1 / NETO, Marcelo de Sousa; ALVARENGA, Antonia Valtéria Melo; FILHO; Pedro Pio Fontineles (Orgs.). Teresina: EdUESPI, 2020.
[136] QUEIROZ, 2011, p. 321. Indicamos como leitura complementar o artigo: CARVALHO, Flávio Fernandes, QUEIROZ, Teresinha. As várias memórias de Lívio Lopes Castelo Branco: política e ressentimentos inscritos na imprensa oitocentista. Revista Humana Res, v. 1, nº 4, ISSN: 2675-3901, p. 52-72, jan. a ago., 2021.
[137] QUEIROZ, Teresinha. Clodoaldo Freitas e a republicanização da República. In: História, Literatura e Sociabilidades. EDUFPI; Academia Piauiense de Letras, 2015, p. 29.
[138] QUEIROZ, 2011, p. 322.
[139] QUEIROZ, 2011, p. 156.
[140] QUEIROZ, 2011, p. 157.
[141] QUEIROZ, 2011, p. 158.
[142] QUEIROZ, 2011, p. 167.
[143] QUEIROZ, 2011, p. 170.
[144] Ligadas à problemática das relações do escritor com seu público e a legitimação do seu trabalho, existem muitas questões. Uma delas é a necessidade imponderável de influir socialmente que leva à aproximação com as classes populares, em oposição com a burguesia argentária. Paradoxalmente, nesta é a que está o púbico, virtual e efetivo. Além disso, é o reduto de sua origem e de seu lugar social, pois, a grosso modo, a origem dos literatos estudados é a classe média. A crítica à burguesia aparece como postura contra a sociedade e é atributo de ser intelectual então, mas é igualmente mecanismo de cooptação e criação de elos de simpatia no seio das classes laboriosas – sobre a qual a influência deve se projetar – e de definição de um novo espaço de legitimidade social, dado que a burguesia é indiferente por definição. Higino Cunha […] se dirigiam (e até tentaram dirigir) à classe operária, por meio do jornal O Operário. […] no complexo universo das relações sociais, a legitimação do literato é também buscada no seio dos analfabetos. Se não é possível serem lidos, que sejam ouvidos, ou pelo menos, quem sabe admirados? QUEIROZ, 2011, p. 188-189.
[145] QUEIROZ, 2011, p. 170-179.
[146] QUEIROZ, 2011, p. 181.
[147] QUEIROZ, 2011, p. 182.
[148] QUEIROZ, 2011, p. 187.
[149] QUEIROZ, 2011, p. 185.