3 Poemas De Claudio Daniel

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Claudio Daniel é poeta, romancista, crítico literário e professor de literatura. Nasceu em 1962, na cidade de São Paulo (SP). Cursou o mestrado e o doutorado em Literatura Portuguesa na Universidade de São Paulo (USP). Realizou o pós-doutoramento em Teoria Literária pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Foi diretor adjunto da Casa das Rosas, Espaço Haroldo de Campos de Poesia e Literatura, curador de Literatura no Centro Cultural São Paulo e colunista da revista CULT. Foi editor, por vinte anos, da revista eletrônica Zunái. Atualmente, Claudio Daniel é editor da revista impressa GROU Cultura e Arte e ministra aulas online de criação literária no Laboratório de Criação Poética.  Publicou diversos livros de poesia, ensaio e ficção, entre eles Cadernos bestiais: breviário da tragédia brasileira, Portão 7, Marabô Obatalá, Sete olhos & outros poemas e Dialeto açafrão (sob a lua de Gaza), todos de poesia, o livro de contos Romanceiro de Dona Virgo e os romances Mojubá e A casa das encantadas.


RADHA

Seu rosto é como a lua.
Ela, a moça que tem brincos
em formato de peixe
faz Krishna dançar
em lilas de amor dançarino.
Seus olhos são iguais
a pássaros dançantes.
Ela, cujo rosto é como a lua.
Cega de amor, dança
vestida de carmesim
flor de lótus nos cabelos.
Ela, cujo rosto é como a lua
só deseja ter um milhão de olhos
sem pálpebras, para ver sem piscar
as infinitas faces de Seu Amado.


BOSQUE DE RADHARANI

“flor com mil olhos de água”
Hilda Hilst

manhã de neblina
(cachoeira-branco-
azul-do-céu):
pés cruzam ponte de madeira
molhada pela chuva
até o campo
de pétalas
açafroadas.
Barro, lanternas
de pedra,
formigas que carregam
folhas, flores roxas e amarelas.
No bosque de Radharani
— moça com olhos de lótus
e voz cantante de mel —
tudo canta-encanta:
olhos-de-água
cantam-encantam
flores brancas
cantam-encantam
borboletas negro-azuis
cantam-encantam
até as pedras cobertas de musgo
cantam-encantam.
Nada existe além do aroma úmido
e dos ruídos do rio.
(Todos os rios oram por Ela
que se banha à meia-noite).
(Todos os rios oram por Ela
que dança com os pés
pintados de vermelho.)
Nada existe além das árvores
de troncos inclinados
pinhas queimadas
folhas e gravetos.
Porque tudo o que existe vem Dele,
vem Dela, vem do Ele-Ela
em mil danças de amor dançarino.
Pergunte às árvores.
Pergunte aos rios.
No bosque de Radharani
— aquela que encanta o encantador
o encantado encantável
Govinda-da-face-azul-lótus-negrume —
tudo é canto-encanto.

(em Nova Gokula, 2024)


NITYANANDA

Ele
o louco!
Ele, o louco
de amor!
Ele
que é dois:
o amor
e o Amado.
Ele
que é dois:
o dançarino
e a dança.
Ele-Aquele
cujos pés
brilham
rebrilham
como milhares
de luas
e sóis.
Presto
reverências
ao Senhor
Nityananda!
Ele-Aquele,
o de pele
vermelho-
dourada.
Ele-o-Outro
cujo pescoço
é untado
com polpa
de sândalo.
Presto
reverências
ao Senhor
Nityananda!
Ele-Aquele-o-Outro,
que sempre canta
os nomes
de Radha
e Krishna!
Por favor, escutai
minhas poucas
palavras.
Minha mente
é louca, louca!
Ela se move
como um peixe
na água, oscila
de um lado
a outro
não tem paz!
Minha mente
é louca, louca!
Ela corre-corre
como o elefante
na floresta
não tem paz.
É tão difícil
viver neste mundo
com a mente
descontrolada!
Por isso, presto
reverências
ao Senhor
Nityananda!
Ele-Aquele-o-Outro
que sempre canta
os nomes de Radha
e Krishna!
Esta mente
este mundo
têm menos sentido
do que a água
contida
na pegada da pata
de um bezerro.
Que o Senhor Gauranga
tenha misericórdia.
Que o Senhor Nityananda
tenha misericórdia.
Se tudo é loucura
se tudo é insanidade
entre ser louco
neste mundo
vaga mundo
e ser louco de amor
na dança-dançante-dançada
do dançarino de todas as danças
mostrai-me o caminho
dessa última suprema loucura.
Oh Senhor de pele
vermelho-dourada!

1 comentário em “3 Poemas De Claudio Daniel”

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