Davi Koteck nasceu em Porto Alegre (RS) em 1995. Publicou o livro O que acontece no escuro (Editora Taverna), e participou da antologia Qualquer Ontem (Editora Bestiário). Tem contos e poemas publicados na São Paulo Review, Ruído Manifesto, Etudes Lusophones (FRA), Revista Travessa em Três Tempos, Mallarmargens, e outros. Edita a Revista Rusga. Tem um livro de poemas no prelo. Todo abismo é navegável a barquinhos de papel (Editora 7letras) é sua estreia na poesia.
1.
joão
naquela casa de praia
em que não fui
havia louças sujas de plástico
cinzeiros feitos de cerâmica
restos de comida
azeitonas grudadas no teto
e você estava ali
dormindo em cima de um livro
do Dylan Thomas
no outro dia você me
olhou
com olheiras roxas
e gordas
confirmando
a função da poesia
2.
queria escrever um poema
queria eu sempre queria alguma coisa
esse verso eu roubei da Luiza
assim como ela rouba os versos
de outra pessoa
escrever um poema é olhar um espelho
quebrado
e juntar pedaços
em lugares que não encaixam
3.
e se acordasse dizendo
que não sinto mais tua falta
e se só sentisse saudade agora
do teu gato amarelo e gordo
ou da maneira que você se concentra
em frente ao computador
mas não de você
de gritar mazel tov quando a louça quebrar
ainda que agora eu só use copos descartáveis
e mesmo que agora eu só beba água da torneira
hoje é o terceiro dia que acordo sem sede
4.
ontem à noite
quando acordei
com eletric feel na cabeça
o desktop do meu computador
estava virado de cabeça para baixo
lembrei de quando você disse
assistindo televisão com olhos fechados
algumas coisas só
têm sentido no avesso
amanhã pode nevar em São Paulo
na mesa do lado há um cemitério de
cascas de bergamota e cinzas.
Sinto que me devem explicações.
