5 Poemas de Dyl Pires

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Dyl Pires (MA), poeta, ator. Desartista que vive há uma década em São Paulo, entre ações teatrais e poéticas. Dele já disseram: “misto de sátiro com coisinha ausente.” Acreditou, rs.

São 26 anos de caminhada artistica. Ainda em São Luís, participou dos espetáculos: Viva el rei D. Sebastião, Paixão segundo nós, Auto de natal, Auto do boi, Morte e vida severina, A bela e a fera, Baal, Torres de silêncio, Nós o fragmento que nos resta. Em São Paulo esteve em cartaz nos espetáculos: Roberto Zucco (2010), Satyros Satiricon (2012), Edifício London (2013), Édipo na Praça (2013), Não Vencerás (2014), Não Saberás (2014), Você Está Livre (2015), Terra dos Outros Felizes (2017), entre outros. Publicou os livros de poesias: O Círculo das Pálpebras (Func, 1999), O Perdedor de Tempo (Pitomba, 2012), O Torcedor (Pitomba, 2014), Éguas (Pitomba, 2017) e Queria falar do deserto dos dias apressados (Chiado books, 2019).

Tem ainda poemas publicados no Jornal Rascunho, Revista Pitomba, Acrobata e Germina Revista de literatura e arte. Como ator, recebeu em 2014 da câmara municipal de São Paulo a Outorga de Salva de Prata pelos 25 anos da Cia de teatro Os satyros, da qual integrou o elenco de 2009 a 2014.

 

Poemas do livro “Queria falar do deserto dos dias apressados” (Chiado books, 2019).

 

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Nada coincide com essa sozinhêz. Olho: aumentativo de ausência. O espelho não devolve mais do que sujeitos de interjeição. Queria falar do deserto dos dias apressados, do cemitério sobre os ombros, de como o olho se organiza para ser uma lua inóspita no caos sonoro da ausência. Mas insisto em fundar alegrias como um clown que madruga para dar bom-dia ao corredor vazio do prédio onde mora.

 

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A cultura das partidas do pra sempre. Esse acúmulo de terra nos olhos. Uma textura difícil de se reter por muito tempo na memória são das vozes da finitude que já se foram. Um guardar de louças entre palavras de nunca mais! A massa sonora vai se tornando pedaços de murmúrio, chiados, uma frase incompleta no tempo. Meu exercício diário é gravar a arqueologia sonora dos afetos. Sentir é território permanentemente isolado.

 

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Outubro escorregadio de tudo, como ostra. A melancolia era uma rua de seis casas sem saída. Uma vila charmosa! A grande chuva veio à noite. Os móveis da infância não estão mais no lugar. A memória não os organiza mais como lembrança. A chuva altera o sentido de urgência das coisas. A chuva nos devolve à condição da espera, à partilha de pequenos nadas; como arrancar beleza na rua de alguém que simplesmente caminha, mas que pulsa nos fios invisíveis da corporeidade o espantamento da finitude de uma vida inteira. A chuva é um dos rastros mais antigos de humanidade.

 

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Uma cidade atravessada por um rio morto. Um cadáver permanente na sala. Um ar espectral soletrando um poema concreto. Uma cobra-metrô: Dodeskaden que carrega uma cidade despresente. Às vezes há um grande sol, um extraordinário entardecer, uma maravilhosa manhã. Como uma grande palavra esquecida que chega. Mas rapidamente as pessoas retornam à cobertura gris das pálpebras e o cavalo dos olhos volta a galopar a neblina dos dias.

 

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Os Bandeirantes são os mais fotografados. Por trás de cada click há o concreto. Por baixo de todo o concreto há uma floresta muda. Lá ainda ouço o som do rio a correr pela garganta dos últimos índios.

 

 

 

 

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