Bruno de Sousa, Advogado, natural de Viseu, licenciado em Direito pela FDUC da Universidade de Coimbra onde publicou, com o apoio desta Instituição, o livro de Poesia “Pélago Sereno”. Foi fundador e co-participante do espetáculo de Poesia “Antologia Coimbrã”. Em Janeiro de 2018, publicou o livro de Poesia “Eclusa das Palavras” com a chancela da Editora Idioteque e em 2019 o livro de poesia “Speculum” com a chancela das Edições Hórus publicando, ainda, alguns poemas por revistas de poesia lusófonas dispersas.
Que desolação ou alegria habita
Que desolação ou alegria habita
Na noite que nos recebe e ali pasce,
De braços abertos, num estrelar que nos fita,
E o luar dos teus olhos em mim crepita
Um beijo que morrendo na tua boca nasce?
Que desígnios insondáveis perscruto
Na escuridão do teu corpo moreno,
Bebendo da luz um saxofone que escuto,
Numa melodia doce que se vestiu de luto,
Porque o dia é um intervalo pequeno?
Que voz ou som o meu desejo pressente
No mocho que canta o breu da vida,
Numa arrepiante eufonia decadente,
De agonia, como a aurora subsequente,
Ao toque que finda uma mádida despedida?
Obscuro domínio
Amar-te assim desvelado
Lábio mordido na luz.
Praia estendida ao Sol
Na areia do ventre olvido.
Fogo-fátuo de desejo
Feroz, barco louco.
Onomatopeia teu corpo
Tenaz do meu viver.
Sorriso vertendo vida
Teu abraço desertor.
Mãos que tocam o infinito
No alcance vasto do imediato.
Beijo que é noite escura
No dia que ali amanhece
Intemporal, estático,
Que o Amor um dia finda.
De novo, o teu toque:
Lua sonhada sibilante
Mordendo o céu límpido
Da tua boca que apetece.
Movimento que não pára
O começo que não termina.
Ser teu mais uma e outra vez,
Ser rio que em ti desagua .…
Rua da Liberdade
Na Rua da Liberdade
Cabe o Mundo inteiro.
Bicicletas pedalando sonhos
Na noite quente de Abril.
Cravos beijando armas,
Justiça, Igualdade e Paz.
O respeito da diferença
Na mesma forma de ser feliz.
E querem com ela acabar.
Deitar-lhe alcatrão por cima.
Na ditadura das palavras
Matá-la, lentamente, por asfixia.
Mas, a memória nunca permitirá.
Sem amarras, retornaremos a ela,
Juntos, de mãos dadas, Sophia e Ary,
Ali já ali ao virar da esquina!
O regresso nem sempre é uma vinda
O regresso nem sempre é uma vinda
Que torna ao lar que o abraça.
Há saudades de amor que o tempo lassa
E que permanecem ainda e ainda.
A ida para uma fuga que nos prende
Faz-nos ficar tristes e sorumbáticos
Como se o vento, nos seus coices acrobáticos,
Nos ciciasse que a compra também se vende.
E a solidão alastra e aborrece
Porque sabe que não é voluntária.
Mas, o coração é teimoso e pária
E nas recordações lembra o que viesse.
O regresso nem sempre é uma vinda
E um escape não soluciona a solução
Que está nas mãos de uma só mão
Que é tão simples como uma chuva linda.
Jogado a um canto como um farrapo
Está o sentimento que é enorme
– Tolo de tolices disforme
Que te ama e que agora destapo.
Abertura
Na abrupta imediatez
De um sentimento vago,
A peso de ouro pago,
Desnudo minha pacatez.
Mostro o seráfico lago
Onde afundo a minha embriaguez,
E, de quando em vez,
Transformo a magia na mágica do mago.
E canto! Freneticamente.
Afinal, a mim me pertenço.
Luto, perco, desacredito e venço
Em cambalhotas de giratório sentido absorvente.
Meus olhos são o que penso:
Desalinhado traço irreverente,
Do espaço próprio, inconsciente.
Sou Eu: coração envolto num lenço.
A noite
A noite entrega-me o teu corpo obsceno
Que pertence ao degredo sujo das ruas.
A saia gavinha as coxas nuas
Que suportam um esqueleto pequeno.
O teu corpo é seara de veneno,
Dos meus gestos loucos que tu atenuas,
Num prazer feérico que faz das suas
E me consome num deleite agareno.
Acendes um cigarro alienada
Da podridão imunda que é a tua vida
Que te obriga a ser uma mulher ofertada.
Colocas baton na boca estavanada
E olhas o espelho que não tem saída,
Não contendo uma lágrima imprecatada.
Soberbo!