Felipe Nascimento (2000) nasceu em Santos, mas mora em Praia Grande. Sobrinho-neto do poeta popular Alfredo Vieira, é estudante de Letras no Instituto Federal de São Paulo no Câmpus Cubatão. Teve como objeto de sua pesquisa a relação entre Literatura de Cordel e Literatura Medieval. Teve poemas publicados em revistas como Mallamargens, Ruído Manifesto e Literatura & Fechadura. Seu livro O lado sensacional da vida é o meu ou livro dos mortos, editado pela Editora Patuá, foi premiado com Maria Firmina de Literatura. Lançou em 2023 o Antiquário de Selvagerias pela mesma editora.
[ESSA TEOGONIA DE DOIS PAGÃOS]
Essa teogonia de dois pagãos
Paródia da vivência dos deuses
se funde a claridade do dia
Essa teogonia, arrancada dos fígados
Dos homens, resume o mundo-carcará
Em que nos encontramos
Essa teogonia, essa filosofia
Imbricada de solavancos
Desaparece como fogo no céu.
Essa teogonia sem estrela-guia
topologia confusa
De nós dois.
[TEU NOME É O NOME DE MINHA MUDEZ]
Teu nome é o nome de minha mudez
Discurso em que as coisas nascem.
Teu nome repousa no meu nome
Na ferida da minha identidade.
No império de coisas esquecidas.
Teu nome é a geometria
Que trai a flor
A cidade os jardins
Há aqui um pensamento
Pela metade, toma-o
E o mastigue.
[MINHA SOMBRA TRAIU A PÁTRIA]
Minha sombra traiu a pátria
Nação do mistério em que criei meu pai
Vou em direção ao pelotão
Encaro a morte, velha amiga,
Amazona sem espada.
Seus olhos fugitivos
Tem perdão. Suas mãos agitadas
Prontas para a execução
Não se reconhecem.
Sóis temporários iluminam a noite
Arranca do céu o privilégio do sangue
E terminam os dias de um monarca
Rei dos animais.
[O MEU AMADO]
O meu amado
Tem relevos nos olhos
De uma cidade estranha.
Conquisto nos silêncios
Mistérios das mãos
E das bocas.
Signos estranham-se
Nos escuros dos nossos céus
Linguagem já assassinada do amor.
O meu amado
Conhece a linguagem
Do vento nas relvas.
[A MORTE ROUBARÁ O MISTÉRIO]
A morte roubará o mistério
Que anda dentre os homens
Solucionará o cálculo do céu noturno.
Interromperá a dialética do amor
O ser dissoluto que nos tornamos.
A morte e seus cavaleiros previsíveis
Caminham entre nós
Trocam as máscaras dos transeuntes
(diante da morte só é possível outros fingimentos).