Diogo Costa Leal nasceu no Porto (Portugal) e vive em Almada. Publicou dois livros de poesia. Adora unir a escrita à palavra dita. Foi formador de escrita criativa. Publicou poemas em algumas revistas. É formado em ciências da comunicação. Também adora cinema, sendo que alguns dos seus filmes favoritos são Poesía sin fin (2016, Alejandro Jodorowsky), Knight of Cups (2015, Terrence Malick) e Waking Life (2001, Richard Linklater). Gosta de muita música, incluido alguma eletrónica e boas malhas ao estilo de Nils Frahm.
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Duas crianças jogam à apanhada
e tu és o verde que elas descalçam
A senhora do balcão
põe um rebuçado no café
e tu levitas brotado de mapas
Na carruagem
um senhor fala com um desconhecido
e depressa se te endireitam as paisagens
Andas em guerras de almofadas
e a história da humanidade
torna-se mais limpa
Danças com a morte
nos afetos ressuscitados
Renasces telas encantadas de peles
com o sorriso da mulher da mercearia
e estremeces de janelas elásticas
no abanar tresloucado da cauda dos cães
Dão-te boleia para ali para o fundo
e depressa começas a uivar asas pelas escamas
Tens patas de areia acesa nos reencontros
A engenharia de estar bem disposto
a partir de companhias mais longas
do que o futuro
E uma placenta possível nos diálogos
Quero que abraces os trezentos calendários
no ensinamento dos outros
Que primaverizes o colo de quem chora
carros capotados
Que descubras nuvens tintas para o silêncio
E agradeças
o simples facto
de puderes fazer amor
no fôlego dos pardais
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Podemos ter a gargalhada self-service
A cabeça a andar à leveza
dos asteroides dentro das nuvens
Molhar a face por todos os motivos
A grande coragem da desconcentração
Podemos sempre
o grande elogio dos descampados
A superação total dos cansaços gestos
Enganar contradições na trovoada
Perguntar de lua cheia
Fraquejar violências
Podemos tocar tambores com os passos
Ter palhaços às cavalitas de mágicos
E mágicos por cima dos nossos ombros
Podemos consentir bailarinas coisas para tudo
Destrançar cascatas
Adubar a compreensão dos pássaros
Fechar os olhos e fazer portas com a boca
Brutalizar as âncoras
Namorar o arco-íris
Sorrir até à última gota
e gritar em contramão na emergência
Atravessar o fogo
Dançar sozinhos em coretos quartos
Beijar o furacão do crânio
Lembrar o verde
para cantar de cor as respostas
Ter pé no agora
E bruços para voar
Podemos
a grande liberdade aerodinâmica
A velocidade dos leopardos
Ronronar com a cabeça sobre joelhos secretos
Ter uma ereção de estrelas
e um orgasmo de tulipas
Ser experimentadores de fendas
Soletrar dias solarengos
E crepúsculos húmidos
Agradecer a elegância dos corpos
e toda a matéria desorganizada
Transpirar metrópoles e lavar-nos em aldeias
Ser fluentes em insistências nos desperdícios
Explodir cismas pétalas das córneas
Ter o prazer de ser
Exageradamente
Pestanejar o coração
Envelhecer esborratados
Engordar o sonho de corredores
Ser encantadores de acasos
E permanecer levantados no desânimo
Criar hábitos de profundidade
Afagar um arcanjo nos amigos
Podemos a infância das pedras
porque fazemos poemas
Criamos laços com o mundo
E escorremos eternos nos rios
Dalgumas memórias