.ROSCOTOS – 3 Contos de Bruno Azevêdo

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Bruno Azevêdo (MA) É premiado autor de “Breganejo Blues”, “O Monstro Souza” e “Isabel Comics”. Mora em São Luís com sua linda esposa, Karla, a filha Isabel e o gatinho Marreco


ROSCOTOS, A POESIA LEGISLATIVA DA RAINHA CHE BE TO A SOU

Quando do achado do sítio arqueológico da cidade de Okifô, entre baús, utensílios, esqueletos, tapeçaria e uma infinidade de objetos fálicos dos mais diversos materiais, chamou a atenção da equipe de pesquisa uma série de escritos, encadernados intitulados Roscotos da rainha Che Be To A Sou.

O livro de Roscotos continha pequenos textos, cuja forma e conteúdo acabaram por ser sintetizados nesta mesma palavra. Abaixo, a explicação dada no próprio volume.

Versos escritos com fios de um broto

Cultivado na mata escura do coito

Colados com a goma que te sai do escroto

No que se entende o Roscoto como uma forma poético-plástica, pois sua realização, como uma instalação, requer participação direta do expectador, assim como a intervenção no objeto instalado.

Não se sabe se todos os 423 Roscotos foram registrados com matéria prima da rainha, mas testes de DNA poderão esclarecer este tópico.

Os Roscotos seguem a cartilha da arte caligráfica oriental, com caracteres cuidadosamente desenhados, um a um, com material natural. Após a descoberta e primeiros relatórios sobre os textos, a roscoteria (que é a arte de compor textos com fios de vênus colados com mel do amor) tornou-se bastante popular em alguns países, com a abertura de clubes roscotéricos, dos quais trata o blockbuster “Roscotos de amor e balas”, com Tony Ramos no papel de um vendedor de coxinhas sequestrado por maníacos roscotistas.

A tradução dos Roscotos ficou a cargo da equipe original, que levou anos para concluir o trabalho, deixando ainda o mistério maior por trás de sua função naquela sociedade.

Seriam os textos meros poemas fornicatórios? Se sim, o que explica ter sido achado o livro no palácio real, com a escritura “deem fé e façam cumprir”? Por que a forma não foi copiada por outros membros da sociedade? Seria o Roscoto uma forma poética sob monopólio do estado, mais precisamente, da rainha?

São estas e outras questões que traremos à luz, mas não tanto à luz, pois como nos ensina o Roscoto 71, também conhecido como Roscoto da imaginação viril:

Sem luz o tamanho não se sabe

Se descobre somente,

se cabe ou não cabe.


ROSCOTO 23.

2 é bom

3 é ótimo

4… ahhhh

Já diria a escola minimalista de verbalização sucinta que muito mesmo só fala quem não tem a dizer, e que o pouco dito deixa o ouvinte à mercê de sua própria burrice, que, com o incentivo certo, pode até ser dada como inteligência.

Se os membros dessa antiga escola concordassem em ainda emitir alguma opinião (o postulado acima foi seu único manifesto), poderiam nos auxiliar na explicação de tão mínimo roscoto.

Poderíamos começar por questionar a própria natureza de número enquanto uma abstração de quantidade, especulando que 2, 3 e 4 pudessem se tratar não de formas de contar, mas de maneiras de chamar aqueles que tinham, respectivamente, estes nomes.

Destes, tem-se menção (no roscoto 89, também conhecido como “Roscoto do empanzinamento”) de 4 como um homem cujo membro é descrito como tão grande que cobras tentavam acasalar com ele.

4 viveu até seus últimos dias como servo fiel da rainha, ocupando local de destaque nas reuniões lúbricas que aconteciam no salão real.

Pouco se sabe de 3, 2 ou outras denominações numéricas, exceção feita ao indivíduo conhecido como 69, presente em 57% dos roscotos.


ROSCOTO 69

Oruborus do amor
Tua extremidade meu começo
Caminho pra lugar nenhum
Parado, me empalas

O indivíduo que dá nome a este roscoto, e fornece inspiração para outros tantos, tem na própria grafia de batismo a figura rocambólica do infinito. 69 é, dos mencionados nos textos, um dos poucos cuja tumba não foi encontrada em volta dos mausoléus da rainha.

E de mais ninguém.

As especulações sobre 69 são tantas que, caso seu nome fosse também uma forma de quantificação abstrata, haveria mais teorias que esta quantificação seria capaz de ordenar.

As teorias mais aceitas entre os arqueólogos são:

01. 69 nunca existiu, era fruto das poluções noturnas da rainha, que, ao acordar, vertia em versos tresloucados seus sonhos kidbengalianos.

02. 69 existiu, mas foi morto pelo rei na noite conhecida como “o cisma do leito nupcial”, na qual foram ceifadas 8 cabeças e 47 grandes, sem que nenhuma estivesse ligada a outra, totalizando cadáveres e 47 novas esponjas de banho para rainha.

03. 69 era um grupo sem identificação individual, selecionados ao nascimento, e cuja educação era voltada exclusivamente à satisfação pena da rainha. Este grupo agia organizadamente, de maneira que seus gestos, contínuos, sincronizados, e ininterruptos, fazia com que se tratasse de uma só pessoa, voraz e insaciável.

04. 69 era uma alteração na cadeia evolutiva dos eunucos abanadores. Fez carreira nos corredores e arredores do salão real, também nele. E se dizia imortal.

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