por Jaislan Monteiro (convidado especial)
Para dar continuidade ao bate papo com a pesquisadora Emília Soares iniciada semana passada, a Revista Acrobata convidou o historiador Jaislan Monteiro para conduzir a segunda parte da entrevista e a conversa rendeu uma série de temas envolvendo a Tetralogia Napolitana, sequência de obras que virou sucesso de público e crítica, bem como sua adaptação para a série de TV “My Brilliant Friend”. Literatura e tradução, experiências de leitura, o papel da escrita literária e outras reflexões são abordadas nesse encontro que vale a pena conferir!
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Segundo a crítica especializada, a obra de Elena Ferrante representa um suspiro de inventividade para o gênero literário. Ao utilizar-se de particularidades estilísticas, sua escrita consegue a proeza de transitar os estritos limites dialógicos entre a literatura popular e a literatura clássica. Em tempos da escrita como pastiche – em que quase tudo se oferece como repetição da herança deixada pelos modernos – quais os elementos utilizados por Elena Ferrante que permitem sua obra se consagrar, a um só tempo, como produção artística e sucesso editorial?
Essa proeza vem da linguagem literária que Ferrante utiliza que, como você já mencionou, transita entre o popular e o clássico. A narração do “talvez”, “daquilo que poderia ter sido”, “daquilo que não saberemos ao certo” é muito comum na estética de Ferrante. A ambivalência é um elemento norteador de seu texto, por isso a autora se afasta ao mesmo tempo em que se aproxima da tradição.
Sua escrita trata de temas pouco explorados profundamente na literatura, como por exemplo a amizade feminina e as agruras da maternidade. Sua obra possui várias camadas de leitura, o que é um prato cheio para a diversidade de leitores, sejam eles especializados ou não. Há esse diálogo com a tradição, porém ele é revestido de contemporaneidade e de um retorno ao realismo, nas palavras de Maurício Santana Dias. Há também um intenso diálogo com a psicanálise, uma difícil necessidade de se aceitar o outro, em especial, a mãe.
Acredito que o que mais chama a atenção para os leitores de Ferrante é o efeito de verdade que permeia seus escritos. É a percepção de que a escrita “quer” mas “não pode tudo”, pois não sabemos nem ao certo quem somos. O eu feminino, seu gozo, suas técnicas são por demais heterogêneos. É um processo infinito de composição e decomposição. Nápoles é a paisagem poética de Ferrante, mas nos transporta também para o Nordeste brasileiro, como um jardim de casa que pode ser aberto ao mundo inteiro. É incrível como ela conecta subjetividades díspares fazendo com que o leitor despreze, aceite e se enxergue ao mesmo tempo em suas personagens.
Existe o estereótipo da “poverella”, por exemplo, mas ele é tão bem escancarado aos nossos olhos que ganha outros ares de realidade. As sínteses que ela opera não simplificam, ao contrário, nos causam extremo desconforto. As personagens fogem dos estereótipos, porém, numa sociedade machista, ainda é difícil sobrepor os rótulos. A literatura de Ferrante não cria uma heroína, um modelo de personagem feminista, porque essa construção ideológica ainda soa utópica. Em seu último livro, “A vida mentirosa dos adultos”, vemos novamente esse desejo e os caminhos a serem seguidos, cuja base está na complexa relação entre as verdades e as mentiras que operam na vida familiar.
Por estar inserida nesse contexto ainda de desconstrução de velhas categorias associadas ao gênero, acredito que Ferrante não tem esse interesse de se consagrar como uma obra de sucesso. Há muita consciência dos percalços da luta por uma intelectualidade feminina num universo em que homens letrados e cultos minimizam as conquistas de gênero.
A Tetralogia Napolitana é um romance que tem como um de seus principais focos narrativos a perspectiva da metalinguagem. Lila e Lenu demonstram muito cedo o encantamento com a arte literária e se aventuram, desde a primeira infância, a ler e escrever livros como parte indissociável da existência. A narrativa, elaborada por Elena Ferrante, ganha nítidos contornos de uma metaficção, na medida em que dá poder às personagens para escrever romances e criar personagens para seus livros. A partir da evolução da trama, deparamo-nos com as mais diversas temáticas – que vão desde a Itália pós-guerra, passando pela infância, feminismo e maternidade, até chegar aos dilemas da velhice. José Saramago nos diz que “tudo é autobiografia e que a vida de cada um de nós a estamos contando em tudo quanto fazemos e dizemos”. Poderíamos dizer que a obra escrita por Elena Ferrante é uma biografia ficcional ou um romance que possui elementos autobiográficos?
Na verdade, apenas Lila escreve um livro na infância, “A fada azul”, o qual é um pontapé inicial de um dos primeiros projetos da personagem: tornar-se rica tal qual a escritora do livro “Mulherzinhas” (Louisa May Alcott). Mas é Lenu que, na fase adulta, torna-se de fato uma escritora. A escrita de Lenu deseja alcançar a “limpeza” da escrita de Lila, esta que não possuía o artifício da linguagem.
Talvez essa seja a tentativa de Ferrante: escrever a verdade literária de forma tão natural que crie a ilusão autobiográfica. Assim como a vida que tende para a obscuridade, como afirma Lenu na Tetralogia, a ficção é um emaranhado de dores, como afirma Giovanna em “A vida mentirosa dos adultos”.
A narração da autora tenta organizar e racionalizar os fatos, tal como Proust o fez em “Em busca do tempo perdido”, mas com a consciência de que assim que um escritor acaba um livro ele não se liberta totalmente dele. Ferrante afirma que escrever é libertar-se do livro, porém suas obras possuem um fio que as conecta entre si. Os livros, nessa perspectiva, não parecem libertos. Há uma insistência por determinados espaços, determinadas dores que não se esgotam. Se há elementos autobiográficos, não podemos citá-los com precisão. Mas existe uma afirmação de certos terrenos poéticos, como Nápoles, a maternidade, as conflituosas relações familiares, a “desmarginação”, dentre outros.
Esses elementos podem nos aproximar de Ferrante, talvez de dados autobiográficos, mas certeza não podemos ter. E até mesmo se tivéssemos o rosto de Elena Ferrante estampado na orelha do livro ainda assim não encontraríamos a real identidade, principalmente quando tratamos de uma perspectiva feminina.
Mesmo sem esses dados precisos, há uma potência de verdade em seus escritos, tão grande, que o fato de serem autobiográficos ou não deixa de ser relevante.
O sucesso alcançado pela Tetralogia Napolitana possibilitou que a obra fosse adaptada à linguagem cinematográfica em busca de novos públicos. A série My Brilliant Friend se tornou a primeira em língua não inglesa da HBO – rodada em italiano e com numerosos diálogos em dialeto napolitano – e suas duas primeiras temporadas tiveram altos índices de aprovação dos espectadores e da crítica em todo o mundo. Sabemos que a transposição do texto literário para a linguagem cinematográfica evoca, inevitavelmente, questões relacionadas à intertextualidade e à tradução intersemiótica. Do seu ponto de vista de leitora da obra e de espectadora da série, quais os ganhos e quais as ressalvas que podem ser feitas diante desse processo de adaptação do texto literário para as lentes da sétima arte?
Entendo que uma série televisiva já é por si só uma nova obra de arte. Então, não acredito que se trate de ganhas ou perdas. A Lila que eu imaginei ao ler o livro pode ser completamente diferente daquela que o diretor idealizou e vice-versa. O tradutor entra com o papel de leitor, mas também de criador de uma nova obra.
Na atualidade, com essa explosão bem-vinda de séries maravilhosas, tem se tornado comum a colaboração de escritores, como por exemplo Margaret Atwood, em “The Handmaid’s Tale”, George R. R. Martin, em “Game of Thrones” e, até mesmo, Elena Ferrante, na série “My Brilliant Friend”. E, mesmo com a presença deles, a obra ganha novas asas e voa.
No caso desta última, vemos a presença do dialeto, o que na obra de Ferrante é um dos temas principais, porém pouco explorado na fala das personagens. Essa ausência na obra é providencial, pois traz mais cargas metaficcionais ao texto e ao sentimento de repulsa da personagem Lenu. No caso da série, provavelmente para trazer mais dinamismo e verossimilhança, optou-se por evidenciar o dialeto nos diálogos. Quanto mais diálogos forem promovidos, seja através de pinturas nas paredes de Nápoles ou seja através de séries televisivas, mais teremos ressonâncias do texto de Ferrante, o que pode ser visto como um ganho. As intertextualidades e as traduções intersemióticas estão dinamizando a forma como as leituras são feitas. A tecnologia futuramente ainda nos fará assistir a mais possibilidades de conexões com o texto literário. A leitura exigirá cada vez mais esse movimento entre o escrito e o audiovisual.
Ao longo da Tetralogia, testemunhamos a movimentação de Lila e Lenu no território da linguagem. Ambas crescem com o aprendizado do dialeto local, mas logo aprendem – no caso de Lenu – o italiano clássico e o acadêmico como forma de inclusão em novos espaços. O jogo linguístico entre o napolitano e o italiano é quase um personagem no decorrer da obra. Sabemos que a tradução de uma obra para outros idiomas termina por deflagrar problemas de intraduzibilidade e indeterminação relacionados ao ritmo, à cadência, ao vocabulário e à sintaxe da narrativa.
Paul Ricœur nos informa que a língua tem propensão ao “enigma, ao artifício, ao hermetismo e ao secreto”. Isso nos faz recordar o jogo dialético fidelidade/traição presente no âmbito dos estudos linguísticos, consignado no epíteto italiano “traduttore, traditore” (tradutor, traidor). Ao realizar um estudo mais detalhado da obra – perspectiva incontornável dos estudos acadêmicos –, como lidar com a construção dos sentidos e dos significados da obra quando ela nos chega às mãos pela ressemantização operacionalizada pelas escolhas do tradutor?
Conheci o tradutor da Tetralogia, o Maurício Santana Dias, no Colóquio Internacional “Elena Ferrante: margens, autorias e outros abismos da ficção”, que organizei com o professor Yuri Brunello (na Universidade Federal do Ceará), e na ocasião ele revelou que não encontrou problemas no processo de tradução no que diz respeito ao que seria intraduzível por conta das diferenças culturais e semânticas. Mas provavelmente alguns sentidos, alguns lugares, algumas expressões são mais bem compreendidos quando se lê o texto na língua de partida.
Um exemplo é a expressão “borsa nera” (bolsa negra) que aparece na Tetralogia ao se referir a Dom Achille: na tradução entendemos que as crianças imaginavam que esse homem andava com uma bolsa negra para guardar as bonecas que roubava. Mas essa expressão italiana tem a ambivalência de ser também atribuída ao mercado negro camorrista. No Brasil, aqui poderíamos chamá-lo alegoricamente de “o homem do saco”, numa tentativa exagerada de domesticar a tradução.
A visão do tradutor como “traidor” acredito não ser mais adequada, pois não existe obra fiel ou infiel, o que existem são escolhas que em algum momento deverão ser feitas para garantir ou não uma boa experiência de leitura.
O papel do tradutor é de extrema importância como facilitador, dinamizador de culturas e, principalmente, criador. As diferentes adaptações de uma obra, por exemplo, nos colocam diante de pontos de vista, escolhas semânticas e ritmos variados. Algumas obras e determinados gêneros vão ser mais fáceis de traduzir, outros demandarão muito trabalho artístico do tradutor.
A despeito do enigma que envolve a sua real identidade, Elena Ferrante chegou a declarar que “os livros, uma vez escritos, não precisam de seus autores. Se eles têm algo a dizer, mais cedo ou mais tarde encontrarão leitores”. Essa afirmação, ao tempo em que relativiza o protagonismo da autoria – na medida em que a obra não mais se esgota nos limites interpretativos definidos pelo escritor – promove um novo equacionamento entre o texto literário, o sentido da narrativa e a posição do leitor. Em termos práticos, que papel o professor de literatura do Ensino Básico deve exercer para que seus alunos possam compreender e incorporar a ideia de que a construção de sentido do texto literário reside não mais na origem (escritor), mas sim na multiplicidade de vozes dos seus destinatários (leitores)?
Os autores sempre pressupõem a presença de um leitor, seja ele ideal ou não. As obras podem e (até devem), no sentido ferranteano, serem abandonadas por seus autores, mas jamais por seus leitores. É papel do professor instigar seus alunos a fazerem suas próprias análises, mas com ponderação, com respeito à própria dinâmica do texto.
A interpretação do professor ou de qualquer pesquisador não encerra um texto literário. Ele reverbera por anos na mente dos alunos. Ferrante é mestre em nos trazer segredos obscuros em suas obras, segredos que mostram, por vezes, a banalidade de que é feita a matéria dos homens. As obras dela nos convidam para esses mistérios, por mais que o argumento principal já seja entregue desde o primeiro parágrafo. O mistério vai além do enredo, o mistério mora nas expressões não-ditas, nas mentiras, nas metáforas e nas metonímias apresentadas. O mistério não morre nunca.
Em um de seus livros mais conhecidos (Por que ler os clássicos), o escritor italiano Ítalo Calvino estabelece 14 definições/aforismos para uma possível exegese da tradição literária e intelectual do Ocidente acerca da noção de “obras clássicas”. Duas delas são particularmente instigantes, como: 1. Os clássicos são livros que exercem uma influência particular quando se impõem como inesquecíveis e também quando se ocultam nas dobras da memória, mimetizando-se como inconsciente coletivo ou individual; 2. Um clássico é um livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer. Do seu ponto de vista, essas definições se adequam à Tetralogia Napolitana escrita pela contemporânea e compatriota de Calvino?
Ferrante faz um intenso diálogo com os clássicos em sua obra, mas a leitura de seus textos também pode atingir leitores que pouco entendem sobre mitologia greco-romana. Eu não diria que a obra de Ferrante é um clássico, pois para ser um clássico demandaria de algum tempo para essa consagração. Sabemos que o que é clássico requer uma afirmação do cânone e da posteridade. Se a obra de Ferrante ainda suscitará questionamentos para outras gerações de leitores, ainda não temos como mensurar.
Sabemos sobre os princípios que regem politicamente a escolha do que irá ser considerado clássico. Sabemos também que obras escritas por mulheres pouco adentram nesse mundo privilegiado. Na Tetralogia, observamos a odisseia de Lenu em busca de uma ascensão pessoal e social. A personagem sofre por sua baixa autoestima, principalmente no quesito intelectual. Compara-se frequentemente com seus professores, sua amiga superdotada Lila e seu amor de infância, Nino. As percepções feministas que a narradora-personagem vai adquirindo ao longo de sua jornada são importantes para a conquista de maior liberdade de expressão.
Em seu primeiro livro, Lenu é atacada pela crítica por descrever uma cena de sexo na praia, o que seria indecoroso para uma escrita feminina. Por conseguinte, Lenu não recebe a impressão positiva de Lila sobre os seus textos, o que a deixa menos motivada ainda. Mais tarde, é cobrada por não militar o feminismo em seus textos.
Por último, já na velhice, sua obra é ridicularizada por uma de suas filhas, Elsa, que lê em tom irônico e de deboche trechos do livro que sua mãe escrevera. Isso demonstra que a incerteza sobre a qualidade de suas obras perdura mesmo com a relativa consagração de traduções e de premiações.
Lenu chega à conclusão de que sua vida fora uma batalha em busca de superar o livrinho de infância de Lila, “A fada azul”, e a sua humilde classe social. Enquanto o nome de Lila estaria relacionado a uma única obra de grande relevo, a sua estaria condicionada a um sucesso perecível. Lila é a escrita do desejo, a escrita sem a artificialidade, a escrita do amor próprio. Por conta do sumiço da amiga, Lenu escreve por vingança. O nome irônico e genérico do livro “Uma amizade”, seu último livro, é também o marco do (talvez) último desentendimento entre as duas.
Então, a ideia de se consagrar como clássico ou como uma obra de relevância ainda é, para Ferrante, um intenso desafio para a mulher que escreve, pois, dia a dia, ela precisa afirmar sua intelectualidade feminina, ainda vista de forma bastante duvidosa pela sociedade. A quebra dos limites fixados por uma ideia de feminilidade ainda é utópica. Para tanto, como nos ensina Ferrante, é necessário criar códigos de uma amizade feminina, refundar uma nova cidade e apagar os vestígios de uma existência anterior.
Ao longo do último século, muito se escreveu sobre o valor e a utilidade da literatura. Para o filósofo e linguista Tzevan Todorov a literatura serviria principalmente “para nos fazer pessoas melhores”. Na mesma linha de raciocínio, o crítico literário Antoine Compagnon defende a ideia de que a literatura “serviria para nos fazer mais felizes ou menos infelizes”. Para o crítico literário brasileiro Antônio Cândido a literatura “serviria antes de tudo como uma força humanizadora, capaz de exprimir o homem e atuar na sua formação”. Em linha radicalmente oposta, o escritor português José Saramago afirma que “não há resposta possível, ou há infinitas: a literatura [serviria] para entrar numa livraria e ficar em casa; para ajudar a pensar ou simplesmente para nada”. Para você, para que serve a literatura?
A literatura não serve para nada. Ela não está a serviço de ninguém. Muito se enxerga esse caráter didático da literatura de conduzir para um bem supremo, humanístico, o que é um grande perigo, a meu ver. Evocar um utilitarismo para qualquer arte é uma redução a um fim, a um esgotamento. A literatura apresenta mundos paralelos ao nosso, às vezes, com uma impressão de verdade mais dilacerante que a própria realidade. Se a literatura faz as pessoas mais felizes, infelizes ou humanas, é apenas uma das muitas camadas de efeitos, que são diversos a depender das experiências de mundo do leitor.
Em uma das raras entrevistas concedida à imprensa, Elena Ferrante afirmou que “passar o tempo com o foco na escrita é ambição de um adolescente triste […] e que viver é uma perturbação constante da escrita [sem a qual] escrever se tornaria um rabisco frívolo na água”. Gostaria de saber como você se situa diante da difícil arte de escrever uma tese acadêmica no momento em que boa parte das possibilidades de exercer outras atividades cotidianas foram suprimidas em virtude do contexto provocado pela pandemia.
Assim como Ferrante, acredito que escrever é libertar-se, do livro (ou da tese)… As ideias ficam flutuando e precisam de linhas para repousar em paz. Amém. É preciso foco, determinação e um pouco de ócio para escrever. É preciso viver também, sair, tomar uma cerveja, conversar com pessoas sobre outros assuntos, mas em tempo de pandemia está difícil essa convivência.
É o período que, surpreendentemente, eu menos tenho usado as redes sociais. A pandemia nos mostrou o desgaste do nosso cotidiano e o tédio que habitava em nós mesmos. Nossos defeitos estão mais aparentes, a impaciência e a ansiedade se tornaram problemas mundiais. Há dias de intensa produtividade, outros mais tensos e vazios de ideias. As atividades cotidianas estão misturadas com as de trabalho e de estudo. Público e privado estão numa dança caótica. Afundar-se somente na ficção como escape e não olhar pela janela de casa e vê a morte acenar é um tanto complicado.
A pandemia nos convida a tentar morrer menos e a viver mais. Não podemos ser tão criativos e inventivos o tempo todo. Sempre me cobrei bastante, mas também consigo prever momentos que é melhor ir com calma. O mundo acadêmico nos cobra uma produção desenfreada e eu me pergunto quantas pessoas realmente vão parar para ler a minha volumosa tese? Ou os meus artigos? Ou, até mesmo, esta entrevista?
Mesmo assim é preciso não desistir. O processo está doloroso para todos. A impressão é de que este ano ainda nem começou de fato. A globalização nos trouxe a maravilha de reduzir as distâncias espaciais, no entanto com essa redução trouxe também a possibilidade de se espalhar mais facilmente as doenças. Estamos ainda num aprendizado sobre como lidar com essa nova realidade. O mundo jamais será o mesmo. E nem nós. Enquanto isso, vamos com calma escrevendo uma tese, cuidando das nossas casas, dos nossos filhos, do nosso trabalho, da nossa saúde mental e dos nossos doentes.
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