As obras da escritora italiana Elena Ferrante estão em alta, conquistando cada vez mais leitoras e leitores no Brasil. Dentre seus livros mais lidos, podemos destacar Dias de Abandono (2002) e A Filha Perdida (2006), mas a obra que está com forte visibilidade por aqui é a tetralogia napolitana (A Amiga Genial – 2011, História do Novo Sobrenome – 2012, História de quem foge e quem fica – 2013 e História da Menina Perdida – 2014).
A Revista Acrobata – atenta à repercussão das obras no país – entrevistou a pesquisadora Emília Soares em 2020. Em “Diálogos sobre estética e verdade literária em Elena Ferrante” podemos conhecer melhor a potência criativa da autora.
Para ler a entrevista:
Entre 2018 – 2022, Emília fez doutorado na Universidade Federal do Ceará (UFC) e escreveu a tese “Maternidade incômoda e jogos de espelhos femininos na Tetralogia Napolitana de Elena Ferrante”. Seu trabalho foi selecionado pelo Programa de Pós-Graduação em Letras (PPGL) para concorrer ao Prêmio CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) de tese 2023.
Para Emília, a tese aborda a Tetralogia Napolitana e nos apresenta a trajetória de Lila e Lenu em sua odisseia subjetiva diante das complexas regras masculinas. O estudo objetiva analisar como a linguagem ferrantiana constrói uma poética da maternidade cuja matriz criativa encontra-se na frantumaglia, que corresponde a um território movediço, pantanoso, onde um emaranhado de fragmentos de dor, advindos da infância faz emergir a complexa identidade da mãe incômoda. A genealogia feminina, deste modo, é constituída por meio de jogos de espelhos entre as demais personagens que também vivenciam a maternidade com consciência subversiva, portanto, não romantizada.
A trajetória das mulheres é marcada pelo casamento e maternidade como destinos impostos a elas, porém sem garantias de espaço para o desenvolvimento da genialidade feminina, como Ferrante problematiza. A mãe disciplinada é um dos pressupostos que a sociedade patriarcal preconiza como estratégia de manutenção da instituição familiar. A autora, por meio de variados e ambivalentes perfis femininos, rejeita o bom-mocismo em detrimento a outras subjetividades, tais como: a mãe-desiludida, a mãe-torta, a mãe-arrependida, a mãe-transgressora e a mãe-morta.
Ela analisa a presença das bonecas como um elemento do simbólico que atua como performance das ações e dos sentimentos das personagens femininas e como a autora amplia os significados desse objeto e discute o realismo de Ferrante por meio da análise de sua linguagem e da subversão ou assimilações de características do gênero Bildungsroman.
A poética da maternidade é elaborada por Ferrante desde a sua primeira obra, Um amor incômodo (1992), e ganha um contorno mais feminista, ao tratar de uma genealogia feminina na Tetralogia. Na Série Napolitana, Ferrante amplia a discussão ao trazer para o contexto da obra questões feministas do pós Segunda Guerra na Itália. A metodologia de pesquisa é por meio da literatura comparada que nos permite analisar obras literárias do passado, com as quais Ferrante dialoga, além da filosofia, história e psicanálise feministas. O cemitério criativo onde Ferrante escava as obras do passado contempla livros aqui analisados, como: Mulherzinhas (1868), Jane Eyre (1847), Casa de bonecas (1879), Uma mulher (1906), A história (1974), Perto do coração selvagem (1943), A paixão segundo G.H (1964), No caminho de Swann (1913), À sombra das moças em flor (1918), O caminho de Guermantes (1920-1921) e Sodoma e Gomorra (1921-1922), dentre outros. As contribuições de Adrienne Rich, Simone de Beauvoir, Adriana Cavarero, Hélène Cixous, Betty Friedan, Anthony Giddens, Luce Irigaray, Jacques Lacan, Sigmund Freud, Virgínia Woolf, Susan Maushart, Julia Kristeva, Tiziana de Rogatis e Stiliana Milkova nos ajuda a compreender o quanto Ferrante revisita a história do feminismo por meio das complexas relações entre mãe e filha.
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