Matheus Guménin Barreto (MT). É um poeta e tradutor. Cursa Pós-Graduação na Universidade de São Paulo (USP), onde traduz Ingeborg Bachmann, e é editor do site cultural mato-grossense Ruído Manifesto. Autor de A máquina de carregar nadas (2017, 7Letras) e Poemas em torno do chão & Primeiros poemas (2018, no prelo).
Canto de Dissolução
Sepultadas no tempo
deitam-se as coisas todas,
que já nem coisas são,
mas memória de coisas.
Sepultados no tempo
afundam-se os rostos
todos, ou quase todos,
e as datas, risos, gostos.
Sepultadas no tempo
jazem as nossas vidas,
num tempo em que não são
nem gozo nem ferida.
Sepultados, enfim,
no tempo, todos nós.
Onde não há nem feito,
nem pessoa, nem voz.
Poema do Amado para Seu Amado
“Penteei-me para o rei
Mas foi ao escravo que dei as tranças do meu cabelo”
– Ana Paula Tavares, Manual para amantes desesperados, 2007.
a)
os dentes
teus amanhecem quando me veem
e compreendo
o inerte ofício das pedras
– plenas completas alegres.
b)
a voz amanhece na tua boca
ilumina: da garganta
ruminando o que não fora dito,
inaudito, e o que se ficou por dizer
pois
a voz amanhece na tua boca
e o contorno do sol posto
fica pregado
fica pregado
nas pálpebras
fechadas de pôr do sol
c)
e tua boca anoitece
quando o silêncio pousa e faz ninho nos teus lábios
até que
então nasce outra vez
o sol
da tua garganta áspera
raia outra vez, já à espera paciente
da hora de se pôr
flor
que anoitece
– e o eclipse do corpo meu
é violento