.Campo gestão e criação em arte contemporânea

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Sônia Sobral (SP) é gestora cultural de artes cênicas. Atualmente integra grupos de estudos, pesquisas cênicas e dramatúrgicas. Colaborou para o desenvolvimento do pensamento de gestão praticado no CAMPO.

Regina Veloso (PE/PI) é graduada em Artes Visuais pela UFPI, com 20 anos de carreira dedicada à Produção e Gestão Cultural. Desde 2006 conduz prioritariamente projetos relacionados à Dança Contemporânea e Artes Integradas, realizando a produção de Marcelo Evelin/Demolition Incorporada, Núcleo do Dirceu, e de diversos projetos tendo como ambiente-sede o Galpão do Dirceu, o qual co-fundou. Desde Janeiro de 2016 propõe e faz a gestão do CAMPO, em parceria com o coreógrafo Marcelo Evelin.


A abertura do CAMPO parte de um novo momento do coreógrafo piauiense Marcelo Evelin e da produtora cultural Regina Veloso, com parceria inicial da gestora de artes cênicas Sônia Sobral (SP): um novo espaço para se pensar, fazer e difundir arte e disciplinas afins.

Foto: Maurício Pokemon

CAMPO localiza-se em Teresina – Piauí, no bairro São João, com mais de 1.500m2 de área multiuso. Um dos estúdios é o canteiro de obras da plataforma de pesquisa em arte contemporânea Demolition Incorporada, com ampla atuação e reconhecimento no Brasil e exterior, colecionando prêmios pela Associação Paulista de Críticos de Arte (2007, 2009 e 2011), pela imprensa especializada (2007, 2012, 2016), dentre outros. Os espetáculos mais recentes criados pela plataforma envolveram diretamente mais de 300 artistas, circularam em festivais e teatros brasileiros e de mais18 países em diferentes continentes, com obras geradas entre o Piauí e o mundo.

Foto: Maurício Pokemon

POR QUE SER CAMPO PARA RESIDÊNCIAS DE CRIAÇÃO?

A arte como entretenimento é mais rápida para ser feita, digerida e esquecida. Não é atribuição desta deixar legado. A arte como pensamento carece de um tempo mais parecido com o da filosofia (que cria conceitos) e da ciência (que cria definições e funções). Toda criação parte de uma necessidade e passa por pesquisa, experimentações, construção de sua apresentação, comunicação com o público, reflexão sobre essa recepção, avaliação, etc.

No caso de residências artísticas lida-se ainda mais com o tempo porque trata-se de formação, logo de aprofundamento. Esse artista está em trânsito, estabelecendo suas próprias relações e conexões exteriores, com maior ou menor agilidade e com maior ou menor visibilidade de resultados diretos.

A opção do CAMPO foi a de instigar e abrigar processos de criação, através de Residências, e ainda formular um modo de Gestão e Produção a partir de objetos estéticos e em diálogo com a comunidade.

Num sistema de arte muitas coisas são necessárias: apoio à formação, investimento em pesquisa, incentivo à produção da montagem, debates, viabilização de circulação, estratégias de comunicação e relação com público, etc. E uma coisa não é mais importante que outra. CAMPO se posiciona neste espaço de construção de pensamentos, possibilidades, pesquisas, criação.

Isso é decorrência de muitas experiências e de uma trajetória. Talvez possamos citar as Mais importantes como o Núcleo do Dirceu e a carreira independente de Marcelo Evelin, como professor e criador.

Foto: Maurício Pokemon

O espaço para Formação e Pesquisa é ainda, num sentido político, o menos valorizado dentro das políticas culturais – principalmente pela falta de compreensão da arte como conhecimento e pela ansiedade dos investidores culturais por um resultado imediato, usualmente medido nos termos de um bem material e não de um bem sensível.

As formas de mostrar e mensurar esses resultados não são as mesmas de um show, espetáculo, exposição, etc. Geralmente, só muito depois se compreende que algo que o artista está apresentando teve início ou cresceu numa residência. É difícil ver e aferir tudo que é dinâmico, porque está em constante movimento, em rede e expansão subjetiva. Nesse sentido, a relação com algumas instituições se torna mais complicada porque estas buscam “número de atendimentos” e “retorno institucional”. As respostas de processos de formação e criação são concretos e multiplicadores, mas é preciso ter olhos para ver seu desenvolvimento e/ou processo. Podemos afirmar que esta visão poucas instituições tem.

A arte que pensa e se questiona inventa novas composições, novas formas de ver, de se fazer, de ouvir e sentir, e com isso surgem novas relações entre pessoas e entre as pessoas e o mundo – inadiáveis nesse século XXI.

Aprender, pesquisar e criar são processo não-lineares, imprevisíveis, caóticos e muitas vezes solitários. Dar lugar a esses acontecimentos é a que se propõe o CAMPO.

Em janeiro deste ano, Demolition Incorporada realizou no CAMPO o TeresinaTohoku – programa de residências disparador de várias outras ações públicas, aliado a dezenas de artistas do Piauí, de outros estados e países. O grupo local de residentes criado durante o projeto segue em atividade

Foto: Maurício Pokemon

O espaço está situado num antiga filial dos Supermercados Carvalho no bairro de São João de Teresina – Piaui – Brasil. Abriga 2 estúdios e 1 escritório com mais de 1.500 m2 de área multiuso. O proprietário do imóvel apoia esse projeto assim como apoiou o Galpão do Dirceu, cedendo o espaço através de um aluguel abaixo do mercado. No entanto, IPTU cobrado pelo município é exorbitante e tem representado um grande problema.

Recentemente foram construídos e equipados, exclusivamente com esforços pessoais, 4 quartos com capacidade para alojar até 10 artistas.

CAMPO se coloca em vibração constante sobre através de que ações seguir e sobre como existir a partir de outras lógicas de permanência e sustentabilidade. Vê legitimidade na busca por um comprometimento de verbas públicas no espaço por este se dedicar ao lugar do Comum, assim como sempre escolheu não depender exclusivamente delas. É uma iniciativa privada de usufruto público. Parcerias pontuais já aconteceram, para ações específicas, desde instituições locais (por ex. Sesc – PI), nacionais (Funarte/oficinas) e internacionais (Performing Arts Fund da Holanda, Fundação Japão em SP) e principalmente de pessoas sensíveis ao projeto, compartilhando o que têm ou o que fazem como participação na construção dessa possibilidade–Campo em Teresina.

Ainda assim, a situação é de crescente instabilidade. Ausência de políticas públicas, transparentes e democráticas com que se possa dialogar e contar com. Os movimentos de articulação tem sido unilaterais e esta falta de perspectiva pode terminar um projeto que mal começou.

Foto: Maurício Pokemon

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