Homossexual Libertino e revoltado que vê na Antropologia e na Arte formas de resistência contra o fascismo. Set Genet (artista plástico) foi pensado por Marcelo Reges (antropólogo) com mais uma máscara para viver performaticamente outras experiências existênciais. Autodidata, utiliza a Arte Naïf como uma possibilidade de fugir a quaisquer regras e propor uma “arte sem inocência”, comprometida em questionar a relação dos homo sapiens com o meio ambiente (fauna e flora), a sexualidade e o inconsciente. Iniciando sua carreira 2017, suas obras já foram expostas em vários eventos no Brasil. Recentemente foi premiado no Edital Arte como Resprto – Itau Cultural 2020 – Categoria Artes Plásticas/Desenho com uma obra voltada para pensar a situação de isolamento e solidão imposta pelo Pandemia do Covid 2019.
A função primária da comunicação escrita é facilitar a escravidão.
C. Levi-Strauss
Nada mais subversivo, assustador e limitante do que um autorretrato. Qualquer interpretação da realidade, seja escrita, pintada ou filmada é apenas uma versão escravizada do que foi o artista.
Eu falo de mim como quem sonha. Sem pressa e querendo conquistar muito mais gente do que mereceriam ser agradadas. Rebeldia? Arrogância? Narcisismo? Um pouco de tudo. E apenas um ato revolucionário que grita muito de mim. Falar amplificadamente do Viado que se fez tantas coisas. Um pouco antropólogo. Um pouco artista. Libertino. Uma bricolagem inconsciente de tantas máscaras eloquentes. Falar da minha arte é recompor este cenário caótico que é desafiador para a juventude medíocre que cria pequenos oratórios para Youtubers e afins. Sim, não tenho vergonha da arrogância. Acho elegante e demasiado necessário um pouco de empáfia. Sou destas!
Desenhar é preciso. No silêncio surgido das homofobias diárias o “pequeno ladrão” roubava na escola giz de cera, lápis de cor e canetinhas coloridas dos colegas. Tudo que pudesse torná-lo um grande Xamã. A arte nada mais é do um contínuo ritual de se vestir com as rendas e os cetins que melhor lhe adornarem. Estes breves segredos vou deixar escapar só para vocês.
Na minha infância o silêncio se convertia em desenho. Vestidos para as mulheres de “O Vento Levou”. O Viado Estilista. Tatuagens carinhosamente compostas na pele queimada do meu pai. Feitas com caneta Bic enquanto ele desmaiva soturno depois da jornada exaustiva na Empresa Onogás. Todos na família falavam: – Este menino vai ser artista! A virtude derradeira que poderia amenizar a mariquice. Naqueles tempos imemoriais. Quase míticos mesmo com a precariedade desta narrrativa. Desenhava com tudo que era preciso e permitido. Não havia porra o bastante e ainda não era tão criativo para desenhar com sangue. Roubava os cacos de giz da aula. E desenhava os rostos dos santos no muro da nossa casa. Minha mãe ficava satisfeita com o “menino de fé”. Mas, o deus tinha morrido e não haviam me convidado para o velório. Eu nunca fui chamado para o sepultamento. Acho que vi um santinho de sétimo dia com uma foto feia. Pensei: – Teria feito melhor! E, nestes rememoração, o bruxo que era abortado por mim mesmo se via na cidade mórbida. Na feiura urbanamente precária de uma Anápolis de tantas misérias. De tantas Igrejas feias. De tanta gente medíocre e sem graça. A única vida para aquele feto molenga sujo de merda e sangue era escorrer para sarjetas mais dignas!
O Natimorto não morreu. Desafiou o mundo que sempre insistiu em ecoar: Maricas! Com Sant Genet ele escolheu dormir na calçada e ficar a espreita. Fazendo parte dos sem-lugar. Foi estudar na Universidade Federal de Goiás e na Universidade Federal de Santa Catarina. Neste tempo adormecido a arte morreu. Ele tinha que viver. Comprar pão e, quem sabe, adquirir algo prestigioso na liquidação da Colcci. A Antropologia personificou uma Musa que o lambeu carinhosamente. Limpou a merda e o sangue. Ninou aquele corpo sem ossos. Sem brilho no olhar. Cantou canções de ninar antigas dos tempos que os deuses andavam pela terra e trepavam com todo tipo de gente comum. Ele acordou. Não se fez de rogado. Fudeu com a Antropologia. E no nascimento da Cultura, o ápice da benção incestuosa, nasceu Marcelo Reges Pereira. Nome dourado que eu vi duas vezes voando em um TCC e em uma Dissertação simploriamente medíocres. Mas, rezadas e agradecidas com todas as benzeções necessárias para conseguir outras dádivas. Feliz. Agora tem como ir ao supermercado sozinho. Comprar um carro usado. E peregrinar pelo mundo como um iniciado nos mistérios mágicos da “Ciência da Alteridade”.
Na antropologia, não vi todas as grandezas das máscaras de Boas ou as selerepes e descontraídas alusões de Levi-strauss aos desenhos Kadiwéu. Todo o caminho se fez de conversão. Para provar a dignidade de ter um canudo. Um mero e entristecido trabalhador. Fumar maconha em homenagem a Pachamama. Dançar a psicodélica vida adulta em mais uma trance.
As desilusões da militância se personificaram cada dia quando levava tapas na cara. Apanhou tanto que as lágrimas desciam quentes. Lava. Vulcão. Fúria. Nunca mais seria: o Viado. Agora era O Senhor Mestre Viado! Batia com a mesma paixão que apanhava.
Aos poucos se via um bígamo confesso. Apaixonado pela Antropologia e pela Arte. Mas, deste tipo de bígamo safado. Sem escrupulosos! Aquele que trai as escondidas. Tenho um prazer doentio e sórdido em salientar que engano as duas e que elas fazem o que eu quero. Tenho comidinha pronta quando chego em casa. Roupa lavada. E gozo! Ah, como gozo! Reencontrar o amor de infância se revelou uma epopeia. Recomeçou na tatuagem. Perfurar corpos lhe dava um prazer divinizado. Mas, poucos queriam comprar seus desenhos. A paixão era pela caretice. Coraçõezinhos. Ancoras. Pequenas vinganças que saiam um pouco tortas. Mas valiam o dinheiro da promoção. Marcar os corpos parecia uma aventura da década de 80. Remarcar preços em produtos que aumentavam de preço voluntariamente. Ainda não havia aventuras. Agora era um viadão realizado com Mestrado e tudo. Fora até tatuador. Podia se dar ao luxo da putaria. Podia se render aos pênis voadores.
A reconciliação definitiva com a Amante Fiel viria com a reinvenção de si mesmo. Minha arte portanto, é feita de traições. Negando a Deus e deuses. Rezando para todo tipo de esperança satânica que desafia o tempo e espaço. Ser artista é profanar gozando dentro. Meter sem dó. E, meu processo criativo nasce da personificação deste libertino revoltado.
Desenhar. Pintar. Atos revolucionários. Maneiras de contestar o mundo. Grito num binarismo eloquente: – Pirocas e bucetas são Revolucionárias! Por isto, como um ato desafiador, não quero estudar arte. Não, não quero. Um Naïf feliz! Quem sabe E. Rousseau comeria meu cu? Desenho como quem denuncia todas as perversões que brincam dentro de mim, gozando ora como Sade ora com qualquer romântico apaixonado que tenta imitar Oscar. Um idiota pomposo que tenta ser erudito para comer os desavisados! É verdade. Despretenciasamente demais para que os transeuntes preocupados com a última atualização do Facebook possam entender.
Um artista que produz para agradar a si mesmo (interessante que sem querer acaba agradando todo tipo de gente0. Entretanto, como um bom sádico, desdenha vigorosamente des admiradores que ousam analisar sua arte. Com um ar sarcástico e de nojo prefere que elogiem subservientimente. Bajulações são bem-vindas! Na minha floresta os pássaros cantam no compasso da minha batuta!
Quem quiser entender a arte de Set Genet tem que se sujeitar a lhe oferecer o gozo em apogeu. O tipo de gente que não é fácil de encontrar. Por isto, prezadas e prezados interpretes que perderam tempo lendo este breve manuscrito para entender o artista, saibam que para isto, é preciso rememorar seu último orgasmo. Sim, aquele que você tremeu!? Isto é o que sinto na minha arte. Gozo. Aquela felicidade marota de gozar na cara de vocês. E, não me importa se vocês gozam ! Não, não me importa. Eu vou gozar e saber que toda porra contem pequenos fragmentos de mim. Pegajosos. Vocês vão lavar. Lavar. E, lavar. Mas, no outro dia sentiram aquela desconforto e espetadinhas na pele. Seco. Lembrarão saudosos que eu gozei. Não contenho os risos escrevendo estas besteiras. Coisa de gente depravada. Uma pessoa que se reinventou na tinta e no papel. Simples. Não há o que entender. Gozo não se entende, se goza.