Emicida é o cara, tá ligado?

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Por Francisco Magalhães

Assistam, com urgência urgentíssima, o documentário “AmarElo – é tudo para ontem”. É um concerto filme: são gravações em estúdio e conversas e depoimentos e trechos de um show ao vivo do compositor Emicida no teatro municipal de São Paulo.

O conteúdo é uma provocação em forma de aula -instigante/inquietante/imprescindível – sobre a minha, a sua, a nossa cultura negra do início da história do nosso país até os dias de ontem.

Nela, aprendemos, e muito, sobre a nossa ancestralidade negra e a a genialidade de Pixinguinha e Ruth de Souza, Abdias Nascimento e Lélia Gonzales, entre outros heróis e heroínas da raça brasileiras, como Johnny Alf e Wilson das Neves, Wilson Simonal e Paulinho da Viola.

E tem o Samba como fio condutor da história da cultura negra nesse Brasil de mãe Preta e pai João sofrendo e resistindo (agora e sempre) ao racismo estrutural trazido nas caravelas portuguesas.

Ah, e chama atenção o fato de muita gente da plateia nunca ter pisado antes no chão daquela casa de espetáculos. Sim, vossas excelências vocês todos, o Brasil precisa ouvir o que têm a dizer e contar a música de Emicida, Baco Exu do Blues, Rashid, Projeto e muitos outros rappers cantando o bem e as mazelas das quebra das periféricas de nossas cidades.

Contando com participações de Fernanda Montenegro e Zeca Pagodinho, Larissa Luz e Dona Onete, Ibeyi e Marcos Valle, Fabiana Cozza e Drik Barbosa, Pastor Henrique Vieira, MC Tha e muitas outras, AmarElo tem, entre outros vários momentos de alta voltagem estética o max mix do ritmo do rap (Ritme And Poetry, lembra?).

Vamos a alguns: “Ismália” de Alponsus de Guimaraes, os girassóis do poema “Pensão Familiar” de Manoel Bandeira, além do poema de Paulo Leminski: “Amar é um elo / Entre o azul / E o amarelo”, de onde foi tirado o título do recital.

Leia também:  Tesouro de Harmonia

Uma dica: após assistir o concerto filmado pelo Emicida, leia dois livros. 1º) Escravidão, primeiro volume da triologia de Laurentino Gomes e 2º) Um Defeito de Cor, um romance de Ana Maria Gonçalves.

Faz-se necessário ressaltar o produtor musical “Nave” conectando os sons de Emicida com a sonoridade de instrumentos antes ausentes em seus trabalhos. Cito de memória os tambores africanos, o soul e a bossa nova. Eita, ia esquecendo do auxílio luxuoso do piano de Marcos Valle.

E é difícil não chorar com duas cenas impactantes.

A primeira é a presença entre os espectadores do show de alguns dos fundadores do Movimento Negro Unificado, que realizaram, em 1978, o primeiro ato da entidade nas escadarias daquele mesmo teatro.

A segundo é ouvir Emicida, Plabo Vittar e Majur cantando como um mantra a cantiga “Sujeito de Sorte” do compositor cearense Belchior, onde ele cita na letra o poeta do absurdo Zé Limeira no refrão antológico: “ano passado eu morri, mas esse ano eu não morro”.

Pós-estreia, a pandemia interrompeu a possível turnê e o the end é com as ruas de São Paulo vazias e o rosto lindo de Marielle Franco, umas das mais recentes reencarnações de Esperança Garcia.

O didático filme dirigido por Fred Ouro Preto foi o evento político mais importante de 2020. Assista para discutirmos sobre essa minha opinião.

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