4 Poemas de Franck Santos

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Franck Santos, escritor/poeta maranhense, libriano com ascendente em peixes (talvez por isso goste tanto do mar), 52 anos, escreve para extravasar a solidão. Tem cinco livros publicados nos gêneros poesia e romance.


Eu Prefiro Regar as Plantas

Leio que Marte e Saturno estão se alinhando no céu
Que Júpiter está cada dia mais próximo.
Penso que enquanto os planetas se conectam
Nos hemisférios tudo é vermelho
Deito no chão da casa quase em desespero e sinto falta de um dia de janeiro
Quando fazíamos coisas mais divertidas.
Nesses dias de tédio e readaptar-se à casa
Trajetos curtos
Repetir assuntos por telefone
Olho a planta baixa da cidade
As rosas que desabrocham no jardim
E prefiro regar as plantas
Mesmo que a loja de discos feche
Porque do sul um amigo canta Maria Bethânia pra mim
Recita um poema
Enquanto as vozes silenciam no rádio e na vizinhança
E nos permitimos essas pequenas fugas.


Banho de Mar

Imóvel na sua cadeira de rodas
Mamãe disse que queria um banho de mar.
Pensei nos afogados
Dizem que são os olhos o primeiro elemento do corpo que se desintegra.
Envelhecer é chorar com o corpo todo?
Mesmo um corpo imóvel?
Mamãe queria um banho de mar
Pensei nos piratas que enterravam os prisioneiros até o pescoço na areia da praia.
E essa sua imobilidade de prisioneiro, mãe?
Você que já foi ave de folego
Que me fascinava com sua capacidade de resistência aos longos voos
Ou atravessar rios a nado.
Agora se contenta com um banho de chuveiro.
Nos seus olhos de pupilas castanhas, não irão nadar enguias,
Há coisas da ordem da superfície
Há coisas da ordem das profundezas.
Feito os sonhos que você repetidamente vive.


Cena 6:

Desde o ano passado cuido dos cactos, da pitangueira e do jardim.
As lagartas comeram as rosas e as abelhas não aparecem mais, dizem que elas têm
um radar nas asas e nos cérebros.
Dentro da casa silêncio: perfeito, completo, permanente branco.
Na cama eu e a gata, imóveis,
mas ainda há espaço para o amor, para meus cabelos que são brancos desde os
vinte e poucos anos,
para os machucados nos dedos dos espinhos das roseiras e das ervas-daninhas
o tempo outro fosse eu cobriria com babosa macerada e mel.
O jardim explode em brotos e ainda nem iniciaram as chuvas, a gata olha em silêncio
os passarinhos que não mais voltaram, como as abelhas e os beija-flores.
Desde o ano passado ouço estalar de asas no lado esquerdo do peito
meu corpo é uma lâmina afiada de cartilagens, mas continuo acreditando em
ossos, sonhos, verões, mar e felinos.
Desde o ano passado dentro de casa tudo é branco.
Dentro do jardim nenhuma estação definida.
Dentro de mim quase vermelho.


Do Lugar Onde Estou já fui Embora
“Logo, sou/O menino que abriu a porta do Zoo”
(Gilberto Gil)

Na série ‘Big Ben- A teoria’
O personagem de Jim Parsons disse que teria uma tartaruga, como animal de estimação
Que tartaruga seria menos rápida que ele numa fuga
Não tinha pelos
Nas festas a fantasiaria de paralelepípedo.
Pensei nos animais de estimação e porque as pessoas os escolhia
Minha mãe teve um bezerro
Ficou cuidando dele quando a mãe do mesmo morreu no parto
Os vizinhos se incomodavam com sua dedicação
E o ápice foi quando o bezerro entrou numa casa e estragou o jantar de uma família derrubando louças.
Um amigo tinha um zoológico no quintal com papagaios, bicho preguiça, macaco,
Até ser denunciado
Não tinha autorização para tê-los.
Uma amiga de uma amiga tinha cobras no apartamento, entre plantas,
Um dia descobriu uma das cobras, talvez faminta, engolindo outra.
Há quem adote coelhos, ratos brancos, peixes, calopsitas
Alguns animais exóticos.
Tive vários gatos até nos perdermos uns dos outros
Um era quase sombra
Outro subia no carro porque gostava de brisa
A gata Tulipa ficava comigo na cama silenciosa e imóvel.
Não tive nenhum cão
E saio decidido a recuperar meus bichinhos de estimação
Como os velhos que passeiam sob o sol de domingo
E falam dos seus netos, das suas dores e máquinas de lavar roupas.

1 comentário em “4 Poemas de Franck Santos”

  1. As poesias do Franck Santos são sinestésicas, cheias de músicas, com gosto de um amor visceral, saudosas, penetrantes, oceano em chamas, tempestades no olho do furacão.

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