6 Poemas de Divanize Carbonieri

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Divanize Carbonieri é doutora em letras pela USP e professora de literaturas de língua inglesa na UFMT. É autora dos livros de poesia Entraves (Carlini & Caniato, 2017), Grande depósito de bugigangas (Carlini & Caniato, 2018), A ossatura do rinoceronte (Patuá, 2020) e Furagem (Carlini & Caniato, 2020), além da coletânea de contos Passagem estreita (Carlini & Caniato, 2019).


COURAÇA

gorda como um baobá
que guarda toda água boa
na grande barriga grossa
gorda como um balaústre
abaulado na cabeça
e base e no meio um globo
uma coluna grega que
sustenta o teto da casa
sobressaindo na cena
baú trancado no sótão
contém trastes ou tesouros
outros segredos de estado
uma basílica branca
imensa catedral gótica
com as gárgulas aladas
sabe gargalhar a gorda
na cara dura do insulto
calando tal dor na carne
escarnece sobranceira
tanto ódio lhe deu couraça
goma tesa em sua casca


GLUTONA

o corpo grande campo de pouca monta
uma mulher será antes de tudo um corpo
e uma mulher gorda será um corpo grande
campeando como gado em pasto calmo
partes inchadas de seu corpo assomando
amontoando-se encharcadas de sangue
esperma chacoalhado sobre as carnes
como incomoda demais a mulher gorda
porque é grande como a ampla copa de árvore
miúdas devem ser todas as domadas
mulas amansadas mais éguas montadas
para o manejo dos campos e das camas
mas algumas são monstruosas enguias
a sela escorrega no limo do dorso
medusas gigantes engolindo a paz
a voraz garganta glutona pastando
no vórtice em espiral do mundo cão


REDOMA

eu que fui sangrada pela espora
do seu coturno me rasgando as ancas
ainda trago as feridas nos flancos
a mão que tanto golpeou tenta afagar
mas afasto o retorno a qualquer pastagem
agora saiba sair da frente enquanto passo
paciência se eu não for cordata e meiga
tenho espinhos enfiados na garganta
cuspo fora alguns quando me afogo
dentro da redoma circula a pantera
sacudindo a terra com suas patas negras
se alguém bate no vidro ou na grade
ela salta cheia de dentes e garras


DANÇA

tanta poeta suicida patinou nessa senda
como posso pensar em me manter de pé
semear com pedras o seio seco do arroio
a haste mirrada da espiga ressequida
árido piso de troncos ocos e retorcidos
muito ansiada gota que não mais sacia
resta ascender ao patíbulo como todas as
outras arrastando amarras e mordaças
atirar-me súbito do cadafalso para
oscilar no nada pendurada pelo pescoço
uma elipse desenhada com as pernas
última dança na letal encruzilhada


AGONIA

desmembraram a euforia
deceparam a epifania
seviciaram a autonomia
evisceraram a alegria
enquanto matavam janaína
augusta epifânia maria
estupraram edivânia
joaquina carolina dionila
enquanto estrangulavam
juliana virgínia domitila
o ácido assobiou na pele
o álcool cantou na carne
a faca perfurou o tronco
a trave atravessou o reto
sobreviveu só a agonia


BOLHA

a garra na jugular
na mandíbula o denso sangue
gritando entre gorgotões
socorro que ninguém ouve
ninguém socorre a menina
sempre tão manuseada
está sendo esfaqueada
mas não se vê
só o sopro da existência
se segura nesse corpo
tão fino quanto a película
de uma bolha
quando explode o que sobra
são acordes estridentes
de uma música que não para

3 comentários em “6 Poemas de Divanize Carbonieri”

  1. Sua poesia dilacera! Apenas os primeiros versos na sequência dos poemas: “gorda como um baobá”/ “o corpo grande campo de pouca monta”/ “eu fui sangrada pela espora”/ “tanta poesia suicida patinou nessa senda”/ “desmembraram a euforia”/ “a garra na jugular”.

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    • Os versos de Divanize Carbonieri asseguram a beleza extraida do corpo mulher que se movimenta entre a vida e a dor da vida. Sangue na poesia. Vitória do feminino que teima em ser música enquanto a violência impõe a estridência. A delicadeza sobrevive entre o corpo ferido e a voz da poeta.

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