Armando Liguori Jr, 56 anos, nascido e morador da cidade de São Paulo. Ator e Jornalista de formação. Publicou os livros: A POESIA ESTÁ EM TUDO – Editora PATUÁ 2020, TERRITÓRIOS – Editora SCORTECCI 2009 e um de dramaturgia: TEXTOS CURTOS PARA TEATRO E CINEMA (2017) – GIOSTRI. Escreve, adapta e atua em espetáculos da CIA OS TIOS (da qual é um dos fundadores). Atualmente está no YouTube (canal Armando Liguori), lendo um montão de texto bonito que tanta gente escreveu.
Os quatro primeiros poemas são do livro A POESIA ESTÁ EM TUDO lançado em 2020 pela Patuá. Os demais são inéditos.
Todo mundo lê poesia
O deputado leu um poema.
Não entendeu, e ainda achou despudorado.
Disse preferir os clássicos
(Na certa deve ler Castro Alves, todas as noites, antes de dormir)
O vereador leu um poema
Não entendeu, e ainda assim, achou inverossímil.
O prefeito leu um poema
E achou precário, mesmo sem entender lá muito bem.
O juiz não leu um poema.
Disse que prefere biografias,
Mesmo não lembrando a última que tenha lido
O presidente não leu nenhum poema
Justificou, dizendo que era muita coisa escrita.
O trabalhador não tem tempo para ler poemas.
Mas, se tivesse, entenderia que poesia não é coisa só de se entender.
É mais.
É o que tem para o momento.
No principio era…
E nunca mais foi.
O vazio se encheu
Quase transbordou.
Depois veio o HAJA
E outro HAJA. E houve.
E depois, FAÇA-SE…
E era uma desfaçatez
O tanto que tinha pra fazer.
E foi um DISSE isso,
DISSE aquilo, DISSE também.
E a coisa foi acontecendo.
Tá certo que demorou uma eternidade,
Mas em sete dias estava pronto e acabado.
E foi assim. É isso.
É isso o que tem para momento.
Não gostou? Faz outro você.
Senão aproveita. Daqui a pouco pode não ter mais.
Sabe como é?
A vida é um tá aqui, já foi.
Volta, mas não chega.
Sobra e ainda falta.
Mas até que tá durando,
Considerando quem tá cuidando!
Manifesto pela delicadeza
Pessoas andam brutas.
Usando palavra como faca,
Não como afeto.
É coisa de gente fraca.
Insegura.
Que se esconde por trás
Do que fala.
A vida pode ser mais delicada.
Pra que usar tanta palavra
De forma errada?
Amor
Para uns o tempo passa
E ele ainda conserva sua bossa.
Uns dizem que sem ele
Não passam.
Outros reclamam que ele é
Só desgraça.
Tem aqueles que adoram o perder,
Pra curtir uma fossa.
Dizem alguns que dele,
Um pouco já basta.
Tem quem pense que todo amor do mundo
Ainda é pouco e, outros, que amor é coisa de louco.
Alguns já estão de amor até o pescoço.
Uns dizem que amor só vale enquanto há troca.
Para muitos só quando tem beijoca.
Alguns nem imaginam onde o amor desemboca.
Mas numa coisa todos concordam:
AMOR gostoso de verdade é paçoca.
Ode ao copo de requeijão
Requeijão é bom
Vai bem com tudo
Principalmente com pão
Mas, requeijão também termina
Já o copo…
Não sai da nossa vida
Copo pra toda ocasião
Pra dia de nada
E pra dia de festa
Cabe tudo no copo
Que era de requeijão:
Chá, café puro ou com leite,
Água, refri, suco, vinho
Cerveja, champanha
E pinga
Copo democrático
Sem preconceito
Pra gente de casa
E pra receber visita
Seu inventor merecia um quadro
Na parede da sala
Aqui todos os copos são de requeijão
E, ainda assim, brindamos
O som dos copos batendo
Não é de fino cristal
E, ainda assim, brindamos
A transparência não é
Brilhante e refinada
E, ainda assim, brindamos
Então, terminando essa ode ladina
Fica aqui minha singela homenagem
Ao objeto mais brasileiro e ordinário
De todos os tempos
Um brinde ao copo de requeijão
(com copos de requeijão)
Minimalista sem alça
Era um mala.
Sem alça.
Male, male,
Todos somos
Mas lia
Mallarmé
Então
Um mini
Mala
Mini
Malista
Sem alça.
Nenhum poema é inocente
Alguns poetas podem até ser
Mas nenhum poema é inocente
Há sempre um escorpião
Adormecido entre os versos
Pesando sobre a pele da página
Nenhum poema é inocente
Alguns leitores talvez
Mas nenhum poema é inocente
Sempre ficará uma dose de veneno
No sangue de quem lê
Açougue de Deus
De carne somos pedaços
Vivos
E ainda assim
Pendurados em ganchos
Sangrando sobre o ralo
Somos o que apodrece
Carne que o tempo mastiga
Mas não engole
Cospe
E a grande discussão é rasa:
Quem é filé mignon?
Quem é alcatra?
Quem é colchão duro?
E assim a vida passa
Nesse açougue de Deus.
Merecem ser lidos. Conheço e acompanho seu trabalho e publicações.
Muito bom te ler aqui, Armando. Parabéns à revista pela escolha e a você pela beleza dos poemas.
Armando é um poeta exemplar. Merece sempre mais divulgação.