.5 Poemas de Ademir Assunção

| |

Ademir Assunção é um dos editores da revista COYOTE. Autor dos livros TEMPO INSTÁVEL NA TARDE DOS ANJOS DESOLADOS (poesia),edição do Centro Cultural São Paulo (2011);a VOZ DO VENTRÍLOQUO (poesia), Edith Editorial (2012); FARÓIS NO CAOS (entrevistas), Sesc Edições (2012) e O CAIO E O CUIO (infanil, 2013).


O Anjo do Ácido Elétrico

o anjo sujo, esfarrapado
              remela nos olhos
cabeça feita
             bate as asas sob o céu lilás
:
luas se dissolvem
             (comprimidos de sonrisal
na fornalha da noite)
             música que não cessa
minha mão dentro da sua
             veias são nervuras
golfinho saltando
              na pele das costas
vênus vestindo
             um manto de água
a ninfa chapada
             de olhos elétricos
cores girando
             no abismo sem fundo
dança de estrelas
             no teto da sala
dois sóis em cada ontem
             três vozes
na voz de quem cala


A Vertigem do Caos

um estranho entre estranhos, nômade
entre escombros, procuro sem
procurar, um não-lugar, o ventre
de látex de uma replicante quase
humana, as ruínas enfim apaziguadas
da bombonera, as águas que refluem
pra dentro da baía de todos
os infernos, ali, onde a eternidade
são os dentes de estanho do último sol
mastigando oceanos como fatias
de pizza, lançadas ao ocaso
do fundo de um naufrágio, ante
a dança misteriosa de um feiticeiro cherokee

Leia também:  .2 Poemas de MICHELINY VERUNSCHK

A Canção dos Peixes

submersos
nas funduras

(de onde
alma alguma
retorna)

entre algas
rochas e restos
de naufrágios

cegos
e sem memória

os peixes
cantam
seus blues

canções inaudíveis
de um tempo
sem tempo

que ninguém
(nem coltrane
nem hermeto)
pode ouvir

em lugar algum


A Volta do Anjo Torto

no canto da sala a TV ligada
                o pastor gritava
a bolsa despencava
                as contas vencidas
as batatas queimadas
                o dólar subia
o poeta pirava
                “meu deus, como pode
tanta merda enlatada?
                 que gente mais troncha
que vida fodida
                 quer saber
dessa noite não passa
                 ou pulo do empire state
ou me torno um homicida”
                 mas eis que um anjo torto
aquele mesmo, com asas de avião
                  entrou pela porta
um baseado na mão
                 bateu as duas asas
e foi logo dizendo:
                “sai dessa, poeta
para de punheta
                 vive a vida, desencana
come sua mina, segue seu rumo
                  o real é a ilusão virtual
dos que batem a cara contra o muro”

Leia também:  Morcego - Um Conto de Nelson Maca

Sol Negro & Cabeças Cortadas

tenho gritado raios elétricos, chuvas
que não passam, maremotos, tremores e ruínas

grito: e meu grito ilumina
toda a cidade de campinas

grito: e meu grito desespera
todos os torcedores da ponte preta

grito: e o sol rola em slow motion
como uma cabeça tarahumara, em direção ao gol,

deixando um rastro de incêndio no gramado

Deixe um comentário

error

Gostando da leitura? :) Compartilhe!