.“Fio condutor: fragmentos de um processo criativo”

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Laura Castro (BA) é escritora de bloquinhos e autora de “Fio Condutor” (2013). Mais informações sobre o processo criativo do “Fio condutor”, acesse: www.fragmentosdeumfiocondutor.blogspot.com


1. A novela ficou ali escrita, nos fragmentos de um bloco de notas, meses. Já sabia do título, antes dela vir. Fio condutor, essa metáfora de fiar um texto, de ir costurando memórias inventadas, já estava ali, no desejo de criar.
2. Pela extensão que ficou o texto, já todo transcrito e modificado para o processador de texto do computador, nomeei de novela. Chamamentos sempre provisórios; quase nunca me encaixo neles. Gosto, entretanto, da provocação, e decido manter. A todo tempo chamo “a novela Fio Condutor”… eu mesma que escrevo meu release e participo, assim, de todas as etapas de produção do livro. Escritora, editora, produtora. Isso é ser independente? – me pergunto.


3. Antes de escolher tecidos, orçar metros e metros de zíper, alinhavo o enredo: Marielena, narradora-personagem, recorre a Ed, um editor de imagens, para editar suas memórias.
4. Está lá o arquivo, intitulado “fio condutor – texto final”. O livro, contudo, sua edição, sua materialização, segue outros passos, pradianti do processo criativo, que não acaba quando do texto finalizado. Um passo que dou junto com meus parceiros criativos, no âmbito do projeto gráfico e diagramação.
5. Divido a novela em três flashes, sem ordem pré-estabelecida: caligrafio, decupagem e reedição. Faço testes, produzo um material visual, das bonecas que eu mesma produzo sem grandes pretensões.


6. www.fragmentosdeumfiocondutor.blogspot.com crio um blog, que passa a ser um pequeno inventário de processo. Estão ali pistas e peças visuais que servem mais tarde para a identidade visual do projeto gráfico e são incorporadas também aos objetos que compõem a instalação final, a saber…
7. Descrevo assim o projeto todo de nome homônimo: Processo de edição da novela FIO CONDUTOR e de desenvolvimento de livros-objetos e engenhocas de leitura que serão instaladas em bibliotecas públicas da cidade de Salvador. Processo coletivo de criação da datilógrafa Laura Castro com Cacá Fonseca, Clara Pignaton, Tiago Ribeiro, Flávio Flos Oliveira, Pedro Britto e Fabiana Marques. Se desdobra a partir de uma narrativa atravessada pelo princípio do corte, onde a personagem-narradora recorre a um editor de imagens para editar suas memórias. {sic}
8. Sento com Cacá Fonseca, uma das (amigas) artistas convidadas para desdobrar a novela em uma instalação, intitulada mais tarde de “Ilha de Ed”. Cacá e Clara Pignaton pensam comigo em soluções gráficas para a transposição da novela em livro. Elas são as responsáveis pelo projeto gráfico e criamos, juntas, a concepção da publicação. Pensamos em como “resolver” o texto nas peças gráficas. Optamos por um objeto integrado, um pedaço dentro do outro, acompanhando por um fio {a reedição}, que enlaça um papel kraft caligrafado {o caligrafio}; dentro dele um bloquinho de papel jornal {a decupagem} é guardado.


9. As três peças gráficas assumem materialidades e feições diferentes. O fio da reedição é feito com serigrafia sob o tecido de linho vinho, trabalho realizado por outros artistas parceiros do projeto, Flávio Oliveira e Tiago Ribeiro. Criamos um tecido cuja marca principal, visualmente falando, é o vestígio de uma edição, do personagem Ed.
10. Fazemos todo o trabalho de diagramação do texto, impressão da tela e do tecido no ateliê coletivo da Sociedade da Prensa, num casario da Rua Direita do Santo Antônio Além do Carmo, bairro histórico de Salvador, onde moramos. O coletivo Sociedade da Prensa, do qual nós todos fazemos parte, surge com o desejo de barateamento da produção gráfica, com soluções alternativas e criativas para a edição de livros, impressão de cartazes e outras artes. Em Salvador, particularmente, ainda temos um parque gráfico tímido e que nos dá poucas opções de preço e de serviço. A Edtóra surge, dentro da Prensa, como um selo editorial de produção autônoma, cooperativa que tem o objetivo de fortalecer e fomentar o livro e a leitura na capital baiana, bem como incentivar a produção de escritores locais.
11. O caligrafio, eu mesma produzo, depois de alguns testes. A opção pelo manuscrito é imprimir no texto um corpo e experimentar a caligrafia como fio, em termos visuais da palavra ali grafada. Com a mão produzo rastros na escrita. Digitalizo para depois passar pra gráfica de João Pará, que fica ali na esquina do bairro.


12. Enquanto isso… Vovó Tala, Clara Niglio, vizinha de quitutes e bordados, costura a capa do livro….
13. A decupagem traz a decisão mais radical. Optamos pelo papel jornal e depois decidimos colar não apenas um dos lados desse pequeno bloquinho que vem dentro do caligrafio, mas os dois lados. Desejamos, assim, pôr o leitor numa posição de violador de memória, tal qual se desenrola o enredo do “Fio Condutor”, de Ed para Marielena. O livreto, portanto, fica sob o risco do rasgo – já que o corte foi uma metáfora tão cara a essa narrativa – e mesmo do desparecimento do livro, seu esfacelamento, sua profanação. Um experimento radical, um experimento. Assim como a capa-bolso, que abriga os fragmentos do fio condutor

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