3 Poemas de Amanda Vital com Tradução para Catalão de Josep Domènech Ponsatí

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Amanda Vital é editora-adjunta da revista Mallarmargens, mestranda em Edição de Texto pela Universidade Nova de Lisboa e estagiária na editora Ponto de Fuga. Autora dos livros de poemas Lux (Penalux, 2015) e Passagem (Patuá, 2018) e da plaquete Perspectiva, publicada pela revista Mirada (2020). Tem poemas e traduções em revistas, jornais e suplementos literários do Brasil e de Portugal, além de publicações em antologias. Foi uma das curadoras da 4ª edição da coletânea Carnavalhame (2020) e participou, junto da revista Mallarmargens, da organização do “9º Raias Poéticas: Afluentes Ibero-Afro-Americanos de Arte e Pensamento”, apoiado pela Câmara Municipal e pela Casa das Artes de Famalicão, em Portugal, com curadoria de Luís Serguilha, Marcelo Ariel e Nuno Rau. Organizou e editou antologias através do selo da revista Mallarmargens.


repuxo

me custa olhar na cara de um estranho: olhos à
frente dos olhos: difícil sustentar um olhar que
pode abaixar os olhos ao meu corpo a qualquer
descuido da cabeça. difícil confiar os olhos aos
homens por segundos breves sem que eu entre
em parafuso pensando o que será que pensa de
mim esse homem. é um esforço até mais físico
do que mental uma força corpórea que me exige
tanta serenidade me exige fechar desconfianças
dentro das glândulas lacrimais em três voltas de
chave com o corpo de costas contra a porta. me
custa abrir-lhes a boca e ceder-lhes meus dentes
com uma vontade despretensiosa de só conviver.
mas a vida insiste no risco um desespero danado
aos poucos rasgo uma fresta nos lábios eu deixo
os braços desarmados a postos para dar um tapa
nas costas de alguém e dizer: opa meu camarada

estrebada

em costa mirar a la cara d’un estrany: mirar-lo
de fit a fit: se’m fa difícil aguantar una mirada que
pot abaixar els ulls fins al meu cos al més petit
descuit del cap. se’m fa difícil confiar els ulls als
homes durant uns breus segons sense perdre
els estreps pensant què será el que pensa de mi
aquest home. és un esforç fins i tot més físic
que mental una força corpòria que m’exigeix
molta serenitat m’exigeix tancar desconfiances
a dins de les glàndules lacrimals amb pany i clau
amb el cos girat d’esquena cap a la porta. em
costa obrir-los la boca i cedir-los les dents amb una
voluntat discreta de voler conviure en pau i prou.
però la vida s’entesta a posar-se en risc un gran
desesper a poc a poc obro una escletxa als llavis deixo
els braços desarmats a punt per ventar un copet
a l’esquena d’algú i dir-li: ei, company, com anem


criação

na casa com cheiro de gato que já se sente da porta
minha mãe varre bolas de pelos sobre tacos antigos
de madeira desgastados as cerdas ressoam rítmicas
da copa ao último quarto à esquerda minha mãe faz
filhotes de mentira com os pêlos misturados na mão
em laranja preto branco cinza bege e marrom escuro
enquanto a vassoura descansa encostada na parede
minha mãe vai fazendo as orelhas o rabo as patinhas
deixa um a um sobre a cama lotada mesmo sabendo
que não dura inteiro nem quinze segundos entre eles
até espalharem tudo pelo chão outra vez restaurando
o estado original da natureza daquela casa para mãe
é um ritual de delicadeza e de graça juntar um pouco
de todos os gatos e fazer cabê-los – sobre suas mãos
a vassoura descansa e mãe é um pouquinho de deus

creació

a casa amb una olor de gat que ja se sent des de la porta
la meva mare escombra manyocs de pèl sobre un terra
de fusta desgastada les pues ressonen rítmiques
del safareig a l’última habitació a l’esquerra la meva mare
fa cadells de per riure amb els pèls barrejats dins la mà
de color taronja negre blanc gris beix i marró fosc
mentre l’escombra descansa recolzada a la paret
la meva mare va fent les orelles la cua les potetes
els posa d’un en un sobre el llit ple fins a dalt tot i saber
que no duren sencers ni quinze segons que de seguida
es desfan i s’escampa tot per terra un altre cop restaurant
l’estat original de la natura d’aquella casa per a la meva mare
és un ritual de delicadesa i de gràcia ajuntar un xic
de tots els gats i fer-los cabre –a les seves mans
l’escombra reposa i la meva mare fa una mica de déu


canapé

nos tantos jantares da usina as esposas dos chefes
não diziam uma palavra: era como se não falassem
a linguagem das mesas dos colarinhos dos homens
comiam pouco e sorriam muito sempre impecáveis
tinham corretivo nas olheiras e gel repuxando o frizz
de cabelos exaustos traziam o cansaço nos cabelos
e seguravam seus filhos pela manguinha dos blazers
feitos sob medida a combinarem com o terno do pai
eram bonitas e melancólicas as esposas dos chefes
levando o peso dos vestidos das pedrarias enormes
seguravam xixi toda a noite para não arrastarem pelo
saguão as bitucas de cigarros e os ossinhos de peru
tinham uma candura insistente uma atmosfera muda
pobres mulheres se comunicando por olhar e suspiro
ouvindo os homens falando dos números e de como
os filhos dos operários gritavam tanto aquelas noites
de homens esses copos gordos de uísque até o topo
e as mulheres canapés quebradiços no meio do chão

canapè

durant els habituals sopars de la fàbrica les mullers
dels jefes no deien ni piu: era com si no parlessin
el llenguatge de les taules dels colls de les camises
dels homes menjaven poc i somreien molt sempre
impecables es posaven crema a les bosses dels ulls
i gel per allisar-se els cabells desenganyats
i exhaustos duien el cansament als cabells
i aguantaven els fills per la màniga de les jaquetes
fetes a mida perquè fessin joc amb el traje dels seus pares
eren guapes i melancòliques les dones dels jefes
traginaven el pes dels vestits de les joies enormes
s’aguantaven el pipí tot la nit per no haver d’arrossegar
pel vestíbul les burilles i els ossets de gall dindi
tenien una candidesa tossuda una atmosfera muda
pobres dones que es comunicaven a través de la mirada i del sospir
mentre escoltaven com els homes parlaven de números
i sentien els crits estridents dels fills dels operaris aquelles nits
d’homes aquells gots plens de whisky fins a dalt
i les dones canapès trencadissos al mig del terra


Josep Domènech Ponsatí (Sant Feliu de Guíxols, 1966), poeta, tradutor e livreiro, publicou até agora Cap a un dic sec, Desdiments, Apropiacions degudes & Cia., El Càcol , Preqüela e Gambiarras. Com seu quarto livro de poesia, El Càcol, ganhou o prêmio de poesia Sant Cugat em memória de Gabriel Ferrater (2014).

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