Aline Cardoso é graduada em Letras e mestre em Linguística na área de Análise do Discurso pela UFPB; mãe da Marina e autora do livro ‘A proporção áurea do caos’. Organiza o Sarau Selváticas, além de ser uma das fundadoras do Zine Coletivo Sagaz, fundou a Editora Triluna, visando a publicação de mulheres, principalmente negras. Seu segundo livro, ‘Harpia’, será publicado ainda em 2020 pela própria Triluna.
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Procuro teu contato
no sinal vermelho:
vias abertas,
trânsito lento,
pessoas atravancam
automóveis
as células
das palavras
se desintegram
na fumaça,
na saliva,
na liberdade
dos discursos
dissecados.
***
Um dia há de vir
minha hora,
incorpórea,
suplico à lápide:
demore-se
copiosamente
***
Expansiva pantera,
trucido lábios ao som
dos tambores de Hécate.
Harpia, visto a rapina,
bebo o gozo da musa,
êxtase selvagem.
Desejo o orvalho
sangrento
das línguas
incendiárias.
***
Implacável: explodo.
Incorpórea: impolodo.
Acolho irrupções cíclicas
ao ventre,
a cada novo evento:
subverto
centros gravitacionais,
saliva volátil
pólvora negra
molotov lírico
língua estopim.
***
Panteriça,
invisto contra
as borboletas de aço
do teu estômago.
Entre um ataque
e outro, dilacero-as
devoro-as, mastigo
com voracidade.
Engulo o sabor metálico
das asas reluzentes,
teus demônios
coagulam-se aos meus.
***
Moira necromante
ante a putrefação –
aparente caos
insignificante
A pupila opaca
incide à luz
que não refrata
A língua
arredia
laça palavras
ao fio umbilical
Pulsante
intermitente
atenta
ao último instante.