6 Poemas de Rita Dahl (Finlândia, 1971)

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Rita Dahl é escritora e jornalista freelancer que nasceu em 1971 em Vantaa, na Finlândia. Publicou 20 livros: 10 livros da ficcão e 10 livros dos dados. Entre livros dela são por exemplo um livro da viagem sobre Portugal, O Encantador de Milles Escadas (Avain 2007), o livro de viagem sobre o Brasil, Savukeitaan Brasilia (Savukeidas 2011), o livro de viagem sobre o Sul de México, Savukeitaan Meksiko (Savukeidas 2012), o livro de viagem sobre Chípre (Savukeitaan Kypros 2014) e um livro sobre poéticas e política Sanan paino (Tarke 2016). Foi responsável pela revista de poesia Tuli & Savu, em 2001 e também pela revista cultural Neliö (www.page.to/nelio).

Ela traduziu uma antologia da poesia dos anos 70 de Alberto Pimenta (Palladium-Kirjat) e editou e traduzí uma antologia de poesia portuguesa contemporânea Maailman syrjällä. Além disso, traduziu 2 livros de José Luís Peixoto ao finlandês. Editou uma antologia da poesia nova finlândesa ao português. Ela tem um blog: www.arjentola.blogspot.com

Foto da poeta por Jaani Föhr.


O Sangue do Poeta

O sangue do poeta seca-se ao verso racional,
alguém o apaga também,

diz que amas e o sangue recreia,
sobe à cabeça e recebo outro tratamento.

Não podem lavar o sangue do poeta com o seu sangue sujo!
O coração, só isso, suporta saltar da pedra

que anteriormente provocou um escândalo.
Primeiro o olhar deu uma volta à China,

onde o sangue borbotou do peito da imigrante.
Por que não circula o sangue até à cabeça da cada indivíduo?

Infelizmente não havia o sangue do poeta em mim mesma
embora conseguisse agora com muita força.

Onde vai todo o sangue, perguntou a mosca a mosquito?
A mulher é um espelho do poeta, a vasilha do incenso,

o status. O sangue gotejou para o chão pela tinta.
A junta torturou as impressões escondidas

nos sentidos. O sangue corre dentro alguém
de seminal. Os sentidos escondidos nos lençóis

do poeta, rebelde para que o sangue circulasse,
esvaziaria a terra exuberante. Nele realizou-se

o idiomatismo: “que Deus te acompanhe”.
Se corre unicamente uma gota do sangue nas veias

do poeta, ele será batido e violentado
até sangrem os olhos.

Acima de tudo soa: “sem o corpo / o sangue é / uma poça de áqua”.
O poeta fez chichi para ti,

trocou as fraldas, despejou na garganta
bebeu até o ultimo gole. A arma do poeta livre é

esse sangue duma jovem virgem que jorra
da ferida para o peito. Não ajudava

o algodão ou a proteção maior.
Ele decidiu ficar estudante mesmo transpirando sangue.

(trad. Teresa Salema)


O Inferno

A estrutura concreta afunilada onde há no total nove
entradas. O inferno é a repetição de tudo,

não será possível avançar. O inferno é gelado.
Para onde vão todos os gordos comilões depois à morte?

O inferno anda à solto, o filme de ação muito comum,
os cristais esvaziados das almas miseráveis, que agarram as
mãos dos outros.

Talvez o inferno seja bonita?
Durante anos cheguei à conclusão

que não há a igualdade nesse país.
Toca a campainha. Para lá porta

há dois mórmons bem vestidos.
O inferno foi gelado sobre a terra.

A caixa dos comentários foi quebrada ao mesmo tempo.
O inferno na família ou no céu, no qual

achas de passar a eternidade? Tentei tolerar-me
a mesma e perceber porque tenho saudades do

inatingível. O inferno verdadeiro dos anticapitalistas
anda solta. O que acontece depois?

Sacrificámos seis garrafas, nada
acontece e temos de preencher o tempo de transmissão.

Não te esqueças que para uma masoquista básica o céu é o inferno.
O inferno é um lugar quente ou frio?

Se o inferno estiver cheio, tem que te sentar
e esperar. O que se passa convosco?

Não sabes? Se o inferno está gelado,
a Finlândia ganhou o concurso da Eurovisão.

(Trad. Teresa Salema)


Hiroshima, Meu Amor

Não há melhor introdução à semiótica do amor
que os cadáveres cobertos de cinza e de orvalho.

Eu estava um pouco indecisa. A viagem à Itália
também a impressionou enormemente.

Olhos azuis, cabelo preto,
também é lembrado como ativista de direitos humanos.

Não qualquer avó senão a encarnação do amor,
renasceu como estendida e fictícia interpretação.

Não há namoro mais eterno
do que a comunicação entre a mulher e o homem.

A primeira versão deste era só fotos,
a seguinte pinturas.

Não é nada surpreendente que Hiroshima meu amor
se foi espalhando ao campo.

Que sim os canais lacrimais lá se purificam.
Espanto-me porque o meu amor se separou ontem?

Explodimos Hiroshima no ar, não é?

(Trad. Linda Nurmi)


Uma Cidade de Escadas Brancas

Lisboa, cidade das escadas brancas, muitos
poetas têm descido essas escadas como se desce das pelves
escrevendo sobre esta descida até o Tejo que
brilha azul com uma parcela de luz
amarela. Ou eles têm sentado nas esquinas
das tascas mais afastadas pensando por que a
vida deles é tão miserável, por que o seu destino
é o de ter saudades de alguém que não pode ser posto em
palavras, beber esses copos pequeninos e pedir mais,
por que a vida não lhes deu um outro papel. E eles têm escrito
sobre a descida das escadas e da saudade por alguém indizível que
nunca irão encontrar e para afirmar suas palavras eles bebem mais bagaço
para que a vida sinta alguém só por um momento, mesmo com a ausência causada
pela bebedeira e eles escrevem sobre beber e ao escrever eles embriagam-se mais.
E eles bebem os seus copos até o fim, escrevem os versos sobre as escadas que
vão dar no Tejo, os copos que são esvaziados para esquecer esta descida e para a vida mudar de direção, como a intuição do vôo ou o ato do vôo em si mesmo, eles
levantam das cadeiras só um pouco como se fossem levantar
e partir pela porta da tasca ao chamarem os últimos clientes
pelo nome.

(trad. Rita Dahl & Márcio-André)


Há um Desejo em Mim

Há um desejo das noites anoitecidas em mim, do dia
que se levanta alto, dos muitos sóis, simultaneamente
nascidos, há um desejo em mim da chuva, cadente
como as franjas de uma mantilha. Há o desejo, mas
não a força, uso ferramentas simples, a voz do
formão e do martelo na noite mais densa. Como se
atingisse um corpo para entalhar, a noite caindo sobre o muro
negro, as letras rúnicas, talvez o nome.

(trad. Rita Dahl & Márcio-André)


A Rosa, Também a Rosa

A rosa, também a rosa, Lisboa não seria perfeita sem que a rosa florescesse a cada
estação do ano, esta rosa também não dá em qualquer lugar, somente no meio do Rossio,
os espinhos não tocam a ninguém tão de leve como aos passantes, eis
rosa a rosa de Lisboa, em si os sentimentos suaves que afloram
nesta cidade, ela é a rosa dos bandidos, das prostitutas e dos
traficantes, a rosa que acaricia com seus espinhos qualquer
um, esta rosa que não zomba, não odeia, ela recebe qualquer
que seja a densidade da pele, ela é a rosa dos encontros e
dos rumos, por isso cresce no meio do Rossio e
é rosa dos loucos e dos narcômanos, ela
se estica para tornar-se amiga
do estrangeiro, ela é a
rosa
do encontro

(trad. Rita Dahl & Márcio-André)

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