A Geada Vive Quando o Sol a Resplandece – Poema de Carina Sedevich (Argentina, 1972)

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Tradução de Ellen Maria Vasconcelos

Carina Sedevich nasceu em Santa Fé, em 1972, e reside em Villa María, Córdoba, Argentina. Publicou as obras La violencia de los nombres (1998), Nosotros No (2000), Cosas dentro de otra cosa (2000), Como segando un cariño oscuro (2012), Incombustible (2013), Escribió Dickinson (2014), Klimt (2015), Gibraltar (2015), Um cardo ruso (2016), Cuadernos de Lolog (2017) e Lavar a la madre (2017). Também tem parte de sua obra editada em antologias e publicações literárias em diversos países e foi traduzida para o italiano e o português. É formada em comunicação, especialista em semiótica, e é professora de yoga. Bola de feno (Un cardo ruso) é seu primeiro livro traduzido no Brasil.


A geada vive quando o sol a resplandece

1

Com uma gota d’água o inverno pode começar.
*
Um homem passa ao meu lado.
Vocês se parecem.
Fuma.
É de pedra molhada
o tecido cinza de seu casaco.
Cheira a sombra de pinho
sua barba pura.
*
Sorrio em minha falaz evocação.
A geada vive quando o sol a resplandece.

2

Na janela
não pode passar mais
do que já se passa,
inverno.
*
Homens que amei e que me amaram:
morreremos.
*
Na janela, mesmo que passe o tempo,
as pessoas parecem ser as mesmas.
Não me esperam.
*
Chuva branda:
como não espero ninguém
o mundo é um lugar amável.
*
Chove. Em minha casa
desjejuo só.
Não sei nada
dos velhos amores
há tempos.
As folhas de chá
douram as águas
igual cada dia:
milagrosas.
*
Na janela
pendendo dos ferros
ficou a chuva.

3

Esta manhã
observava a figura dos tordos
e da fruta seca dos plátanos
pela janela.
Em meia hora
o passado e o presente
se fizeram do tamanho
das minhas mãos.
*
Vigiando as pombas
por trás dos vidros
minha gata sonha que está livre.
Detrás de cada lâmpada que acendo
sonho eu.
*
Consegui alguma liberdade
à força das grandes solidões.
Minha gata me entende
e se cala.
*
Se soubermos esperar
o gato comerá
seu próprio vômito.
O mesmo passará
com minhas palavras.


Ellen Maria Vasconcelos nasceu em Santos (1987) e reside em São Paulo. É autora dos livros de poemas Gravidade (Patuá, 2018) e Chacharitas & gambuzinos (Patuá, 2015 – edição bilíngue). Traduziu para a editora Moinhos o livro de Carina Sedevich Bola de feno (Un cardo ruso). Doutora em Letras e trabalha como editora de livros didáticos e paradidáticos. Publicou poemas em diversas antologias e revistas impressas e digitais, nacionais e estrangeiras. Também é tradutora freelancer e seus trabalhos mais relevantes também são na área da poesia.
Portfólio e contato: ellenmartins.wixsite.com/home

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