Maria Azenha é uma poeta portuguesa. Licenciou-se em Ciências Matemáticas pela Universidade de Coimbra. Exerceu funções docentes nas Universidades de Coimbra, Évora e Lisboa e na Escola de Ensino Artístico António Arroio.
Membro da Associação Portuguesa de Escritores e membro de honra do Núcleo Académico de Letras e Artes de Lisboa.
Tem mais de uma vintena de livros publicados e participação em diversas Revistas literárias.
(…)
Ver: https://pt.wikipedia.org/wiki/Maria_Azenha
1.
Fui vestal de um templo
que a Noite coroou de confidências.
Minha santa aliança
foi saber-me
na infância,
com raízes de álcool no poema.
2.
Um pedaço de céu está morrendo nos vidros do quarto.
Não se ouve nenhum pássaro nem vento.
Nem ave.
A luz sussurra
quando a cortina se move.
As palavras misturam-se na copa das árvores.
3.
Que palavra será essa no eco da floresta?
Um rio?
Uma flor?
Ou a guilhotina de um pássaro?
Tanto gostava de aprender a botânica da morte…
4.
À mesa as crianças
fazem o teatro da linguagem.
As letras sobrevoam risos e gargalhadas.
O chão da toalha,
preso por um fio ao lugar mais alto,
inventa o Paraíso.
Que outras letras alvas formam a Trindade?
5.
O que realmente as palavras sabem
umas das outras?
As letras fogem pelo céu da boca
– algumas tristes
outras melancólicas,
raramente alegres.
Uma delas,
porque ouviu deus gritar,
tropeçou no infinito e caiu
ao mar.
6.
As letras continuam a acertar
no poema.
Mal entram,
ouve-se uma criança
cantar
ao colo da mãe.
Quem mais a poderia amamentar?
7.
Ultrapassar a porta fechada à chave,
entrar às escuras
para dentro do alfabeto.
Percorrer os primeiros sons
com o coração aflito.
Ficar ali,
até que a primeira letra grite.
Muito. Prazeroso e belo
Poesia é chá das cinco
Alimento petrio da alma.
Me faz feliz.