Curadoria e Tradução de Gladys Mendía
Mateo Morrison (Santo Domingo, República Dominicana, 1946), poeta, advogado e ensaísta, galardoado com o Prêmio Nacional de Literatura em 2010. Em 1970, fundou o reconhecido Taller Literario César Vallejo. Também foi diretor do Departamento de Cultura da Universidade Autônoma de Santo Domingo, vice-ministro de Cultura do governo dominicano e diretor, durante duas décadas, do suplemento literário Aquí.
I
Vivo aqui onde o vento morre.
Morro para renascer
talvez
na tua memória.
A adaga que construis para me ferir.
A faca imantada que lanças ao meu peito.
A tocha com que incendias meus passos.
A ferida no meu rosto descuidado.
As abelhas que treinas para envenenar meu espírito.
As águas infectadas do jardim que cultivas para te vingares
no meu corpo derrubado.
O tiro que procuraste no poema de Maiakóvski
para penetrar na minha têmpora.
Os restos de cicuta que investigas na história para que sua essência
destrua minhas entranhas.
As investigações que avanças para aprender e aplicar em mim
as torturas mais sublimes da pós-modernidade.
A câmara de gás que foste conhecer para estudar
a possibilidade do meu holocausto particular.
O olhar que exibis todas as manhãs forçando-me
a refugiar-me na quietude.
Não são suficientes para deter teus assédios à minha sombra?
II
Não
Sim
Talvez
Quem Sabe
Ilumina rápido
A noite
Poderia
Explodir
Em nossas mãos.
III
O harmonioso vem da tua pele,
suave e úmida como certas cavernas.
Cruzo pelo teu deserto de espelhos,
que multiplicam os suores do desejo.
Tua sombra me cobre.
Já posso entrar em ti
banhado de gemidos.
IV
Aqui estão colocadas as criaturas
que vão se tornar estátuas.
Entes talhados sem suores
e sem nada que circule por suas veias.
Já estão prontas longe das cidades onde perambulam
tantos seres anônimos que nunca serão esfinges.
Transfiram já os selecionados para a glória
e deixem-nos com nossa intranscendência,
dispostos a morrer como chegamos,
emitindo um pequeno grito.
Nos cobrindo com o lençol do esquecimento.