4 Poemas de Arianne Pirajá

| |

Arianne Pirajá é artista visual e trabalha a escrita como ponto de partida para criar no papel ou em materialidades diversas. Foi contemplada com o Prêmio de Artes Visuais pela Prefeitura de Teresina em 2019. Publica seus poemas artesanalmente desde 2006, “Se eu não morrer de um choque” (2017) e “Por um instante apenas” (2018) são os títulos mais recentes. Contato: @ariannepiraja no instagram


Peixes e Pagus

a lua esteve em escorpião
por sorte, sou peixa de lua, deslizo
nas brumas de março
distraída entre o mistério e o perigo
atraída pela imensidão do azul profundo
nas águas doces das mãos de minha mãe:

– tudo cura, tudo cura, tudo cura…

memória é afeto
acerto o passo e me liberto
até ontem eu esperei
e ainda hoje espero
provavelmente ao final de maio
nada mais saberei
e então, terei que esperar

cada dia que passa
um pouco disso evapora
nos raios de Sol

inútil
todo movimento pra fora

minha luta contra o que vi

melhor deitar a cabeça sobre o parapeito
como aquele cachorrinho
arrebatado pela lua
lá no alto inalcançável do breu

nem sente o cansaço que sente
suspira muito que grato
com os oim mole
mole de fazer doer
de tão bonita que é a lua


Astros e Robôs

sem açúcar, com canela
ou abundantemente morte, adeus mundo velho
sou mais uma na multidão
sem tempo a perder com meu próprio medo de tudo
mantendo os olhos abertos mesmo que doa

e é bom que doa
a terra precisa do nosso sangue e suor
e que seja doce a nossa entrega
mesmo que doa

e é melhor que doa
significa que estamos presentes ou quase isso
interligados por esse mistério que é a vida
e apesar dos homo sapiens, há o Sol e a Lua
e todas as células
do ar, das flores, dos rios
as estrelas, lindíssimas e silenciosas
quase imperceptíveis não fosse o fio vermelho que nos une
Sirius, Órion e todos os seres que nos acompanham
nem mesmo os terraplanistas destruirão o horizonte
afinal, sempre há espaço para uma esperança


Ainda não Ouvi o Nome

mas já sei alguns segredos
existe algo de selvagem em nossos passos
estamos na Terra e de fantasias já estamos fartos

eu sonho e gosto de sonhar
mas o que eu gosto mesmo
é de jardim
heras e madressilvas
crescendo sem fim
no cardíaco

as três irmãs do destino assistem a nossa dança
– como agradar aos deuses que nos acompanham?
eles sentam-se apenas à beira dos rios perenes
e não tomam chá porque nunca adoecem
enquanto nascemos e morremos
não sei bem o que apostam, mas sem dúvida se divertem

o vento está sempre presente
e sempre de passagem
como este momento
em que nos penso
com cuidado e sem açúcar


Escrevo Cartas para Queimar

tuas cartas estão guardadas
em agendas livros caixas
desculpe se falo outra língua
e ainda que eu falasse outra língua
estaríamos eternamente ligadas
de uma forma que só o amor cura

eu continuo te escrevendo
cartas, no chão molhado de chuva
com cuidado pra não escorregar

esse cheiro de carta papel chuva
é o aroma dos cabelos de nossa mãe
a mãe de todas as línguas
sussurra nossos segredos no ouvido da terra
e esconde-se no farfalhar das cinzas

4 comentários em “4 Poemas de Arianne Pirajá”

Deixe um comentário

error

Gostando da leitura? :) Compartilhe!