5 Poemas de Marcelo Torres

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Marcelo Torres publicou: “Vertigem de Telhados” (poemas, 2015) e “nadar em cima da rua” (poemas, 2015), editados pela Kazuá; “Páthos de fecundação e silêncio” (poemas, 2017) e “Poemas tímidos e gelatinosos” (poemas, 2019), editados pela Patuá; “Saindo sem avisar/Voltando sem saber de onde” (poemas, 2020) e “Tu és isto e mais dez mil coisas” (poemas 2022) editados pela Córrego.  O autor ainda tem poemas e textos publicados em antologias, revistas de literatura e cultura no Brasil e no México.

É um dos criadores do Canal Clóe de entrevistas com poetas brasileiros, que traz, de forma independente, um dos maiores panoramas audiovisuais da poesia contemporânea. É também editor na Editora Clóe.

Atua como gestor cultural há mais de uma década e é mestrando na Unesp na linha de pesquisa de processos artísticos, experiências educacionais e mediação cultural.

Nasceu em Pernambuco, na cidade de Palmares, no mês de março de 1984.

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Sobre o livro: Infernos Fluviais e por que nunca conversamos sobre Nick Cave?

Já li muitos livros de poesia em que o autor tem um começo visceral e depois perde o fôlego. Isso não acontece na nova coletânea de poemas de Marcelo Torres. Ele nos oferece um livro todo pensado e bem cadenciado. O autor nos brinda com um grande trabalho de linguagem, produzindo uma obra compacta e sem desnível. Estamos diante de um escritor multifacetado que, com o domínio da estrutura poética, faz porejar em seus poemas sonoridade, conteúdo e, de modo especial, a criação de grandes imagens. O livro, Infernos Fluviais e Por que Nunca Conversamos Sobre Nick Cave? é um convite para sair do piloto-automático e abraçar o inusitado.

Tito Leite, escritor e monge beneditino


Era para ser somente sobre você
 
Regulares divagações, o amor é a imagem pousada na língua.
Dos costumes teus, estes de afogar-se na fogueira, o mais declarado
nos rascunhos. A última multa foi uma isca para apagar pegadas,
tuas amizades com mulheres, te sacodem o púbis, 
colocastes as páginas úmidas para secar no anonimato em Londres.
De tuas crises, semanas de cama, cantos gregos em bicos, 
flores como transmissores genitais. As pedras ganharam teu nome
quando afundastes contigo, junto ao rio.
Ah! como é preciso um disfarce. Teve várias vozes,
toda a tristeza da água silenciosa não pode deter teu ímpeto
de deslizar para a morte que é também como a chuva ácida,
o mangue cheio de esgoto, a última palavra de um livro.
 
 
 
Ariel
 
Buda toma cerveja com Exu num baile,
os anjos afogados estão no teu colo poeta
                  em um domingo de poucas reflexões,
ações sobem no mercado
                 tu nadas preocupado, sonhas alguns livros,
                                 a sonoridade da morte, os pássaros etéreos,
arrisca-se no bilhar com o duende do verso
pula cela no inferno
manda cartas para a mulher de palha
senta nu diante da biblioteca central, suspira,
partilha com a noite os dois últimos filmes que vistes,
a porta que flutua na tua fronte, está no tempo
                 de tua retina que desce a serra do mar,
o amor é um silêncio contínuo em febre?
estás dentro/fora da efemeridade absurda, da maresia do destino 
 
 

Por que nunca conversamos sobre Nick Cave? (Trecho do poema reproduzido abaixo)

esclarecimentos acompanhados, de uma voz e guitarra noturna

 
:
a grande armadilha da fé está no desastre, nos joelhos dobrados uma oblíqua nuvem informa a delicadeza na noite onde altares se fecham no peito,
 
um espinho duplo, te faz tremer na manhã seguinte, se expande um delírio apressado junto a palavra, ninguém sai de casa sem problemas,
 
sobre um parapeito de vento, um anjo te estraga, misto de rezas, inflamados pensamentos circulando na cintura de um inaudito ser,
 
ore para qualquer coisa, sua samambaia, seu deus surdo, seu sexo esperando o esquema dar certo, ore para o vinho dançante em sua mesa, a lua de março, 
 
(não ande nos desertos ao meio-dia sem seus óculos de sol)
 
*****
 
Na tua esteira a vacuidade
em frente a caatinga
sem centros para emoções
tua mente pode projetar
luas, chuvas nas cisternas
uma noite onde o quinto ponto
esteja equilibrado
para teu cérebro 
trabalhar inteiro
incinerando a pressa
 
 
Poema – 2 de 15 ideias ou da mensagem sem cineastas
 
espero nunca ter uma mensagem que tranquilize as pessoas,
o mundo é enlouquecedor como o tecnicolor
 
forjo bocas à deriva, ervas daninhas para aqueles mamíferos
encorpados pelos planos secretos que destroem os cantos
 
yanomamis, macuxis, mulheres línguas de estandartes/flechas, relvas
a revelação do peixe vermelho, grávidos de telas neobarrocas
 
o que faço da minha amargura?
 
sonho-a dentro de pelo menos três pessoas
 
 
 
 
 
 

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