7 Poemas de Carmen Gonzalez

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Carmen Gonzalez nasceu em 1965 em Barras do Maratoã, no Piauí, e atualmente reside em Santo André /SP. É bacharel em Direito pela UFPI. Publicou o livro “O Segredo dos Bogarins” (2018) e tem poemas publicados na revista Pulsar (2001) e em algumas antologias “Saciedade dos Poetas Vivos” (vol. I e II, Ed Blocos, RJ, 1992/1994) e Baião de Todos (2016).

Os poemas publicados seguem dois conjuntos, os 3 primeiros são inéditos e os demais são do livro “O Segredo dos Bogarins”.


Ferro Quente

Palavras duras machucam,
a minha audição insone,
repetidas sob um martelo.
Os apóstolos fogem da cruz
até alcançá-la de propósito,
sem nenhum argumento teológico
guiando seus passos decididos.
A boa vontade é maleável
e se estende até outro lado
do esquecimento divino
onde dobram os sinos de domingo.
Os sons de um órgão anunciam
uma festa interior
onde pássaros voam
no compasso das notas musicais
atravessando o vento
que inquieta as árvores.
Não escuto mais o ferro
do silêncio se queimando na brasa,
escuto apenas o teu ressonar
de mar profundo.


Hirto

Era um tempo sem medida,
nada imitava as sombras
das mangueiras no verão.
A claridade era seca,
o vento soprava a leste
e se embrenhava na luz
com um carregamento de pó
para as frestas das árvores.
Nem um segundo adiantado,
a chuva mandava esperar
da soleira da porta
para trás do cajueiro,
até que se cumprisse a solidão
de quem todo dia morre
um pouco de mãos vazias.


Ferreira

A transparência do orvalho
cega os pássaros
que voam no escuro?
Aprendo com eles
as contrições da beleza
pousando nas coisas
improváveis do dia a dia
cobertas por uma invisibilidade
que ilumina a poeta
com o seu martelo de esperança
(nunca forjei o aço de açoites)
Ou o contrário,
o céu se abre às asas
dos pássaros noturnos
e nenhuma luz cega
os seus olhos alados.


Claridade

Cava metáforas na manhã,
coisas brancas despontam:

arroz de leite e beijus na mesa,
restos de papafinas pelo chão,

cal na carnadura da casa,
bode branco, pasto sem chuva,

bogarins espiando da janela
velas velando a morta.


Sabininha
(Arcano Maior)

Sobre tocos
toco a estrada
rumo ao sol,

formigas tombam
ante a poeira
e a solidão do lugar.

Mandacaru na cerca,
mendiga do caminho,
leprosa ai! ai! ai!

meu céu de trapos,
meu azul vermelho,
meu bem manco.

O enforcado cai,
arcano em brasa,
cai a última sombra.

Fome! Fome! Fome!
Plantação de sinos
ecoa na manhã,
a terra exala
os seus mortos


Última Estação

A salvação sempre
está escondida
onde está a ferida,

lá é o lugar,
a praça do mundo
onde pátrias fedem a mijo.

Danem-se as chananas!
Morram os bogarins!
A minha flor é a loucura.


O Louco
(Arcano Maior)

Cego andarilho,
fiel às estações,

acompanha o sol
com o umbigo,

desenha círculos perfeitos
com os quadris.

Reza de joelhos
no santuário da manhã,

ao meio dia
recolhe as cinzas.

Espalha sementes
de maracujá na tarde,

gotas de chuva
caem em sua língua,

(arco-íris de alegria
casamento da raposa),

faz armadilhas
com fios de ouro,

engenhos luminosos
aguardam a noite.

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