3 Poemas de Mariana Figueroa Dacasto (Uruguai, 1979)

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Curadoria e tradução de Floriano Martins

Mariana Figueroa Dacasto (Montevidéu, 1979). É escritora, compositora e jornalista, licenciada em Ciências da Comunicação. Publicou vários livros de artesanato. Em 2016 publicou o romance El caso Virginia Tiresias e em 2021 o volume de poesia reunida: De todos los haces de luz que mi corazón proyectaba. Já se apresentou em diversos espaços de Montevidéu, seja lendo seus poemas ou cantando suas próprias canções. Ela foi uma artista de rua de 1997 a 2020.


[ELA GUARDAVA PEDAÇOS DE MIM]

Ela guardava pedaços de mim.
Jogou todos eles fora.
Fiquei com pedaços dela
aqui grudados
queimando nas bochechas
até a morte.

Ela guardava pedaços de mim.
Jogou todos eles fora.
E as peças incrustadas em mim persistiram.
No vento de inverno
elas ficaram vermelhos
imensos
claros
alfinetes nos olhos da minha insônia.

E ela cravada aos pedaços na carne de tantos seres
dos amantes e companhias que me seguiram
enquanto eu aqui, um trapo só de carne macia
atingi o ponto de náusea,
quebrado até o núcleo,
e apenas um círculo.

E ela se espalha, se gruda, se torna endémica,
em outros seres, nesta praça, em algum lugar, em todos os lugares,
em um inseto, em situações, em indolências,
nos planetas, naquela árvore, na Manchúria,
em Si bemol, na véspera de Natal, de madrugada.
Espalha-se, invade a água, os animais,
os nomes das coisas e das nuvens.
Fica impregnada, vira artéria,
faz doer,
ela fica maior, eu fico menor,
eu me transformo em trapo.

Ela se espalha. Enterra-se como bactéria
nas montanhas, nos mares e nos infernos,
em quasares e penugens, no sopro do sol,
desertos, ruínas e grãos de areia,
nas falhas discretas dos deuses,
Em átomos e buracos de minhoca,
em estrelas que explodem irradiando câncer
em sorrisos refletidos em taças de vinho.

Ela guardava pedaços de mim.
Jogou todos eles fora.
Seguiu incrustando-se infinitamente
no universo
e sem me olhar jamais.


[DE TODOS OS FEIXES DE LUZ]

De todos os feixes de luz que meu coração projetava
um deles me pegou pelo nariz e me levou ao zênite
e me destrancou quebrado no caramanchão de uma montanha distante
em abetos cheios de medo.
Entre ascensão e queda, a jornada foi longa.
Meus pés ardentes de fogo e essa altura escaldante
a terra virgem estelar caindo em meus olhos, sangrando
meu sexo inchado de sufocamento e umedecido com éter
meu coração perfura violento, bestial, sua parede.

Cada veia de meu corpo poderia ter explodido
cada fibra da minha alma estava se transformando em um gemido.
Eu subi e caí durante séculos, ou num piscar de olhos,
sei lá.

Ao retornar ao pó
tudo estava tão mole, tão indefeso.
Pedras e tristes bastões de brasa
e uma cratera em meu peito
meu coração arrancado
e seu último adeus
das alturas.


[LÁ SE VAI MINHA PEQUENA VIDA]

Lá se vai minha pequena vida
a chorar entre as colinas;
ninguém a quer nem perto
dizem que não há lugar
para lamentar e chorar
que na vida já existe tristeza.

Lá se vai minha pequena vida
minha vidinha doce e triste.
Dizem que eu não deveria
Jamais chorar uma canção
que ela deve ao coração
distraí-lo de suas penas.

Lá se vai minha vidinha!
Auditório covarde tem
quem não enfrenta suas dores,
pois não sabe discernir
entre a dor de viver
e a dor das canções!

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