Pré-venda e lançamento do livro Costura, de Amanda Vital

| |

Amanda Vital é editora na editora Patuá, ombudswoman do jornal RelevO e co-editora da revista Mallarmargens. Tem bacharelado em Estudos Literários pela Universidade Federal de Minas Gerais e é mestra em Edição de Texto pela Universidade Nova de Lisboa, trabalhando com a obra poética de Augusto dos Anjos pela editora Ponto de Fuga, de Lisboa. Autora do livro Passagem (poemas, Patuá, 2018). Participa de antologias de literatura brasileira contemporânea e tem poemas traduzidos para inglês, espanhol e catalão, publicados em revistas físicas e impressas.

*

Coser, costurar, alinhavar, isto é: extremo ofício de cerzir as bordaduras da língua, de avançar humildemente, e com suores nos pedais, sobre o sudário ensanguentado onde vicejam as palavras. São de seda ou de chiffon estes poemas de Costura? É de veludo ou musselina a voz que neles se anuncia? Estou em crer que são de carne, de águas vivas, de memória, e que uma agulha muito antiga (a dedaleira das avós brilhando à mesa das lembranças) lhes confere densidade, encorpamento, floração. É que está viva e florescente a poesia de Vital, a par do luto e dos espectros dolorosos que a permeiam. Cortejada pelas asas de uma ave de ternura (o pai que é pássaro totémico nas câmaras do sonho) a poesia de Vital instaura lâmpadas nas sombras, rege a dor e administra o rastro escuro das ausências. Recrudesce – ou encrudesce, como a musa adiliana – nesse ofício de ser sangue, confissão e tessitura.

Luiza Nilo Nunes


metamorfose

não ter as pernas de anos atrás rijas como cenouras
saudáveis e enterradas em buracos no mesmo ciclo
rotativo de terras: ser a mesma nas renovações dos
plantios trazer ranhuras que nunca mudam de lugar
ser um par de pernas sugado pelas areias movediças
vezes sem conta até que chega essa derradeira hora
a um minuto do espanto a segundos da necessidade
escapar rolando de mansinho ultrapassando o cerco
hoje dei para não ter mais as pernas: desconheço-as
desconheço os solos para onde sempre me submergi
hoje só dei para migrar como migram as andorinhas:
levo a terra sob as asas na quina dos ossos à partida
trago o coração no bico para saber me guiar na volta


confessionário

minha verdade só entra pelas frestas: impaciente
e doida ricocheteando contra filtros teias bordas
como uma senhora agoniada nos fundos de uma
igreja junto à parede externa do confessionário a
chorar a sorrir com olhos fixos na barra da batina
do padre e os dedinhos furando as grelhas: entra
estrambólica como uma beata reclusa há décadas
dentro do próprio peito a gestar cabelos brancos
e uns pés de galinha gigantes ao redor dos olhos
a levar ovos numa sacola de plástico reutilizável a
direcionar guinchos sem coerência a quem passa:
já que isso de beleza e de elegância é para outras
mulheres o que é meu eu levo guardado no bolso
em papel envelhecido escrito em caneta bic preta
para mostrar e ler aos outros na parada de ônibus
mas é de uma feiurinha tão agradável que até dói


Serviço:
Lançamento do livro Costura, de Amanda Vital
Data: 13/04/2023
Horário: 19h – 22h
Local: Livraria Patuscada (Rua Luís Murat, 40 – Pinheiros – São Paulo/SP)
Link para pré-venda: https://www.editorapatua.com.br/costura-poemas-de-amanda-vital/p

Deixe um comentário

error

Gostando da leitura? :) Compartilhe!