.2 Poemas de Jussara Salazar

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Jussara Salazar (PE) é escritora e artista visual. Doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC/São Paulo e Mestre em Estudos Literários pela Universidade Federal do Paraná. Publicou vários livros de poemas, dentre eles Carpideiras [2011] com a Bolsa Funarte, O gato de porcelana, o peixe de cera e as coníferas [2014] e Fia [2016]. 


Poema para uma Cidade de Ratos
e de Homens

A cidade começa com uma linha.
Aqui rasteira contorna geométrica espinha
linha-cervical.. Linha quase, torta, sem rigor
traspassada por um sol escuro
batida, cova a seco a cidade insiste
Irrequietos lá os ratos roem
as elipses dos bueiros
riem nas portas do palácio
— em coro ressoam — riem a ROUPA do rei oco do nada rumam
e são ratos de pedra, ideias em estado de aridez
alimento rotundo a pino
sílabas sem Pai são

Aqui as palavras também são
estão. Palavras mergulhadas no rosa rio escuro
um rio em brasa. Rio em toras
pesado em águas de pouca vogal levando a palavra ardendo
palavra cega. Palavra demo
A travessia é viva. Salobre animal
seu torpor abre as asas
golpeia o ar esparge escura a água
contra faca. Lâmina que fratura o dia
— furor assim não se viu.

Por isso ergueram o palácio ao grande Vento
Plantaram a grande Árvore
Oraram e beberam da grande Sede
Santuário — um rosário rio aqui
no claro do papel se ergueu
e da linha-risco outra cidade vingou
talhou desbastou capinou
cortou o vazio enfurecido
para que se ouvisse o verbo ave
o nome enxame
Águas de Espanha brincam agora o rio
Santas semeiam o jardim
redondo em sua doçura de PERFUMES frutas
e flores
— cidade corpo aqui posta a fio e fogo


Corpo Inconsútil

a linha do rio costura
o céu e a terra
a linha da terra costura
o céu e o mar
a linha do céu dobra
o inferno ao meio

contornamos o sol

a linha do tempo
não se dobra
mas fia
teia de si mesma
acalenta o vento
e costura
a linha dos dias

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