Curadoria e tradução de Elys Regina Zils
Teresa Korondi (Uruguai, 1966). Poeta, narradora e comunicadora que também traduz textos literários. Possui formação em Apreciação e Estudos Poéticos pela Fundação La Poeteca, Caracas, Venezuela. Ministrou oficinas, conferências e leituras em festivais e instituições educativas de vários países, entre elas a Universidade Federal de Pelotas (Brasil) e a Universidade de Palermo (Buenos Aires), sendo publicada no livro Reflexión Académica en Diseño y Comunicación Nº XLIV (2020). Faz parte da Terceira Mostra de Poemas Ilustrados Nancy Bacelo Edição 2022, do Programa para o Fortalecimento das Artes da Prefeitura Municipal de Montevidéu. Algumas de suas publicações são: Bo (disco poesia-canção, Fundo Nacional de Música, 2014), La enunciación (Editorial Yaugurú 2016), Escandinavia (Ediciones Del Azahar 2018), Par (Editorial Yaugurú 2021), Corre, corre (Coleção IberLetras da Editorial Contexto e Associação Cultural Ibero-Americana de Huelva, 2021), Rodó porque rodaba (Prêmio Nacional de Poesia Inédita do Ministério da Educação e Cultura, 2021 – Solazul Ediciones 2023) e Otaku (Textos Intrusos, Argentina, 2023). Foi antologista da mostra Del Salvo al Barolo: un rioplatario poético (Textos Intrusos, Argentina, 2019) e integra Haikuscopio, Antologia rioplatense de haikus (Ed. La pequeña gran Nilson, 2024) no âmbito do Programa de Fomento ao Setor do Livro do Ministério da Cultura da Argentina.
DENTRO DE MÍ
con calor estremecen
aqueles pássaros
Na escrita memoriza o esquecimento dos pássaros
Eu os exercito
como se ao voo
uma liberdade desarrumada encontrasse lar
Um livro branco sem nome aparente
Tudo se torna um esquivar-se entre palavras
Acontece a poesia aí fora da linguagem
Nos amamos com o idioma da ponte e o oceano
como se o tempo
retrocedesse à sua caverna
Podemos passar para esclarecer que não há esquecimento
nem tampouco há pássaros
muito menos linguagem
Somos sagrados
Ar que carece de qualquer verdade
[ENSAIO]
um corpo escuro que penetra
na outra luz
que vai se tornando escura
José Lezama Lima
Ensaio
sobre a penumbra
Invoco a insônia
que nasce
dos gestos
e nas luzes negras
reverbera os olhos
Tremedal de pernas
para onde vamos
quando falamos de noite?
O relógio desgasta o tempo
cobra o corpo das coisas
rompe o ar
a madeira
Fulgura
como alvoradas
inafundáveis
do poente
[A FORMA DE UM TETO]
Letras não lidas, palavras não entendidas
e no entanto o poema.
Cees Nooteboom
A forma de um teto
gira ao vento
Exala o sentido
leve de manhã
onde cai a sombra
céu de uma casa
O infinito vai na mão:
um teto virado
como um livro
que treme
no gemido do papel
sussurro da sombra
(A nota leitora
coloca aqui
o olhar)
Mais tarde
esse mesmo teto voa
Pousa em uma casa
de sombras
viradas
Desaparecem
teto casa olhar
(A)parece o poema
Do vento protege
intempérie
sombra
Toda língua
Céu
[LER A LUZ]
Deus nos havia dado pesadas almas de pedra.
Karin Boye
Ler a luz
que flui das cornisas
As penas quebram o voo
ao cair picadas
desde uma única janela
Entre as sobrancelhas do céu
e disputa ilusória
desse voo mortal
É a silhueta da menina
santa em seu desânimo de escovão
que rasga o ar
como uma bala espessa
Detém seu peso
no meio do vento
Torna-se tempestade
auxílio de canto
Uma labareda de água
agora cai sobre meus olhos
e clareia
COMO SE AS NUVENS SE ESVAZIASSEM EM MIM
não há dias de chuva
nem de choro
Desajeitadamente me encarrego
das gotas de orvalho
das pedras de granizo
Acomodo a terra
Um borrifador rega os brotos
que se desprendem dos nós
num vaso pequeno
Como uma jardineira experiente
recolho os cantos
Junto o adubo de animais domésticos
Quando movo as mãos a vejo
Borboleta e alada
amando-me com os olhos das costas
Nasce uma orquídea
Aprende a voar e morrer