2 Poemas de María Baranda (México, 1962)

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Curadoria e tradução de Elys Regina Zils

María Baranda (México, 1962). Poeta. Seus últimos livros de poesia são Teoría de las niñas, Cañón de Lobos e The New World Written. Selected Poems.


NINGUÉM, OS OLHOS

I
Um escorpião me espreita no verão.
Um escorpião terrestre na balandra.
É o sutil princípio da minha vida. É a
ira de Deus que me quebra. É seu
veneno sem limites nos meus dias. Quero
me ver morrer neste corpo, mas
não sei pedir perdão como as crianças.

II
Está frio aqui dentro. Os olhos das
crianças não me olham. Seus braços são os
mastros do sonho da minha morte. Não quero
que me toquem. Nem sua luz atrás do monte nem
sua graça me devoram. Nem seus rostos nem suas
sombras me acompanham.

Paz para aqueles que não sabem morrer.

III
Ratos sobre teu peito. Não olhes a ardência
em teu destino. Uma mulher mitiga sua aspereza
sob tua língua. Lembra-te de sua dor entre os
lençóis.
Não tenhas medo.
É a terra diante de ti que a nomeia.

IV
Trago cicatrizes recentes.
Uma ilha sagrada entre minhas mãos, uma
serenidade incompreensível
que me faz fechar rapidamente as pálpebras.


PESADELO

I
…e quando me pergunto
quem poderias ter persuadido
vendo aquele céu sonoro,
a fenda aberta na parede,
o movimento em sua medida
e o campo em uma tela de grama
sustentada em suas membranas,
sozinha, tão sozinha, exalando
uma nova pontuação, uma voz
longa na noite agravada,
forçada a ver
um resquício do que foi,
dizendo a si mesma:
má, terrível, funesta
e penso nessa desproporção
do pensamento,
no espanto diante de uma pausa,
um compasso detido
em um telefone inexistente ou em um CD
temeroso e solícito, um agora
na tentativa de ser chama
entre os lábios mais escuros
quando os peixes,
disseste, eram duas vezes
mudos
sempre na caverna
onde o sol abria
desobedientemente
uma defesa
contra a escuridão
ou uma simples forma
opaca
que vias entre os átomos
e as moléculas,
sonhavas?

II

…porque te vejo longe
caída ao fundo sitiada pelo lodo
afundada em lentas espessuras solitárias,
porque te digo lume
e escorres da minha boca
em chamas,
porque te nomeio agora
como então
e os pássaros são mais frágeis e as nuvens
já não existem,
porque te vejo na rota de uma alta pedra
que imagina planaltos diversos
e a matéria inóspita
onde articulas
em um mesmo reflexo
o que caminha e fala e evapora
e porque tudo é uma página de fome
onde concilias o impossível
com o sol só em sílabas de advento,
porque a noite,
essa noite,
a noite vítrea e diminuta,
a mais furiosa e persistente,
que se oxida fulgurante
com essa forma altiva
tem seu império pútrido
seus olhos bem abertos, seu campo
de aromas enjaulados,
seu grito como uma mula preta
que não se esquece
-não-
e que está ali ao nosso lado
para morrer aos poucos
um pouco e com o sonho nas mãos
nessa noite,
essa noite
piramidal e única
e toda tua.

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