3 Poemas de Gloria Gabuardi (Nicarágua, 1945)

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Curadoria e tradução de Floriano Martins

Gloria Gabuardi (Nicarágua, 1945)Poeta, artista plástica, membro do Conselho de Administração da Fundação Festival Internacional de Poesia de Granada, Nicarágua. Vencedora do Prêmio “Ricardo Morales Avilés” da União Nacional de Escritores (1982) pelo livro En defensa del amor. Também publicou Mástiles y velas (1984). A sua obra foi parcialmente traduzida para inglês, alemão, italiano, romeno e turco. Fundamental o trabalho que faz em Granada pela difusão da poesia latino-americana.


MEUS ANJOS E DEMÔNIOS

Eu tenho sonhos azuis e de paraísos
sonhos com caixas de música
com baús e barquinhos solitários
com sombras de figurinhas de animais
e rostos afiados e corpos que rolam no vazio.
É onde eu prendo a noite e os feitiços
destruo a solidão
anjos e demônios
porém eles se erguem com jorros de luzes
e voam secretamente com a música de Bach.
Dali saem fantasmas brancos e roxos
bêbados de lua e com flores vermelhas
ansiosos para galopar a noite e as estrelas
saltar o amarelo
o mar da inconsciência.
Nas frestas de minha alma guardo esses sonhos,
agarro o silêncio e o enterro em meus punhos
abro ao mundo as portas da minha alma
as feridas de heliotrópio
desperto o corpo adormecido
e retomo a alegria que me dá a liberdade
a passagem da vida pela minha porta
no meio do luar em seu quarto minguante.


UM PONTO SEGURO PARA DETER SEUS SONHOS

Tens que descansar a alma,
escondê-la da luz dos olhos
para que o vento que empurra a tristeza
passe longe, vagando e tilintando
e leve para sempre o mar de lágrimas.
Sim, que a alma descanse um pouco
para que o coração aproveite a chuva
sem hoje, sem amanhã, sem ontem.
Que aproveite o colorido devorador
da paisagem deslumbrante que nos rodeia,
do cheiro da mãe terra que nos abriga
do cheiro de seu próprio corpo:
do cheiro de seu cabelo e de sua boca,
do cheiro de suas axilas e de seu sexo
que se embriague de si e para si mesmo
e quando eu desperte livre de Nínive e Babilônia
que eu sinta seu terno coração cheio de lua,
prisioneiro do verde, húmus da terra,
oferecendo-se à luz livre de arrependimentos
para ver ao final do arco-íris
um ponto seguro para deter seus sonhos.


PREPARAÇÃO PARA A MAGIA

Folhas de menta
e limoeiros,
creme de amêndoa
e chá de camomila,
vegetais frescos,
a carne removida
para que o corpo limpo
e purificado seja um cervo
ágil e inocente
e como vidro,
alma pura, transparente e delicada;
vibre como uma harpa ao toque suave
do seu tato, para que feito um violino
ou violão tensione a coluna,
os seios mais erguidos do que nunca,
pernas de potranca prontas
para o voo, avião ou pássaro,
o arco inflexível dos pés
e todas as pulsações em uníssono,
agora que regressaste.

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