2 Poemas Clemente Soto Vélez (Porto Rico, 1905-1993)

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Curadoria de Floriano Martins
Tradução de Elys Regina Zils

Clemente Soto Vélez (1905-1993) foi um nacionalista, poeta, jornalista e ativista porto-riquenho que orientou muitas gerações de artistas em Porto Rico e na cidade de Nova York. Após sua morte em 1993, ele deixou um rico legado que contribuiu para a vida cultural, social e econômica dos porto-riquenhos em Nova York e latinos em todos os lugares. Soto Vélez nasceu em Lares, Porto Rico, uma cidade conhecida por “El Grito de Lares” de 1868, uma rebelião contra o domínio colonial espanhol. Seus pais morreram quando ele tinha sete anos e ele foi morar com o padrinho que o criou. Ele recebeu sua educação primária em Lares e depois estudou pintura na cidade de Arecibo sob a orientação de Ildefonso Ruiz Vélez. Em 1918, mudou-se para San Juan, capital de Porto Rico e morou com sua irmã. Em San Juan, Soto Vélez estudou engenharia elétrica e administração de empresas na Ramírez Commercial School. Lá ele também conheceu e fez amizade com poetas como Alfredo Margenat (pai de Hugo Margenat) e Pedro Carrasquillo. Em 1928, Soto Vélez trabalhou como jornalista para o jornal El Tiempo, onde publicou muitos de seus trabalhos. Ele foi demitido de El Tiempo depois de escrever um artigo criticando as injustiças cometidas contra a classe trabalhadora pela indústria açucareira controlada pelos americanos em Porto Rico. Soto Vélez foi morar em Nova York e em 1943 ingressou no Partido Comunista. Esteve envolvido com as campanhas políticas de Vito Marcantonio e com o Partido Trabalhista Americano. Ele trabalhou para a Spanish Grocer’s Association, Inc., e mais tarde fundou a Puerto Rican Merchants Association, Inc., que dirigiu durante a década de 1970. Entre as organizações culturais que fundou estão o Club Cultural del Bronx (Bronx Cultural Club) e a Casa Borinquen. Ele também atuou como presidente do Círculo de Escritores y Poetas Iberoamericanos (Círculo de Poetas e Escritores Ibero-Americanos) e foi membro do Instituto de Porto Rico em Nova York (Puerto Rican Institute of New York). Em 1950, fundou uma revista intitulada La Voz de Puerto Rico en Estados Unidos.


ÁRVORES

Essas árvores
que não enchem seus bolsos
de aguaceiros,
que não vivem só
de verdes pensamentos
amarelos.
Mas que afiam as folhas
para antecipar o curso
futuro de seus frutos.

Essas árvores
que aprendem com a chuva
a não molhar os pés,
mesmo quando a água sobe
até a cintura.

Essas árvores
se comunicam com a donzela que está
sofrendo para que multiplique
o número de seu amante por si mesma,
para que ela possa dizer
amado multiplique-se dentro de mim,
para que quando a emoção
se aproximar de seu quadrado
sua imaginação cative
a palavra com lábios.
Essas árvores
dão-lhe abrigo
à opinião desamparada
que tão eloquentemente cultiva o anonimato.
Onde a madeira
verde da chuva
brota em labaredas
pelos dedos…

Aquelas árvores
produzem tecido e combustível
de seus solos
com a neve impossível do verão
com o que acontece
na noite de abril
de qualquer mês de maio
para que o impossível escale
na alegria do seu infortúnio
o cume intransponível
do que a claridade não deixa ver.

Aquelas árvores
amadurecem sua ida em sua vinda,
aprendendo a sair quando chegar.
Essas árvores
que lavam
com o coração
a casa desabitada do afeto,
onde o choro
não tem tempo
nem de lamentar sua morte;
onde a esperança
não espera
para desatar-se em chamas
pela dolorosa
vizinhança do desalento.

Essas árvores
que valem a pena
sair correndo
a gritar pelas janelas,
amarrando
a voz dos vizinhos
para que desçam
para se despedirem
de sua própria despedida.

Essas árvores
quem meditam
sobre aqueles que desperdiçam
o fluxo de seu talento
para ter a certeza
que o sol não os compreenda,
–aqueles que gastam
prodigamente
a manhã da donzela
que está com dores-
aqueles que atropelam
a infância dos caminhos,
aqueles que sabem tudo
menos o que não sabem.


[EU O CONHECI]

Eu o conheci
aprendendo
a fazer
com palavras morenas de tuatúa,
devaneios de tártago, vigília
de groselhas, idílios de limão,
contágio de lírios, açúcar acre,
jóias de cabañuelas, jui de nostalgia
entre presságios amargos, asilos de ravinas
entre saudações amargas de jasmim,
beldroega de imunidade
para nutrir
de pedra previsões de barro, de terra
ferida na têmpora
por seus frutos minguantes;
idealidade do aço fundido em Juan Cuchilla
e em Juan Bobo: chefes da infância encantadora,
cordilheiras que carregam
em suas ancas pelo ar às crianças
iniciadas nos contos heroicos, onde aparecem
tigres que entendem
suas palavras, lobos uivantes
de amor pelos vizinhos, encantadoras namoradas que andam
sobre a água, lagos com olhos de leões
caçando
nuvens com jubas de madrepérola,
trovão como panteras passeando
as crianças curiosas nas asas,
batalhões com cabeças de estrelas
lutando no interior de uma laranja
pela menina que sai do banho
de um rio morto à margem de um grão de mostarda;
baleias encantadas como cobras bailarinas
lançando o mar no chapéu das ondas,
castelos mágicos do tamanho de um lírio
onde só os heróis conhecem
as sereias, onde só as crianças cativam
aos heróis, onde o céu
passeia de bicicleta,
onde toda a terra continua
sendo criança como um conto de fadas delirante
que nunca dá
as costas
aos seus belos castelos,
por Juan Bobo e Juan Cuchilla,
para os heróis de todas as crianças,
pela terra dele e de todos.

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