3 Poemas de José Luis Appleyard (Paraguai, 1927-1998)

| | ,


Curadoria de Floriano Martins
Tradução de Elys Regina Zils

José Luis Appleyard nasceu em 5 de maio de 1927 e faleceu em 14 de fevereiro de 1998. Foi um poeta, dramaturgo, advogado, jornalista e editor paraguaio. Pertence à chamada “Generación del ‘50” na poesia paraguaia, junto com José María Gómez Sanjurjo, Ricardo Mazó e Ramiro Domínguez, entre os mais notáveis ​​representantes desse período. Por quase duas décadas fez parte do corpo de jornalistas do jornal “La Tribuna”, de Assunção, meio de comunicação no qual também desempenhou as funções de Chefe da Área Cultural e diretor do suplemento cultural aos domingos. Foi editorialista do influente jornal matutino de Assunção e, com o nome de “Monólogos”, publicou uma coluna que alcançou grande popularidade ao abordar temas da atualidade ao escrever “como as pessoas falam” no Paraguai. Também trabalhou no jornal vespertino “Última Hora”, onde sua coluna “Desde el tiempo que vivo” era uma das mais esperadas pelos milhares de leitores do jornal. Foi Presidente do PEN Club del Paraguay e, sendo Membro Titular da Academia Paraguaia de Língua Espanhola, foi secretário da importante instituição cultural.

O próprio poeta, em um breve escrito de junho de 1981 que abre seu livro “Tomado de la mano”, em relação aos seus poemas, expressa: “E é assim, segurando as mãos deles, me vi em uma longa trajetória de anos, dias e horas que me deram um pouco de tudo. Nesse transitar apoiado em meus versos me senti triste e feliz, me senti oprimido pela solidão e mais ainda pela companhia sempre passageira. Eu me vi criança em Areguá. Eu me vi como um jovem estudante em Buenos Aires.

Voltei a me sentir na Academia Universitária, essa bela experiência que um grupo de amigos criou. E também me olhei, cabelos já brancos, barba grisalha, assim como sou hoje”. E acrescenta: “Os olhos de quem me lê não verão a mesma coisa.

Mas pode ser que reconstruam não a minha imagem, mas um caminho em cujas margens está sempre a vida. Se isso for alcançado, os versos terão cumprido sua missão de deixar algo da minha voz nestas páginas. Se não, continuarão sendo filhos, nasceram-me na maioria dos casos com dolorosa angústia, filhos meus que permanecem indefesos, sozinhos e indefesos de quem lhes deu a efêmera ou definitiva vida em um poema. Permanecem com o leitor, desamparadamente sozinhos, esses poemas. Que eles digam, se é que a têm, sua verdade”.


A CASA

Uma casa é um ombro derrotado
é uma mão aberta sem semente,
uma argamassa inútil, um enlutado
conjunto de tijolos desbotados,
um pensamento absorvido no passado
que atravessa com suas vozes o presente,
é um escuro pedaço de poente,
é um brinquedo antigo e esquecido.
Uma casa é um pranto, uma dor
varanda sem borboletas saudosas,
uma casa é silêncio e é alarido,
é um amor que morreu sem amantes,
Uma casa, Senhor, é uma infância
fugidia e malferida de distância.


INFÂNCIA

Está a casa em sombra de amapola
aberta e singular, sem batimentos cardíacos,
como se todo o mundo quebrado de seu sangue
em seiva branca o ócio convertesse.
Não há vozes, se houvesse, definiram
um vegetal emergido de tristeza
com seu mutismo passado e presente
morto de luz na ânsia pelo som.
No saguão escuro que boceja
o mármore de seus degraus há um conto
com consolo de infâncias transparentes
encurralando um mudo de beleza.
Seu pátio sempre pátio e firmamento
de uns olhos ausentes tem rastros:
há uma árvore adormecida e os azulejos
azulmente disfarçam seu cimento.
O corredor – pilares sem queixas
sustentando uma sombra de telhas –
perdeu os passos de alguma criança
e os procura, noturno, nas estrelas.


COMO O CÍRCULO REGRESSA

Estar em mim para dizer as coisas
e dizê-las assim, com as palavras,
com vocábulos simples com que nomeio
um tempo, uma alma, um coração ou um sonho.

Volver para dentro de mim todo o marasmo
da crucial gestão que como homem
realizo sem saber sobre a terra.

Já silenciou o contorno,
aquietada a fissura,
emudecido o eco,
tornar-me em espiral em direção a esse centro
de solidão que anseio.

Voltar ao meu retorno
não com vozes de escuridão, de distâncias,
perdidas ansiedades,
mas, simplesmente,
como regressa o círculo
ao ponto primeiro
tornando-se infinito.

1 comentário em “3 Poemas de José Luis Appleyard (Paraguai, 1927-1998)”

Deixe um comentário

error

Gostando da leitura? :) Compartilhe!