3 Poemas de Paola Valverde Alier (Costa Rica, 1984)

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Curadoria e tradução de Floriano Martins

Os livros de Paola Valverde Alier têm a ver com as mãos: luvas para entrar no ringue com a exibição cênica da Cadela de Pavlov, alter ego poético de uma história de amor e desenraizamento que, depois de cuspir o protetor bucal do machismo, mostrou – a punho limpo – A quinta esquina do ringue.

Mãos capazes de servir cervejas, limpar o bar e tomar o microfone de uma jukebox nas páginas do Bartender, em frente à trilha sonora da noite.

Com os dedos espalhou o tabaco sagrado na folha do milho para fazer uma prece, atenta às direções estelares que vibram no tecido da sua clareza.

Quando os cactos florescem, também tem sido uma forma de levar as mãos ao jardim para cuidar do amor como o anjo de um bambu.

E com as mãos – é claro – ela guiou seu avô, O treinador de pombas, para homenagear a história de sua diáspora materna.

Mãos e sementes, mãos para defender-se e ofertar, mãos em forma de poesia.

DENNIS ÁVILA


A VIDA ANTES DA VIDA

Os rios perpetraram a casca das árvores
a voz da selva
                                permanecia satisfeita

Forte como o jaguar
                      valente como a sucuri!

Antes de nascer
fui um pequeno botão de luz

Tomei a forma de uma cordilheira
explodi em tons de turquesa

e do sangue
armazenado no meu sexo
brotou
uma debandada de beija-flores

O fogo
era um fio costurado ao sol

O verde
não domava a chama

A mulher que protegia a tempestade
Deixou cair os raios
                 e se transformou em um pássaro


A MULHER ÍMPAR

Porque sou uma mulher ímpar
calço o número
das fechaduras proibidas
desato meu cabelo em plena chuva
e odeio açúcar no café

Eu me maquilo a sós para dançar comigo
detenho as horas e os caminhos
canto o silêncio das concubinas
sou seu prazer

reconheço a nudez nas palavras
gozo com elas
me prostro diante delas
com a ansiedade das cadeiras vazias
nas esquinas

Sou ímpar quando amanheço
ou choro
a ordem seria distinta
se eu não soubesse ignorar as regras

Por isto revivo a memória dos afundados
sou esse barco
não exijo salvação
muito menos naufrágios

Prefiro a água quente
para culminar com frio
e então sentir tudo
na curta eternidade dos peixes
que andam de um lado a outro
como se a primeira
viajassem pela última vez


O AMOR É DE BAMBU

Não existe nada mais forte do que este amor.
Seu corpo se dobra
e não se quebra.
Suas costelas forjam a cana
para nos alimentar;
sulcam o sal
os dentes assassinos

o vento sopra até a medula.
Traz areia nos olhos
para cegar
os videntes.
Traz espuma na boca
e flutua.
Flutua com a ponta erguida.
Desenha um anel na água,
um eco.

Mordo essa cana,
sua raiz convulsa
o fio de saliva
que sustenta o anzol.
Mordo as peras quando amadurecem.
Minha voz empapada em teu ouvido.

A pedra do silêncio
tropeça com este bambu.
Tomo a tua asa para cruzar a calçada.
Tomo a tua asa e vejo o tempo.
Choro em um pódio
Diante da realidade acobreada.
Choro e me esfumaço
como o valor sobre os lagos.

Sou a mulher que acreditou em uma debandada
e viu nos olhos de seu amante
a origem de um fogo.

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