Edilberto Cardona Bulnes (Honduras, 1935-1991)

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Curadoria de Floriano Martins
Tradução de Elys Regina Zils

Edilberto Cardona Bulnes (Honduras, 1935-1991). Poeta. Obteve o Prêmio Café Marfil na Espanha em 1973 com a coletânea de poemas Los Interiores. Seu livro Jonás foi publicado em 1980, em EDUCA, na Costa Rica, e – segundo o mito – seus quatro mil exemplares desapareceram ao chegar a Tegucigalpa.


DESPEDIDA

Deixar a paz construída com mágoas,
o pedacinho de um sonho pela metade,
o véu púrpura rasgado, e o telhado
caído do laurel com açucenas.

Sabia tudo sobre vertigem, e apenas
uma lágrima basta para o peito,
e no rico esgoto que estreitamente desce
seja qual for o meu amor se vai em areia.

Que esta casa veio e era minha
se recusaram com um golpe as janelas
ignorando as aves do dia.

Vou embora. Acabou. Minhas mãos vão abertas.
Aqui sempre meu amor em coisas vãs.
Atrás choram os arcos de minhas portas…


JONÁS [fragmentos]

21-X

Não há absolutamente nenhuma necessidade do poeta no mundo. Nunca. Já que a vida de sua poesia nunca se dá sozinha, apenas em sua poesia para entrarmos na poesia, na vida poética, na vida da poesia, na outra vida, na poesia do homem, da vida e do mundo, e nos dar tudo ao máximo só a imagem sozinha para encontrar nela nós sós a medida só da nossa imagem só, a medida do silêncio, do silêncio à palavra, do espelho à ilusão, da realidade, da realidade à ficção, da verdade à mentira, da morte, da morte à vida, a proporção que a ficção está para a morte o que a morte está para o nada, ou a identidade que a verdade está para o amor o que a realidade está para a vida, e nesta dimensão poder saber até que ponto são em ficção amados os belos ídolos do amor ou em verdade amado o deus vivo do Amor, e até que ponto somos e estamos de verdade no tempo da vida ou na vida do tempo e no ser da vida ou na vida do ser e ser vivo tempo do ser, ou se estamos e não sabemos na ficção de ser como peixes cegos de uma impossível antártica inexistente para um princípio desde o princípio morto no fundo, ou no bumerangue de ninguém perdido para ninguém, ou no gelo selvagem de uma navalha de barbear não tanto porque se nos empurra uma morte diferente, brutal, selvagem, que afinal teríamos de conhecer, mas porque através dela algo não humano se apresente algo no humanóide, humanesco, algo que infelizmente não alcança nem a mais triste sombra de uma árvore feita de pedra. É nada. Casa do ser: casa de Deus. Nada. Puras palavras. Não há mais ato do ser de ser. Esta flor. Esta grama. Nada. Sangue de Abel e sombra. Nada. Palavras. Coalhos de luz. Simples palavras; pura palavra pura. Não sei onde o que no fundo deste lenço branco.

22-V

Eu não tinha, não teria desejado isso. Teria desejado, não sei, outra coisa. Teria até, querido fugir da Voz. Eu não queria isso. Eu queria outra coisa, outra margem de luz. O que importa o que eu queria. Minha voz subia por aqui, e hoje, com os lábios queimados, não quero mais, não quero menos. E o que importa o que eu quero ou quererei, o que teria ou terei querido. Aqui, desencantado, des-encantado tudo, não posso ser feliz. Sem espelho nem moldura esta alegria: não serei feliz. Gozo deste inferno. Vivo. Alegria sem limites nesta ardente arena. Não quererei nada nesta fervente poeira. Agora este inferno é o meu paraíso. Não quero nada.

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