Curadoria e Tradução de Gladys Mendía
Idea Vilariño nasceu em Montevidéu (Uruguai) em 18 de agosto de 1920 e faleceu em 2009. Foi uma importante poeta, tradutora e crítica literária que também compartilhou seus conhecimentos como educadora na Faculdade de Humanidades e Ciências da Educação. Sua obra foi traduzida para vários idiomas e lhe rendeu inúmeros prêmios internacionais. Alguns dos títulos mais famosos são La suplicante, Nocturnos e Poesía. Neles, pode-se encontrar uma poetisa intensa e intimista que, acima de tudo, escreve com uma coerência sempre notável. Idea fez parte da chamada Geração de 45, formada a partir do encontro de vários artistas com Juan Ramón Jiménez, um dos poetas mais importantes da poesia andaluza; deste grupo também participavam Juan Carlos Onetti, Emir Rodríguez Monegal, Mario Benedetti e Gladys Castelvecchi, entre muitos outros. Mas sua paixão artística não se resume à literatura, ela também dedicou muito tempo à música, colaborando com a criação de importantes canções da música popular, como “La canción y el poema”, co-produzida com Alfredo Zitarrosa, um dos gênios da música uruguaia.
DESNUDEZ TOTAL
Já em total nudez
estranha ausência
de processos e fórmulas e métodos
flor a flor,
ser a ser,
ainda com ciência
e um cair em silêncio e sem objeto.
A angústia tornou-se
apenas um sabor,
a dor já não cabe,
a tristeza não alcança.
Uma forma durando sem sentido,
uma cor,
um estar por estar
e uma espera insensata.
Já em total nudez
sabedoria
definitiva, única e gelada.
Luz a luz
ser a ser,
quase em ameba,
forma, sede, duração,
luz rejeitada.
AMOR
Amor
desde a sombra
desde a dor
amor
te estou chamando
desde o poço asfixiante da lembrança
sem nada que me sirva nem te espere.
Te estou chamando
amor
como ao destino
como ao sonho
à paz
te estou chamando
com a voz
com o corpo
com a vida
com tudo o que tenho
e que não tenho
com desespero
com sede
com pranto
como se fosses ar
e eu me afogasse
como se fosses luz
e eu morresse.
Desde uma noite cega
desde esquecimento
desde horas fechadas
no solitário
sem lágrimas nem amor
te estou chamando
como à morte
amor
como à morte.
NÃO SOUBESTE
Pobre meu amor
acreditaste
que era assim
não soubeste.
Era mais rico que isso
era mais pobre que isso
era a vida e tu
com os olhos fechados
viste teus pesadelos
e disseste
a vida.
TUDO É MUITO SIMPLES
Tudo é muito simples muito
mais simples e, no entanto,
ainda assim há momentos
em que é demais para mim
em que não entendo
e não sei se rir às gargalhadas
ou se chorar de medo
ou ficar aqui sem pranto
sem risos
em silêncio
assumindo minha vida
meu trânsito
meu tempo.
VIVE
Aquele amor
aquele
que toquei com a ponta dos dedos
que deixei que esqueci
aquele amor
agora
em umas linhas que
caem de uma gaveta
está aí
continua aí
continua me dizendo
está doendo
está
ainda
sangrando.