3 Poemas de Rosaura Mestizo Mayorga (Colombia, 1951)

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Curadoria de Elys Regina Zils
Tradução de Floriano Martins

Rosaura Mestizo Mayorga (Suesca, Cundinamarca). Poeta, contadora de histórias, advogada, profissional em administração educacional e professora, animadora de oficina. Colaboradora e gestora do Festival Internacional de Poesia de Bogotá; da Conferência de Poesia da Universidade de Bogotá na revista Ulrika. Colaboradora do Festival Ibero-Americano de Poesia-Fusagasugá. Publicou os livros Semiótica del silencio (2007), Para no Seguir Callando (2017) e No lo contó la Caoba (2021). Convidada para leituras de poesia e festivais: locais, nacionais e internacionais. Membro do Círculo Literário de Educadores Aposentados (CLEP). Membro das Leituras Urgentes de Poesia de Cundinamarca e Bogotá.


EPITÁFIO AGÔNICO

Um olhar no vazio diz tanto que não diz.

A fragmentação migrante da vida
está no próprio precipício da morte.
Estremece
o murmúrio do aviso da sua viagem
cavalgando o silêncio agudo.
Estremece
o aceno de suas mãos
buscando o extravio.
Estremece
A pulsação errante da areia
sua poeira fugidia
o sorriso sonâmbulo
como se buscasse as bolas de gude que quando criança
no cinco-buracos aninhava…

Resta o ar no artifício da noite.

Nunca soube que sua mãe se afogou em lágrimas.
Nunca soube por que estava acostumado
de leste a oeste
com o zumbido das balas.


UMA VIAGEM COM KAVAFIS

Ao embarcar em tua viagem para Ítaca
Pede que o caminho seja longo,
cheio de aventuras, cheio de experiências.

Constantino Kavafis

Coloque o dedo indicador na ponta do meu nariz
pede aos meus olhos o caminho mais lento
                                                                        na fantasia desta viagem.
O universo deve apontar para a estrela
                                                                        que te conduzirá a
                                                                        Ítaca.
Lá, no agitado porto, minha eclusa te espera.
No caminho beberás vinho sagrado
com Odisseu, Penélope, Telêmaco,
indagarás sobre esse ventre em que teu delírio pretendes mergulhar.
Aqui, entre fios, te espero.
Mas a tua jornada ainda não acabou.
Sentirás a brisa do oásis como o Éden do efêmero.
Apenas,
                  querido,
                                    estás chegando
                                                      à primeira estação.

Minha paciente calma sabe o que procuras,
mas além de um manancial, o pesadelo te invade
a concupiscência acelerada te aproxima da morte prematura.

Volta a meus lábios
sente como se eu estivesse respirando
confirma que ainda estás vivo
reinicia o trabalho.

Quantas viagens estão por vir?
indagam às minhas as tuas pupilas de criança.
–Não sei–.
                                     Ítaca, em tua busca é a miragem
mística, não carnal
minhas mãos respondem ao teu peito
a massa da minha barriga à sua tremedeira
entre o deslize do sorriso.

–Constantino–,
                                   acende tua tocha novamente
Constantino Cavafis
deseje que juntos circunaveguemos o amor
                                                      depois…
                                                      que a morte venha sobre nós.


NA LINGUAGEM DOS CÃES

O cão
observa a letargia do sono denso de seu dono
sua aparência habitual e a mesma roupa de todos os dias.
Não há flauta ou violino,
nem grito do trânsito ou bater no cimento
que lhe arranque a mortalha e a oração
nas horas de seu transe.

Apenas o passo impetuoso do papel e os dejetos
acompanham seu jejum prolongado.

Por muito tempo, desperta entre seus mortos e bebe,
volta a beber,
a mesma poção que o liberta do espírito de ninguém

Assim segue o cão, lambendo as feridas
lambe com tal gosto, com tal força
que transforma a lambida em uma mordida.

Mais tarde, quando o homem volta de sua vertigem
Também o lambe, a fome dos dois
e o cão, carinhosamente o saúda.

Passa um homem, uma mulher, uma criança
levam seu animal de estimação vestido e perfumado.
Somente ele os saúda.

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