4 Poemas de Winétt De Rokha (Chile, 1894-1951)

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Curadoria de Elys Regina Zils
Tradução de Gladys Mendía

Winétt de Rokha (Santiago de Chile, 1894-1951). Nasceu com o nome de Luisa Anabalón Sanderson. Era filha do coronel do exército Indalecio Anabalón y Urzúa e de Luisa Sanderson Mardones, cujo pai foi o poliglota e gramático Domingo Sanderson, tradutor de autores clássicos como Safo de Lesbos e Ovídio. Ela cursou sua educação básica no Liceu # 3 de Santiago, Chile. Sua incursão no meio literário começou com a publicação de versos de influência parnasiana e simbolista dedicados a São Francisco de Assis na revista Zig-Zag, sob o nome de Luisa Anabalón Sanderson. Em 1914, decidiu enviar um livro de poemas de sua autoria, intitulado Lo que me dijo el silencio (O que o silêncio me disse), ao poeta Pablo de Rokha, sob o pseudônimo de Juana Inés de la Cruz. Em 25 de outubro de 1916, Luisa Anabalón e Carlos Díaz Loyola, nome real de Pablo de Rokha, se casaram. A partir desse momento, ela adotou o pseudônimo literário de Winétt de Rokha. A família finalmente se formou com seus filhos Carlos (poeta), Lukó (pintora), Tomás, Juana Inés, José (pintor), Pablo, Laura e Flor. Carmen e Tomás morreram quando eram muito jovens, enquanto Carlos e Pablo morreram já adultos e de maneira trágica. Suas obras incluem: 1914 Horas de sol, 1915 Lo que me dijo el silencio, 1927 Formas de sueño, 1936 Cantoral, 1943 Oniromancia, 1951 Suma y destino.


X

O chorar de um crepúsculo
vem a mim estremecendo-me
com tremores de estrela
e rumores de fonte.

As rosas empalidecem…
Vagas incertezas
me pegam, lentamente,
e me afundam em seu colo.

Penso no amanhecer chorado
de um sonho
que reflete sem febre
a lua de um espelho…


SANTIAGO CIDADE

Às tuas margens ainda cantam as rãs azuis,
mas em teu coração a multidão busca ritmo
com aquele sotaque elétrico, ardente e cosmopolita do avião em voo.

Cidade americana, audaciosa e triste,
te cerca uma alta muralha, de onde cai sobre ti
a influência branca e boreal das neves silenciosas.

Torres como chamas, arranha-céus que iluminam a tarde,
avenidas em direção ao horizonte, praças amorosas, campanários do passado,
a alegria de fontes italianas, estupefatas, águas inocentes eretas,
que balançam uma lei que treme,
águas do crepúsculo republicano
harmonia do mar, diminuída,
para os ombros das mulheres loiras,
para as pernas escolares das crianças.

Em direção aos bairros que se multiplicam ingenuamente,
as pessoas avançam preocupadas, apressadas com suas próprias vidas.

Os bondes ecoam sobre as antigas pontes de Recoleta,
e ali, à vista das igrejas e das vastas mansões,
ainda sentimos nas pupilas das rezadoras ancestrais,
miçangas e sonhos, misturados com um Menino Jesus de pele rosada.

Agora ascendemos com o coração simples e sereno,
o lar escondido, o ninho de cada um, perdido
entre as abelhas e os parreirais de Pedro de Valdivia,
Ñuñoa, El Nido, como nas pombas, nas formigas ou nas não-me-esqueças.
Parque, Quinta, Alameda das Delícias,
a bela e incerta peregrinação do espírito.

São Francisco, casa do Mito, não interrompe o poema,
que se perfuma a seus pés, por esse ramo eternamente vivo das aldeias,
Santa Ana, nos pórticos dos quais brincavam os avós e as andorinhas de antigamente,
e onde todas as bonecas eram batizadas.

Você guarda o caminho dos dias evaporados;
aquele salgueiro de cobre oxidado, aquele banco municipal,
sua sombra e minha sombra iluminadas com uma nova pele e esperanças,
a tarde, abundantemente estrelada de murmúrios e azuis românticos,
e, como um lótus negro, magnético, aberto,
a noite distante, acolhedora, contendo a quantidade de nossas almas.

Queimando como a palma de uma mão franca e estendida,
você se entrega ao imigrante. Muito a percorrer, muito a percorrer…
como nos contos que nunca chegavam à cidade das cúpulas de ouro.

Álgebras de carros te abraçam e te possuem,
teatros e cinemas acendem seu alvoroço, e os letreiros proclamam:
Greta Garbo, a nórdica iluminada e pálida.

Você se submerge, se eleva, se estende, lava sua alma,
cidade.

Homens e mulheres-crianças, atrás das lojas ocidentais,
Gath & Chaves, impassíveis,
olhando as cinturas de prata do Oberpaur,
a loja lírica e tranquila, arquitetura despreocupada,
com a harmoniosa pincelada de Matisse.

Da minha vida, olho o San Cristóbal,
o morro que justifica seu estilo como o couraçado no porto;
aquelas luzes que brincam nas ondas,
os holofotes que, minuto a minuto, se abrem como pálpebras,
e branco, sozinho, mudo, no alto, a lenda de Jesus Cristo,
branco, sozinho, mudo.

Em seu jardim de mortos, deitado entre estátuas pálidas,
está murcha a melhor coleção de flores de nossa casa,
e a figura ferida que dormiu sobre meu coração na primavera.

Na juventude de seus parques, eu escrevo
cavalos e aspectos de novidade, traçando a linha de nossos heróis,
cavalos de mármore, em cujas bocas abertas,
penetra este vento que você e eu amamos, borboleta em fevereiro,
a pata fincada e determinada,
os olhos com luz côncava, cheios de amanheceres e noites imensas.

Seu orgulho provinciano escala o Santa Lucía;
lembro minha alegria aos sete anos,
correndo atrás da roda saltadora
e como via lá embaixo um mundo bem pequeno.

Santiago, cidade,
acordada e adormecida, dignamente, em si mesma;
você abre as portas;
piscinas, quadras de tênis, prisões, fábricas,
o rico com sua carga de ouro,
o pobre com seu fardo de sombra.

A vida acontece em você, como em Constantinopla,
Paris, Londres, Genebra, Nova York, Roma;
os eventos e as estrelas a visitam,
e talvez uma canção sem nome
ou o nome milenar de uma canção…


POEMA

A lira de algum satélite desfigurado, instigado, declamador,
rompe circunferências que queimam, quebradas; tetos oferecem alívio
com um foguete do além-túmulo em muros de aldeias, avermelhados.

Com sua suja libré, uma cidade crescente, fábricas
com a amplitude de ruas irmãs pelo anel e o futuro das feridas:
trabalho, hipotenusa, lixo, movimento em combate de agonia e círculos.

Fumaça espessa contornada, colmeias à mostra, senhores serenos, machucados,
sentados em promontórios, indefesos nos pórticos corroídos.

Cartazes lunares. Pelo Guayas, a ninharia, os perigos,
a intermitência, os telegramas e o rubro de alcatrazes amaldiçoados.

Algo geme cruel, aumentado, na garganta dentada, sanguinolenta,
de alguns peixes quadrados, artesãos, em navios de signos atores
a voz bordada da criatura feia se mata quintessenciada,
medrosa e espetacular em seu desenvolvimento barato e vago.


MIEL Y LAURELES DE CHILE

Seu nome de ouro e prata brilha nos pássaros do Sul,
as crianças o transmitem nas lousas escolares do espanto,
em cada nova canção está presente,
as mulheres silenciosas o levam no seio de seus corpetes negros,
e os heróis de ontem o enfeitaram com seus capacetes e almas de pedra:
porque o Chile é assim: leve como a asa do mundo,
imenso, enriquecido pela pomba internacional da simplicidade,
igual a um violino no violino do vento,
florescido de amor no olhar da donzela no cio,
forte como a razão e a dor do exílio.

Cruzada de poesia em arco-íris
entre voos espetaculares interoceânicos,
lembrei da flecha azul de suas terras finas
beijadas, integralmente, pela carta-espuma do mar
e pela intocada sinfonia insular dos rios.

Como em seu coração-campainha, estala o eco do trovão
que se estende com som e esplendor em seu mapa de frutas,
entre a pezuña assustadora do cavalo selvagem
e a úbere tremida do rebanho em fuga!

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