3 Poemas de Claudia Lars (El Salvador, 1899-1974)

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Curadoria de Floriano Martins
Tradução de Gladys Mendía

Margarida do Carmen Brannon Vega, conhecida pelo seu pseudônimo Claudia Lars, foi uma poetisa salvadorenha. Sua obra é considerada de um depurado lirismo e destaca-se por seu domínio da métrica. Seus pais foram o engenheiro estadunidense de origem irlandesa Patrick Brannon e a salvadorenha Carmen Vega Zelayandía. Durante sua infância, foi amiga de Consuelo Suncín, que foi esposa de Antoine de Saint-Exupéry.

Desde cedo recebeu influência dos clássicos antigos e espanhóis (Góngora, Quevedo, Fray Luis de León), bem como dos românticos ingleses e de Rubén Darío. Também conviveu com alguns de seus contemporâneos, como o contista salvadorenho Salarrué.

Poetisa precoce, aos dezessete anos publicou uma breve coletânea de poemas que passou despercebida, Tristes miragens, que veio à luz graças ao mecenato do general e poeta Juan José Cañas, um de seus primeiros mentores.

Claudia Lars pertence à estirpe das grandes poetisas da América, à essa lírica feminina (não por feminista, mas feita por mulheres plenas) que tirou a poesia latino-americana de sua prostração recatada, fruto da sensibilidade do século XIX. Cantaram o amor com viradas eróticas estupendas; com límpida inocência, invocaram a fertilidade de seu corpo, sua fecundação, o gozo de viver, mães que esperavam um amanhã alegre para seus filhos, paixão materna que as convertia em terra que esperava a semente de uma nova vida.

Claudia Lars escreve uma poesia transparente, sem deixar de ser profunda; às vezes sua mestria formal a ganha e esquecemos sua mensagem, mas em cada poema seu encontra-se um poeta manifestando vivências, abrindo caminhos antes inéditos para nossa sensibilidade, comunicando um estado de graça nunca antes dela nem depois encontrado na poesia escrita por mulheres em El Salvador.

Claudia Lars viveu alguns anos nos Estados Unidos e, ao regressar a El Salvador, conviveu com os intelectuais da época, entre eles Salarrué, Alberto Guerra Trigueros, Serafín Quiteño e Alberto Masferrer. Em 1933 começou a usar o pseudônimo Claudia Lars. Publicou o livro Estrelas no poço em 1934.

Esta obra, bem recebida por críticos e leitores, pavimentou o caminho do seguinte livro de poemas, Canção redonda (1936), ao qual seguiu, após um hiato, A casa de vidro (1942). Neste período fértil, publicou também Romances de norte e sul (1946), Sonetos (1947) e Cidade sob minha voz, livro premiado no Certame Comemorativo do IV Centenário do Título de Cidade de San Salvador.

Nos anos seguintes, Lars, como adida cultural da embaixada de El Salvador, partiu para a Guatemala em 1948.

Voltou a El Salvador e publicou Aonde chegam os passos (1953) e Escola de pássaros (1955).

Em 1959, publicou Fábula de uma verdade e Terra de infância, obra que apresentou como suas memórias poéticas. Em 1961, imprimiu uma mostra antológica de seus versos destinados às crianças (Girassol), que foi complementada no mesmo ano com uma seleção do restante de sua produção lírica (Presença no tempo). No ano seguinte, seu livro de poemas Sobre o anjo e o homem foram distinguidos com o segundo prêmio do Certame Nacional de Cultura, e em 1965 foi homenageada com o primeiro prêmio do certame comemorativo do cinquentenário dos Jogos Florais de Quezaltenango (Guatemala), por seu livro Do fino amanhecer. Sua última obra, Nosso pulsante mundo, seria publicada em 1969.

Desde seu livro inicial, Estrelas no poço (1934), o ideal poético de Claudia Lars ficou evidente: a transparência, a simplicidade e a ternura como revelação da beleza, através de um notável conhecimento formal do verso. A paisagem e os seres que a habitavam, assim como o tema familiar, influenciaram-na profundamente, como refletido em A cantora e seu povo. Ela mesma declarou: «Sob os temores e as superstições que com os anos se iriam desprendendo da minha credulidade como folhas sem seiva, a avó semeava em minha mente ideias magníficas: a diferença que há entre a cobardia e a ação heroica; entre a pureza da alma e os baixos instintos corporais».


RETRATO

Ternura móvel que enraizou ao meu lado,
grande criança sem nome e sem abrigo;
hóspede do sonho em corpo verdadeiro,
obscuro coração iluminado.

Acerto do dia, resquício do passado,
doce machucador e hábil curandeiro;
mina de veias rompidas e manancial
que sem reserva dá o que tenho buscado.

Seu silêncio tão longo tem agora
pássaros iridescentes e despertos
sob uma luz madura e vencedora.

Das cinzas chegou sua forma erguida,
e em rumos do sangue seu chamado
devolve a palavra dos mortos.


SONHO

Fui pelo ar, após a luz caída,
pisando sinais e cores planas
e levava, nua, entre as mãos,
a flor de ontem, erguendo nova vida.

Uma pomba leve e distraída
buscou a espiga de grãos celestes
e em caminhos profundos e distantes
ficou minha própria forma detida.

Derrubadas muralhas, lançamento
de um novo coração à doçura
e o medo e o amor cruzando espadas.

À deriva um ai!… de não sei onde,
e a morte, impassível, que se esconde
no reflexo de rostos esquecidos.


PALAVRAS DA NOVA MULHER

Como abelha obstinada
exploro reinos inefáveis
que desconheces
e ao entrar na memória do teu coração
marco paisagens virginais.

Aqui a eternidade
modificando nosso minuto!
Não posso ser abismo:
com a luz se fazem vinhedos
e giestas.

Pertenço à nudez
da minha linguagem
e queimei silêncios e mentiras
sabendo que transformo
a história das mães.

Mulher.
Só mulher.
Entendes?
Nem passarinho do necessário abrigo,
nem alimento para animais desejosos,
nem bosque de campânulas onde o céu se esquece
nem uma feiticeira com seus pequenos monstros.

Ó poderes do homem,
erguendo mutações
de frágeis rostos!
Ó esplendor oculto no meu santuário
agora sob a excelência
de íntimos anjos!
Será que meu amor te diz
que busco um amante
com testa imortal?

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