3 Poemas de Vadik Barron (Bolívia, 1976)

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Curadoria de Floriano Martins
Tradução de Elys Regina Zils

Vadik Barron (Bolivia, 1976). Cantor, compositor e escritor. Lançou nove álbuns. Publicou doze livros de poesia e um de prosa. Ganhou os prêmios nacionais de poesia Yolanda Bedregal (2013), Franz Tamayo (2018) e Edmundo Camargo (2021). Deu concertos e participou de antologias e festivais na América Latina e na Europa. É diretor da revista cultural La Trini.


LIBÉLULA

A libélula é um anjo caído em desgraça
que doma –incansavelmente– o ar arisco.

A libélula é filha do helicóptero e da abelha,
                                                    curiosa aventura.

Quando nos empresta seus olhos
                             podemos ver – durante o dia – as estrelas
                             que azulam.

Com o menor som,
nas paredes de gesso
sua escassa sombra se assusta.


EXTERMINADOR

O mundo é imundo e maravilhoso.
Eu te amo e te odeio mundo imundo.

Dê-me sua boca de esgoto, sua boca de molhada concha,
sua foz que desemboca num mar abstruso e constante,
perverso e indócil.

Dê-me sua mão de fogo, sua mão de árvore, sua mão fria na testa doente.
Quero sua alma de leite, de pássaro perdido, de sussurro ultrassônico, de bomba submarina.

Quero dormir no atol na noite em que se elevará o cogumelo atômico.
Quero ser um cidadão invisível, um poeta de bom coração e péssimo caráter.
Um zumbido de abelha no tímpano oco de um deus autista.
Uma pompa de luz que gere música que pode ser ouvida debaixo d’água.

O mundo é um fogo-fátuo no meio de uma festa infantil,
uma ferida aberta no silêncio furioso do cosmos.

O mundo está morto, abençoado seja, vamos mijar em seu túmulo,
vamos nos alimentar com os vermes que o corroem,
vamos morrer com ele, lenta e deliberadamente.

O mundo é um autômato feito de papel e parafusos,
cada pulsação é um jogo de dados,
uma incapacidade virtual, uma lisonja à morte.

Deus é o nome que damos a ele
que será o último assassino da humanidade.
Por isso que desejamos tão fervorosamente que retorne de uma vez por todas
de sua tumba branca e fecunda.
Por isso que amamo-nos uns aos outros
como alguém que lança pipas em um céu demente.


O AMOR

O amor não é amável
o amor não é paciente
o amor é a coisa mais próxima de uma cicatriz com asas.
É usar a alma como pele,
é abrigar uma joia
em um ninho sombrio
e ignoto dentro de nós.

O amor, bicho raro de mil pernas,
anjo concupiscente,
tira nossas roupas
nos tira do sério
vai nos fazer em mil pedaços um belo dia,
e nossos fragmentos
exercerão sua vocação de planetas em órbita.

Então seremos avistados a milhões de anos-luz de distância
como supernovas mestiças,
como OVNIs autistas,
como belas estrelas vagabundas.

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