3 Poemas Adela Zamudio (Bolívia, 1854-1928)

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Curadoria e tradução de Floriano Martins

Poeta, ensaísta, romancista, dramaturga, artista e professora, dirigiu a primeira escola laica da Bolívia em La Paz e fundou em 1911 a primeira escola de pintura feminina. Adela trabalhou ao longo de sua vida em prol dos direitos das mulheres e de sua independência social. Como amostra deste trabalho, lembramos que em 1914 publicou a nota “Temas Pedagógicos” onde manifestou sua indignação porque os jovens bolivianos, ao chegarem ao terceiro ano do ensino fundamental, tiveram que suspender sua formação, já que os programas educacionais não contemplavam o acesso ao ensino superior.

A obra colecionada de Zamudio está incluída na Biblioteca do Bicentenário da Bolívia, apresentada em 2014 graças ao impulso do ex-vice-presidente Álvaro García Linera, para comemorar os 200 anos da fundação da Bolívia a se cumprir em 2025. A cargo do Centro para Pesquisa Social (CIS) da Vice-Presidência, é um projeto editorial para publicar “os 200 livros fundamentais para a compreensão do passado e do presente do país”, expressa em sua página web. Não se trata apenas de reimprimir valiosas obras de história, ciência e arte esgotadas, a preços acessíveis para o povo, mas também visa cumprir uma tarefa pendente: “a inserção no ensino primário, secundário e superior de um corpus rigorosamente selecionados sob critérios estritamente acadêmicos ”.

Do ponto de vista literário, a escrita de Adela preserva os traços do romantismo da época, mas o transcende e em alguns de seus textos ela se situa perto de correntes de vanguarda como o modernismo. Entre as obras mais importantes mencionamos na poesia, Ensaios Poéticos (1887) e Ráfagas (1903), seu romance epistolar Íntimas (1913) e Contos (compilação de 1943).

Dentre os poemas de Zamudio, destaca-se “Quo Vadis” de 1903, com o questionamento da hipocrisia da Igreja, que vivia longe da humildade que proclamava e que escandalizava a sociedade de sua Cochabamba natal.

ANALÍA ÁVILA


EMOÇÃO BREVE

Pela escada azul da manhã
o limpador de chaminés.

Sua pele escamosa e suas sobrancelhas
Serpentinas, felizes

dançam.

Tudo pode ser mudado
Ele diz.

Nada me toca.

Tempestades breves

velozes se aproximando
as nuvens do oeste.

Boa água comprimida!

Este refúgio escuro.
Nossa dor.


AMANHECER

Mundo carnal, a primavera,
resina nos dedos, pegajosos
depois de abraçar a palmeira e
a crosta grudada,
sua opressão fraca que desperta
com um toque de vermelho e os olhos
velados pela tristeza, a proibição
pode descobrir o centro
do coração.
Qual foi a minha vontade
mas subir nas árvores,
chegar ao topo
e ver as estrelas à noite
brilhando em silêncio?

Acordou no mundo, agora amanhece
e sem sua vontade fica atordoado,
a preguiça infinita, a solidão
de nosso manancial infinito
alegria que exala essa ameaça,
essa melancolia.


PROGRESSO

Houve um tempo de amor contemplativo em que o saber,
muito pouco positivo,
confundindo a terra com os céus,
exaltava as virgens modelos.
E em que lhes inspirando um terror profundo
a realidade prosaica deste mundo,
as jovens de quinze primaveras
se extasiavam em quimeras místicas.
Porém desde que o homem sábio e forte,
compadecido de seu destino incerto,
discute com profundos pareceres
a educação moral das mulheres;
desde que definiu seu destino,
não apontando mais de um caminho,
e nem virtude ou utilidade concilia
sem a maternidade na família;

Elas sabem desde muito cedo
que amar um ideal é sonho vão,
que não lhe resta senão buscar namorado
e ficar solteirona é a pior desgraça.
Ninguém deve ficar desapontado
por escolher
– como antes sucedia –
que hoje ocupa o lugar da inocência
a luz prematura da experiência.
Hoje é preciso, do amor, ignorar,
porque ele é pobre e pede prazo,
e para sair o quanto antes do dilema
se deve aceitar o mais próximo e seguro,
de modo que todo homem hoje ao se casar
poderá com a certeza se consolar que
– não sendo a sua –
sempre será sua adorada metade de outro qualquer.

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