4 Poemas de Matilde Elena López (El Salvador, 1919-2010)

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Curadoria e tradução de Floriano Martins

Matilde Elena López (El Salvador, 1919-2010). Professora e escritora, reconhecida, sobretudo, pelos estudos literários, publicou também poesia, contos e teatro. Seus principais ensaios estão compilados no livro Interpretación social del arte (1965), no qual aplica as metodologias marxistas de dois húngaros, György Lukács e Arnold Hauser, à análise literária de obras clássicas, com resultados ao mesmo tempo historicistas e deterministas. Seus estudos críticos de poesia, porém, são admirados por suas leituras um tanto apaixonadas e pouco rigorosas. Abordou um tipo de narrativa subjetivista com o conto epistolar autobiográfico Cartas a Groza (1970), e uma poesia de estilo neoclássico em que aborda questões políticas e sociais, como em Los sollozos oscuros (1982). Em 2007, a Diretoria de Publicações de El Salvador publicou o primeiro volume de sua Obra Selecta, que compila um drama no estilo de uma tragédia grega, La balada de Anastacio Aquino, e toda a sua obra poética e narrativa.

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Quando o nome de Matilde Elena López é mencionado em El Salvador, a primeira imagem que surge é a da incansável professora acadêmica, que formou sucessivas gerações de estudantes universitários no campo da literatura. Falar de Matilde Elena López é referir-se a uma vontade implacável, a uma conduta imaculada, a uma visão permanente de futuro, a uma inspiração criativa sustentada, fresca e útil. Ensaísta, poeta, contista, dramaturga, sua obra se estende por várias décadas, desde o final da década de 1930, quando começou a publicar seus versos adolescentes em jornais e revistas. E nesse transbordamento sem excessos, o fio do seu espírito cultivado na literatura, na filosofia e na sociologia foi formando uma espécie de colar de luzes preciosas, no centro das quais brilha uma inteligência superior, polida no amor à cultura universal e em fervor pela sua própria cultura nacional.

Matilde Elena López pertence ao segundo grande lote de vozes femininas ao longo do século XX. Entre 1895 e 1905 nasceram cinco grandes criadoras de literatura: Alice Lardé de Venturino, Claudia Lars, Lydia Valiente, Tula van Severén e Lillian Serpas. Entre 1918 e 1924, o segundo grande surgimento do século deixou-nos quatro nomes muito significativos: Juanita Soriano, Lilliam Jiménez, Matilde Elena López e Claribel Alegría. São todas elas poetas; mas apenas uma é ensaísta de excelente envergadura, além de reconhecida cultista do conto e do teatro: Matilde Elena.

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Em complemento permanente do seu trabalho ensaístico e docente, Matilde Elena tem vindo a desenvolver um exercício dedicado no domínio da poesia lírica. Conhecer a sua raiz filosófica, que lhe permite aproximar-se das profundezas do ser. É natural que a poesia seja, na obra de nossa autora, um constante questionamento existencial. A sua poesia constitui-se, na coexistência das vozes centro-americanas do nosso tempo, como uma sábia lição de emotividade enraizada nas vicissitudes da vida. El momento perdido (1976), Los sollozos oscuros (1982), são etapas muito pessoais da aventura da alma em transe de comunicação. O amor – vital, incansável, sitiado – é o protagonista da poesia de Matilde Elena. Um amor que ela expressa com palavras simples e concisas, que deixa fluir a intensidade do sentimento sem barreiras. Poesia intensa, porque o ser do nosso autor é intenso. Basta ler o belo epistolar amoroso Cartas a groza (1962), para ter consciência desta nunca negada intensidade vital e criativa.

Matilde Elena López é também a nossa primeira ensaísta nacional em tempo e excelência. E, no friso da cultura nacional, seu nome brilha com brilhos de diamante.

DAVID ESCOBAR GALINDO


ESTOU EM PAZ CONTIGO

Agora sim
Eu posso ver o fantasma do mercúrio
e quebrar o espelho.
Eu posso no meio da multidão
Olhar o teu rosto
sem aquele galope
entre as veias.
Entretanto,
sentes meus passos
por aquele leve traço
do pássaro na folhagem.
Desde ali
Eu posso sentir teu choque
e aquele gesto envergonhado.
Como negar
a identidade que carregas em teu ser
e o que me pertence?
E como ignorar
aquela voz invisível
que ficou vibrando em teus galhos?
Como esquecer o sonho
que busca o sol
que foi roubado?
Estou em paz contigo.
Mas eles te cercam,
obscuros, os demônios.


ESTE AZUL INÚTIL

Para o azul indefeso
dos pássaros
eu peço proteção.
E uma lei que proteja
para sempre os poetas.
Um decreto de sementes de canário
para o trinado amarelo
e uma ilha encantada
para as doces liras.


MIRANDO A MIM MESMA EM TUA PINTURA

“Quero captar a poesia de teus olhos”,
me disseste, enquanto estavas na caixa
que deste a eles uma vida radiante,
e tudo em mim emergiu como uma deusa.

Minha imagem em tua pintura é um eremitério
que mantém um sorriso misterioso.
O desenho da minha boca é tão leve
que o beijo até parece vibrar.
Deste uma luz tão pura às minhas pupilas
que meus olhos te procuram e te atraem.
Bem, se já os roubaste, o que me resta,
senão continuar o roubo que começaste?
Talvez tenhas me pintado um pouco triste,
porque é possível que soubesses, sem saber,
que apenas tu poderia me dar vida.
Se pintar o objeto é possuí-lo,
objeto de teu amor eram meus olhos
por um ato de magia que conheces.


DISJUNTIVA

Do vértice dessa disjuntiva
onde vozes enormes me convocam,
ouço um clamor distante e agitado
que angustiante cruza minha fronteira.
Se eu não seguir teus passos, Passionária,
se eu não seguir o tormento de tua luta,
se eu não me entregar ao povo até a morte,
que tua voz me amaldiçoe e me condene.
Que caia fervendo sobre minhas pupilas
o óleo que cega e dilacera,
que as foices que inclinam tua esperança
colham minhas artérias execráveis.
Mas eu te conjuro, Passionária,
para encorajar a fé da minha integridade,
Que meus cadinhos sejam educados em tua forja
e que tuas estrelas guiem minha amargura.
Pelo meu amor e seu meio século a reboque
dê-me um flash de teu rubro amanhecer.

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