2 Poemas de Cindy Jiménez-Vera (Porto Rico, 1978)

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Curadoria de Floriano Martins
Tradução de Gladys Mendía

Cindy Jiménez-Vera (Porto Rico, 1978). Poeta. Autora dos livros de poesia No lugar (2017), Islandia (2015), 400 nuevos soles (2013), e Tegucigalpa (2012), do livro de crônicas de viagem En San Sebastián, su pueblo y el mío (2014), e do livro de poesia infantil El gran cheeseburger y otros poemas con dientes (2015). A revista Punto en Línea da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM) publicou uma antologia de sua obra intitulada Anoche soñé que tenía seis años (2014). Seus textos foram publicados em revistas literárias e acadêmicas, em antologias, em livros escolares, jornais e sites na Argentina, Brasil, Colômbia, Cuba, Espanha, Estados Unidos, Itália, México, Peru, Porto Rico, República Dominicana, entre outros, e traduzido para inglês, italiano e português. É colaboradora da revista La Ventana de Casa de las Américas em Cuba. Dirige Edições Aguadulce.


O FILHO IMAGINÁRIO

Tenho um filho
que não pari
– nunca pari ninguém –
mas é meu filho.
Todas as manhãs
ele se aproxima de mim,
me beija, me abraça,
pede a bênção
– mesmo sabendo que não acredito em deuses –
mas é meu filho.
Nunca o alimentei,
nem o vesti.
Na verdade,
quero convencê-lo
a tirar a medalha de São Bento
do terço que insiste
em usar ao redor do pescoço.
Mas não tenho sucesso.
– É para que ele me livre
das tentações, mãe.
Diz meu filho imaginário.
Neste ponto, caro leitor,
não tenha pena de mim
por ter imaginado um filho.
Parra imaginou um homem,
uma casa e o amor de uma mulher.
Melhor, tenha pena de mim
porque, por mais que eu queira
que meu filho imaginário
se apegue à razão
e pare de acreditar
na inexistência divina,
todas as manhãs
eu continuo abençoando-o
em nome de seu deus imaginário.


A VACA DE GIRONDO

O médico me disse
que estou com laringite.
Inclino minha cabeça e sorrio.
Às vezes, é preciso ser
compreensivo com os médicos.
Ele argumenta que fui silenciado
por uma bactéria escondida
nos livros empoeirados
da biblioteca
ou na gripe ocasional.
Mas eu sei, há quatro dias,
que tenho a vaca de Oliverio Girondo
na garganta.
Contam que em suas viagens de barco
entre Argentina e Espanha
o poeta levava sua vaca
junto com a família
para garantir que nunca
faltasse leite para eles.
Recentemente, descobri
em um teste cibernético
que meu corpo é um barco que oscila
nas águas que não levam a lugar nenhum.
Há muito tempo, outro médico
me diagnosticou intolerância à lactose.
Desde então, não bebo leite,
mas falo muito.
Não é surpreendente
que eu tenha me tornado
um barco que fala.
Eu sei que Ulisses
teria adorado
ancorar em meu corpo
e me ouvir contando piadas
ou recitando poemas com rima.
Acredito que alguma deusa grega,
argentina, espanhola ou caribenha
teve ciúmes e quis me castigar.
É por isso que sei que a vaca de Girondo
entrou na minha garganta
e morde astutamente minhas cordas vocais.

Agora, não falo mais.
Agora, oscilo
nas águas
deste lugar nenhum.

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