Curadoria e tradução de Floriano Martins
Dona de um imaginário fértil e repleto de registros muito próximos do autóctone, sua obra poética funda um universo poético, cujos elementos podem ser observados de uma perspectiva totalizante. Sua voz é primal, quase vernácula, sempre apreciando um cenário que privilegia os dons naturais, e onde os mares, o vento, os rios, as árvores, as onças, a selva… se tornem um sinal de consciência cultural e plenitude humanística.
O imaginário “Esthermariano” (se me permite a palavra) é uma festa de transfigurações, analogias, correspondências, onde cada verso carrega seu próprio caminho de expressão e se projeta, à medida que se desdobra, como uma cornucópia.
Um dos sinais que marcam a poesia desta chiricana reivindicada por toda a Nossa América, é a água. A água que é transparente e flui em todas as suas dimensões: o mar, os rios, a chuva. Esse elemento líquido, sempre atual, sempre em movimento, funciona como um eixo, como um pivô metafórico que tudo transforma. A água guarda os segredos do universo, por isso a autora expressa uma grande preocupação em fazê-la falar e se calar ao mesmo tempo: água é o que já foi e água é o que será.
GIOVANNA BENEDETTI
ENTRE JASMIM E PÁSSARO
– O nome pelo mar anda perdido
Golfinhos, madrepérolas, quem sabe?
– Como perder – repreende o vento suave –
como perder o nome por esquecido?
– À terra regressar! Por mar, não foi.
Não vês sua forma entre jasmim e pássaro?
Vai para as montanhas. Indague. Acabe
Com essa soçobra de não ter nascido.
Não é pelo ar, borboleta exata.
Não é pela água com o peixe, intacta,
onde amanhece seu primeiro assombro.
Talvez aqui, sob a terra ferida,
ao pé da árvore Panamá está encerre
neste grito com o qual a nomeio.
LAGO, VAMOS BRINCAR
– Lago, vamos brincar.
Eu o marinheiro,
tu o mar.
Eu ponho o barco,
tu o vento,
tu as ondas,
eu o timão.
Tu as ondas e o vento,
eu a canção.
– Falta uma coisa. A estrela.
Sim ela
quem vai te guiar?
Sem uma estrela não há viajante,
nem marinheiro, nem mar.
– Eu ponho o barco,
tu o vento,
tu as ondas,
Eu o timão;
Tu as ondas e o vento,
eu, a estrela e a canção.
ALEGRIA PELO TELEFONE
Como o pássaro em seu voo
como o vento,
como o raio da lua
e o aroma,
como todo o invisível
o impossível,
hoje minha mãe falou de longe.
Onde estava? Como foi?
O como, onde e por que,
não sei.
O quando eu mal entendo.
Tarde? Cedo? Hoje? Ontem?
O sol estava se vestindo
para sair.
Seria talvez amanhã
quando a ouvi.
Por um fio, ela me chamou.
– Olá! O que fazes? Estás bem?
Já banhaste a tua boneca?
Eu lhe respondi,
– Sim, sim.
Como sua voz veio de tão longe?
Como foi, como foi?
Não sei.
Mas eu ri feliz.
Eu senti uma grande alegria.
Isto sim, isto sim.