3 Poemas de Rosa Elvira Álvarez (Panamá, 1915-1997)

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Curadoria e tradução de Floriano Martins

A dimensão afetiva na poesia de Rosa Elvira é caracterizada pela ternura. Uma ternura calorosa que se manifesta plenamente em seus acentos nupciais e maternos. Não apenas como mãe de seus filhos, mas no sentido que os povos primitivos deram à maternidade na época do matriarcado. A maternidade de Rosa Elvira é a daqueles tempos em que a mulher presidia a vida e dirigia o mistério do viver e do morrer com o rico repertório de ritos de magia branca. Dizê-lo com palavras que algumas vezes lhe dissemos e a fizemos rir, daqueles tempos em que as bruxas eram belas e benéficas, quando belas mulheres presidiam à bênção dos campos de trigo e dos currais. E era o símbolo mais doce da beleza e riqueza da existência.

Quanto à dimensão mística, o que podemos dizer que todos que leram um poema de Rosa Elvira já não tenham dito? O misticismo é a escola dos amantes da beleza que ainda não tem nome. E amantes do amor. Toda a poesia mística é expressa em termos eróticos desde São João da Cruz até os dias atuais. Rosa Elvira Álvarez continua a grande tradição acrescentando seu sotaque pessoal que é como o sotaque desses tempos inseguros e firmes, céticos e exaltados, e levando a antítese aos seus extremos satânicos e angélicos.

Mas não se engane. Na poesia de Rosa Elvira não há nada de satânico. Seu misticismo não corre o risco de mal-entendidos. Amor por amor o único que não falha e que oferece à poetisa uma suculenta plenitude, é o amor absoluto da beleza absoluta. Basta ler seus Siete Sonetos al Escorial. Junto a esses poemas, os da chamada poesia concreta, os do já extinto ultraísmo, os das pequenas escolas que nascem e morrem como borboletas no espaço de um dia, tornam mais ostensiva sua natureza leve e inconsistente. Não existe poesia de saia curta ou longa. Não há modas na eternidade da verdadeira beleza, muito menos na beleza da expressão mística. E se todos os seus poemas têm o segredo e a mensagem aparente, ou seja, a beleza íntima e a beleza formal e exterior, os poemas místicos também têm projeções sombrias nos níveis mais profundos da natureza humana. Escuro, dizemos, porque onde há muita profundidade alguma escuridão é inevitável, mas a de seu misticismo é uma escuridão onde todas as cores estão em potencial, como no silêncio estão todos os sons e como na noite estão todas as ressonâncias do dia passado e todas as esperanças do próximo.

Os poemas místicos de Rosa Elvira Álvarez encontrarão um eco fácil nas consciências, especialmente nas dos ateus, nos quais serão não apenas um estímulo à reverência, mas também uma descoberta docemente escandalosa. Não no sentido de extremos vergonhosos, mas no sentido da violência do novo e do inesperado. Ou seja, na originalidade. Não há originalidade sem algum tipo de escândalo e, neste caso, o escândalo é inefável, como deveria ser.

É também um prazer inefável e uma honra para mim enviar com estas leves palavras uma cordial saudação e aplausos a Rosa Elvira e à sua poesia que permanecerá jovem no futuro através das gerações.

Ramón J. Sender


CHICANO

A palavra Chicano é uma reprovação
uma angústia com alo de esperança.
Semente soterrada pelo luto
flor agora, talvez árvore amanhã.

É um desafio, talvez uma bandeira.
O estandarte teimoso de uma raça
transplantada a um oásis ou deserto.
É uma palavra feita de dor moral.

Um silêncio em voz alta e em voz nova.
Sede de séculos lhe queima a garganta.
Brotou como as fontes subterrâneas,
vem de longe, chega do Anahuac.

O que importa um nome? Viaja pelo sangue
Aymará, Arawák, Azteca, Arauca.
É um longo silêncio que nos fala hoje
e clama ao mundo em forma de palavras.

A palavra Chicano é uma flecha
e o arco é o fôlego de uma raça.


PRISÃO

Como é triste ficar em casa
se há alegria na alma
e o coração necessita
castanholas e maracas.
Quando se é jovem e alegre,
como é triste ficar em casa.
A alma na escuridão e sozinha
como uma lâmpada apagada,
e uma angústia inexplicável
amarrada à garganta.
Como o quarto me deixa triste
hoje que tenho uma alma alegre.
E pensar que o tempo corre
(só vemos suas costas)
que a morte anda ao redor
e a juventude se acaba.
Como o quarto me deixa triste
hoje que tenho uma alma alegre.
Prisões que formamos
(que prisão é esta casa),
e o coração necessita
castanholas e maracas.


VIRTUDE ERÓTICA

Sais de teu corpo
andando sobre as brasas
quem te vê não te conhece
por mais que não uses máscara
e jamais saberão se foste
fêmea nublada ou mulher clara
embora São Gabriel inveje
a inocência de tuas asas.
Sentada sobre os séculos
sentada sobre si mesma
és o germe das tempestades
que o amor divino reduz.
Tão cheia andas de teu Deus
que beijas sua imagem sagrada
no rosto de pecadores
com a inocência de um gato.
Voluptuosidades de anjo
emanam de tua substância.
Ó Isabel, Santa da Hungria,
a ingenuidade de tua alma
sublimava teu corpo
generoso e com a palma
da noite dos surdos
– a noite de duas madrugadas –
ias do céu ao inferno
toda gelo e fogaréu,
gelo do ser sem limites
e fogo dessa hora sagrada
em que o amor sobre um orbe
sem fronteiras se derrama!
E tu detrás de meus olhos
Por meus dois nomes me chamas
enquanto taciturna invades
os desvãos de minha alma.

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