5 Poemas de Isabel De Los Ángeles Ruano (Guatemala, 1945)

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Curadoria e tradução de Floriano Martins

Isabel de los Ángeles Ruano (Guatemala, 1945). Desde cedo se dedicou totalmente à sua vocação literária. Em 1964 formou-se professora de educação primária urbana e no ano seguinte iniciou sua carreira jornalística no Diario de Centro América e El Gráfico. Em 1966 mudou-se para a capital mexicana, onde a qualidade de sua escrita logo foi reconhecida. Conhece León Felipe e publica seu livro Cariátides (1966). Em meados de 1967 retornou à Guatemala e uma década depois completou seus estudos na Faculdade de Humanidades da USAC. Em 1988 foi publicado Torres y Tatuajes, que reuniu 11 coletâneas de poemas até então inéditas, o que a consolidou como uma das vozes mais pessoais da história da literatura guatemalteca. Em 2001 foi galardoada com o Prêmio Nacional de Literatura Miguel Ángel Astúrias, pela sua “coesão insondável e heroica entre a vida e a obra”. Também foram publicados os livros Café Express (2002), Versos dourados (2006) e Poemas Grises (2010).


OS FARSANTES

Para decapitar monumentos
o silêncio é necessário,
os santos fizeram suas colunas
mas eles não têm estandartes.
Que lugar daremos a cada um
em nossa história?
Isso nem importa mais,
os heróis estão mortos
e cada um que fabrique duas façanhas.
O tempo é uma invenção malévola,
nunca aprendeu a acreditar
na verdade
porque nasceu nu como os homens,
e, além disso, a verdade existe mesmo?


OS DESTERRADOS

Hoje vi um cemitério vazio,
apenas uma criança
corria pela escuridão,
fugia dos assassinos
e queria pegar uma borboleta.

Então me doeu ter a voz
dos exilados,
doeu-me que eles não me deixaram gritar,
as vítimas me doeram, a carne torturada,
a miséria me doeu.

Chorei sobre flores, entre os mortos,
sob a luz do céu, entre tristes gerânios,
chorei com o gemido das cozinhas desabitadas,
com a coragem dos desempregados, com a lanterna
desligada dos bairros escondidos.

Chorei pelos meus desejos assassinados,
por este estilhaço surdo que cega,
por não ter onde dizer, por não poder fazer,
pela dor daqueles que estamos banidos,
amargamente banidos, escapando,
em dívida com os túmulos, inquilinos das criptas que esperam.


[A CASA NÃO TEM PAREDES]

A casa nem tem paredes
nem portas,
mas é a minha casa,
como meu cavalo sem cascos,
meu cavalo sem sela,
como meus sonhos agrestes
e a palavra no ar, esvoaçando,
como esta garganta de tuberosas,
minha garganta.
Eu monto no amanhecer
e desmembro as rosas no vazio.
A minha rosa não tem pétalas,
apenas espinhos,
mas é a minha rosa.
A minha palavra é áspera
e andarilha,
não tenho queixas de ninguém,
posso me alegrar com as rosas,
monto meus sonhos e meu cavalo.
Vivo na minha casa
e falo com a minha palavra.


[OUÇO O MEU CORAÇÃO]

Ouço o meu coração
que engasga como um peregrino estranho.
A sirene do vento apita
e surges na brisa
como uma memória aérea
sacudindo minha febre
com uma sensação tua.
Eu desejo a tua carne
com a flor de meu corpo
com a fúria ardente de palha e areia.
E na brisa de fogo da tarde
eu sei que te amo
com a guitarra selvagem rasgada por meus nervos
e a fumaça violenta lançada no crepúsculo.
E aqui estás no meu ser em minhas mãos
na ágil gaivota do sonho
e na terrível fogueira que me acende.


O SILÊNCIO FECHADO

Ninguém abriu a boca
nem ninguém disse nada.
E esse silêncio, irmãos,
nos tornou culpados.
Permanecemos calados,
nem um protesto
ou mesmo uma única palavra
eles falaram.
Nada foi dito.
E fomos todos cúmplices
dos canalhas
ficamos todos com as mãos
enlameadas.
Todos a estupramos!
Todos lhe arrancamos
os mamilos a mordidas.
Todos lhe sugamos o sangue
dos seios indignados.
Quando ela ainda estava viva!
Acontece que a fera anda à solta.
Em todos os corações.
E esse silêncio de todos
é o silêncio da fera saciada,
é o silêncio culpado
dos cúmplices.
Porque agora todos
somos os assassinos de Rogelia.

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