3 Poemas de María Paulina Briones (Ecuador, 1974)

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Curadoria de Floriano Martins
Tradução de Elys Regina Zils

María Paulina Briones (Equador, 1974) é editora, professora e livreira. Publicou dois livros de poesia: Tratado de los bordes o La cercenación del estero (2016, vencedor do prêmio de poesia Ismael Pérez Pazmiño) e Labor de duelo (2022, Editorial Himalaya de Argentina). Em 2013 apareceu sua nouvelle Extrañas, e em 2014 El árbol negro, livro de histórias sob o selo Línea primitiva. Dirige a editora Cadáver exquisito, que criou em 2012. É professora de Literatura na Universidad de Las Artes.


PREMONIÇÃO

Não são aleatórias as colinas mutiladas
ou este braço de mar como um perturbador vitral da noite
            estrangulada
é o sinal da morte que escurece as águas
e detém sua dialética missão de ser sempre diferente
outra
nada mais respira nesta cidade
nem as palmeiras da necrópole de mármore
nem os inquietos aguapés do rio seco
esperamos o milagre da chuva com a língua partida
tememos nossa morte na seca
irônico fim para os habitantes de um porto.

Para nadar é necessário fé e braços enormes
não se trata de flutuar embora se possa levitar nas águas
a ideia é ir contra a corrente e superar a força
desmedida da natureza
de uma cidade pântano.
Uma mulher avança sobre as águas com a precisão
        de um tubarão
chega ao futuro
ilha
sobe as cachoeiras e retrocede até o porvir
queima sobre as águas
o ato ainda é indescritível
ela se encarregará de escrevê-lo.

O porvir as colinas mutiladas
nem uma Sumaúma sobrevive
espetáculo sinistro de reconstrução e escombros
os cerros castrados farfalham os esteiros crescem e a água
sempre a água pronta para nos cobrir com seu esquecimento.
A melancolia se alastra o asfalto


POEMA DOS DIAS

Quem vai nos salvar da cama eterna
de seus densos fedores e a terra?
aqui os restos a comida dos dias os suores
        das noites de confinamento e agonia
trina um pintassilgo
o silêncio cresce
outros ruídos
materiais todos da minha memória
é o vento que nos atravessa solitário
um sono pesado cai sobre cada corpo
a vegetação se expande por anos
penetra na casa dos adormecidos
animais rastejantes atravessam o asfalto.
É uma determinação a vida entre tanta morte.


LABUTA INÚTIL

O tempo me propõe as tarefas mais inúteis
bordar laboriosamente
o forno recebe minhas criações mais sofisticadas
é nova a arte da dificuldade
me converto na melhor cozinheira
preparo iguarias requintadas
disseco com a lentidão que agora me caracteriza
             e faço pontos suspeitos com uma lã escarlate
me regozijo
para quem cozinho?
Antes recusei o trabalho doméstico
lamento esse conhecimento adiado
um covil nos acolhe
escapar não faz mais sentido
apenas o assar do pão o corte da cebola o ponto
preciso
as horas púrpuras se desdobram ad infinitum
filtrar o suco
fim da utopia
a grande odisseia
Sonhei com um túnel profundo e esse era o silêncio
como um furo como um buraco escuro ou um vórtice
me esforçava para captar qualquer coisa parecida com um ruído.

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